Mais de cem estabelecimentos comerciais com portas fechadas em JF
Número considera levantamento feito pela Tribuna nos principais corredores de vendas da área central
A pouco mais de um mês para completar um ano desde que o comércio fechou as portas pela primeira vez por conta da pandemia, em 19 de março de 2020, o setor continua sentindo os impactos econômicos e, para 2021, as expectativas não são das melhores. Uma pesquisa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Minas Gerais (Fecomércio-MG) aponta que oito em cada dez empresas de comércio e serviços tiveram prejuízos com a pandemia no estado. Em Juiz de Fora, este reflexo é visto facilmente nas ruas, observando os estabelecimentos que, antes da pandemia, eram pontos comerciais, mas estão com as portas fechadas agora. No último dia 25 de janeiro, a Tribuna esteve na região central, na área compreendida entre as ruas Mister Moore e Braz Bernardino e as avenidas Rio Branco e Getúlio Vargas, incluindo galerias, e contabilizou, ao menos, 101 locais vazios e/ou com placa de “aluga-se”. Em agosto do ano passado, a reportagem realizou o mesmo levantamento e identificou 130 pontos comerciais fechados.
De acordo com o economista-chefe da Fecomércio-MG, Guilherme Almeida, os lojistas e prestadores de serviços sofrem impactos diretos e indiretos durante a pandemia da Covid-19. Enquanto os primeiros estão relacionados ao regime de isolamento social e as medidas que impedem o funcionamento das atividades econômicas, os impactos indiretos dizem respeito aos indicadores do mercado de trabalho, como queda na renda e menor empregabilidade. Estes fatores levam a uma baixa nas vendas ou na prestação de serviços, ocasionando deterioração do fluxo de caixa destes estabelecimentos.
“Quando pegamos o caso do comércio varejista, é muito mais sério porque o varejo precisa daqueles recursos que vão suprir os seus compromissos financeiros de curto prazo, que é o capital de giro. Com o estabelecimento fechado, ele acaba sentindo o impacto muito mais forte, gerando um problema de liquidez. E esse problema de liquidez, perdurando em médio prazo, pode acabar no encerramento da atividade da empresa ou até mesmo na redução da sua operação via demissões”, explica Almeida.
O levantamento da Fecomércio-MG aponta que 52,3% dos entrevistados precisaram manter seu estabelecimento fechado em algum momento durante a pandemia por conta de medidas restritivas, o que trouxe prejuízos para 81,4%. Os principais problemas apontados pelos empresários estão relacionados à queda na receita (56,8%), perda de funcionários (14,8%) e acúmulo de estoque (11,1%).
Demissões
A pesquisa da Fecomércio-MG aponta que 32,5% dos estabelecimentos mineiros precisaram demitir funcionários. Entre os que não precisaram, 57,5% adotaram alguma medida emergencial. No município, o Sindicato do Comércio de Juiz de Fora (Sindicomércio-JF) estima que, durante a pandemia, foram cerca de quatro mil demissões no setor. Além disso, até setembro, 226 empresas encerraram suas atividades na cidade, apenas na região central. De lá para cá, a categoria estima que o número deve ter se ampliado.
“Agora que podemos abrir as portas novamente, com mais protocolos, algumas empresas não retornaram”, diz Emerson Beloti, presidente do Sindicomércio-JF. “Tem mais empresas pedindo empréstimos, mais empresas pedindo recursos a terceiros, porque estão enfraquecidas. Elas estão abertas, mas muito enfraquecidas. Não aguentam um outro fechamento”, aponta.
Aluguel impacta nos custos do negócio
Para conter os gastos durante a pandemia, 33,6% dos empresários têm diminuído os pedidos de estoque e 28,2% têm negociado contratos de aluguel e de prestação de serviços, entre outros acordos. Conforme o economista-chefe da Fecomércio-MG, Guilherme Almeida, a estes fatores somam-se os compromissos de curto prazo dos estabelecimentos, como contas de água, energia, e a própria folha de pagamento dos funcionários. Estes são os primeiros impactados quando as empresas têm seus recursos interrompidos.
“Se nós pegarmos as empresas varejistas que se encontram nas regiões onde o custo para se operar é mais elevado, nos centros urbanos, onde há uma circulação maior de pessoas, geralmente o metro quadrado do aluguel é maior, então muitas empresas acabam tentando renegociar os contratos de aluguel, bem como adotar outras medidas para minimizar os impactos da pandemia porque reverter é muito difícil”, explica. “O aluguel tem peso.”
Setor está pessimista para 2021
Cerca de 81,3% dos entrevistados pela Fecomércio-MG estão receosos quanto a uma possível nova onda de contaminação pelo coronavírus que leve ao fechamento do comércio novamente. A pesquisa também aponta que cerca de 21% afirmaram que não devem conseguir manter o seu negócio, e 37,9% não sabem ou não quiseram avaliar sobre o encerramento de suas atividades. A essa preocupação do segmento soma-se o fato de que, para 2021, não há novas sinalizações de medidas emergenciais tanto para a população, de maneira geral, quanto para os empresários. No ano passado, dos estabelecimentos que não demitiram seus funcionários e adotaram algum tipo de assistência do Governo federal, 23% disseram ter suspendido os contratos, 18,8% aderiram à redução de carga horária dos funcionários e 13,6% à antecipação de férias.
“A nossa avaliação é um pouco pessimista porque nós tínhamos, até 31 de dezembro, uma alternativa para o empresário minimizar esses impactos de custo na sua matriz do estabelecimento. Ele acabou observando a sua receita cair bruscamente, mas, por outro lado, conseguiu atenuar os custos via suspensão do contrato ou redução de carga horária de trabalho proporcionalmente ao salário aferido pela mão-de-obra, e, dessa forma, ele tentava viabilizar a continuidade da sua operação”, explica o economista-chefe da Fecomércio-MG, Guilherme Almeida. “Para esse ano, nós não temos nenhum benefício nesse sentido programado pelo Governo federal, e isso acaba gerando, para o empresário, um problema, porque ele acaba ficando sem alternativa.”
Conforme Almeida, a situação histórica do mercado de trabalho para o primeiro semestre do ano também não contribui, visto que é um período com aumento no número de desempregados após os trabalhos temporários. “É um período em que as pessoas buscam alternativas para se empregar no mercado de trabalho, e ocorre, naturalmente, aumento do desemprego. Esse aumento do desemprego pode, inclusive, ampliar a falta de liquidez dos estabelecimentos, uma vez que há achatamento na renda. Isso, associado ao fim do auxílio emergencial, acaba provocando essa queda na disponibilidade de consumo às famílias e ampliando esse problema de liquidez, principalmente do varejo”, diz o economista.
Apesar de haver expectativa positiva em relação ao início da vacinação no país, o processo ainda deve perdurar por meses. Desta forma, de acordo com o presidente do Sindicomércio-JF, Emerson Beloti, o temor também é visto em Juiz de Fora quanto a possíveis novos fechamentos. “Eu acredito que o comércio, com certeza, vai passar por muita cautela porque vai ser muito duro. Ele não está obtendo lucro, ele está tentando saldar dívidas”, afirma.
Aposta em atendimento on-line
Entre as diversas placas de aluga-se na região central da cidade, outro fator chamou a atenção da reportagem: os avisos que indicavam o atendimento on-line aos clientes. A Tribuna observou que, desde o início da pandemia, as lojas começaram a adotar formas de venda pela internet, especialmente por meio de redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas, como o WhatsApp. Este é o principal meio utilizado pelas marcas, sendo que a grande maioria dos estabelecimentos conta com o aplicativo para se comunicar com seus clientes, principalmente durante os períodos em que precisaram manter as portas fechadas.
De acordo com a gerente administrativa da Ary Móveis, Renata Bicalho, o estabelecimento utiliza as redes sociais, como Facebook, há dez anos, funcionando como uma vitrine. Durante a pandemia, o serviço foi reforçado e, no caso do WhatsApp, passou a contribuir para a realização de vendas. “Usamos o WhatsApp há cerca de dois anos. Antes, a pessoa entrava em contato, fazia o orçamento e pedia a foto, para depois vir na loja para concretizar a venda. Desde o ano passado, já começamos a venda toda on-line, a partir do WhatsApp”, conta. “Segurou a gente por muito tempo. Lógico que não fica igual a venda presencial, ainda mais no meu setor, mas a venda on-line ajudou muito.”
Conforme Renata, o aplicativo auxiliou durante os períodos em que o estabelecimento ficou fechado, especialmente, por permitir realizar chamadas de vídeo com os clientes. Desta forma, eles conseguem visualizar os produtos e tirar dúvidas antes de efetuar a compra. “Nós ficamos na loja com o plantão e conseguimos fazer vídeo-chamada e mostrar o produto. Era como se o cliente estivesse realmente na loja”, diz. Para a gerente administrativa, este tipo de atendimento ao cliente veio para ficar. “Eu acho que é um processo irreversível. No meu ramo, o meu cliente é adulto e idoso. A partir dessa pandemia, acho que foi uma comodidade para o cliente, que agora tem maior confiança do que vai comprar, e a mercadoria dele vai ser entregue da forma que ele viu.”
As vastas possibilidades da internet
De acordo com a jornalista e empreendedora digital Larissa Garcia, o atendimento on-line no Brasil já vinha crescendo e ganhando novos adeptos, entretanto, com a pandemia, a modalidade chegou a se tornar indispensável para muitas empresas. “A internet ressurge como um caminho, e um caminho cheio de possibilidades e de alternativas diferentes para construir esse atendimento. Pode ser através das redes sociais, de site próprio, do Google Meu Negócio, e do WhatsApp. Nesse caso, foi um dos caminhos mais procurados por essas empresas, porque é a rede social de mensagens instantâneas mais popular aqui no Brasil.”
Como lembrado pela jornalista, cerca de 120 milhões de brasileiros utilizam o WhatsApp para se comunicar diariamente. Assim como outras redes sociais, como o Facebook e o Instagram, a plataforma desenvolveu ferramentas que auxiliam empresas, como o WhatsApp Business. “Você constrói um perfil comercial onde pode deixar todo o seu cartão de visitas montado, com horário de atendimento, seus outros contatos e o site”, explica Larissa. “Você pode montar o seu catálogo de produtos ou de serviços. Então, o WhatsApp tem uma possibilidade muito bacana para vender. Tem muitas marcas que vendem exclusivamente pelo Whatsapp.”
Como começar?
Para quem está dando os primeiros passos no atendimento on-line ou pretende aderir à alternativa, a empreendedora digital explica que, para começar, é importante ter conhecimento sobre dois fatores: o público e o canal escolhido. “Quanto mais você conhece o seu público, mais você sabe quais são os hábitos de consumo dele. Então, se você identifica onde o seu público está, é para lá que você vai”, diz. “É preciso conhecer mais a fundo o que essas redes sociais permitem, quais as possibilidades que elas têm, para você poder usá-las da melhor forma para o seu negócio. Explore todas as funcionalidades de um WhatsApp ou de outras redes sociais.”
Larissa explica que é importante que a empresa busque canais que consiga manter sem se sobrecarregar, fator essencial para aprimorar a experiência de atendimento. “Faça o que está viável primeiro, para que você crie experiências boas naquilo que consegue dar conta, e vai crescendo o negócio na medida que for possível”, diz. “No on-line, o atendimento precisa ser tão bom ou melhor do que o presencial, porque você não está vendo a pessoa, não sabe interpretar o que ela está dizendo, o tom de voz. Você precisa oferecer o máximo de informações possível para que ela confie em você, então deve priorizar o atendimento de excelência.”
Conforme Larissa, os canais digitais têm se mostrado potenciais para as vendas e, quanto antes as empresas aderirem, melhor. “Cada pessoa tem um tempo, há muitos desafios, mas é a hora certa de ir para o ambiente on-line. Os brasileiros passam, em média, quase quatro horas por dia só navegando, e esse é o lugar para você construir conexões”, finaliza.