Conheça Vinícius Cristóvão: ator, produtor cultural e comunicador que ‘age com o coração’

Na coluna ‘Sem lenço, sem documento’ desta semana, conheça a trajetória do artista que une linguagens para construir carreira no interior


Por Elisabetta Mazocoli

14/12/2025 às 07h00- Atualizada 15/12/2025 às 09h10

Vinicius Cristóvão
Na oficina Coragem, Vinicius desenvolveu técnica própria baseada nos estudos como ator e comunicador (Foto: Marcella Calixto/ Divulgação)

“Caçador por natureza.” É assim que Vinícius Cristóvão, 45, aprendeu a se definir, depois de anos trabalhando como ator, produtor cultural e comunicador. Foi preciso aprender a ter instinto, procurar a oportunidade certa e abrir caminhos para trabalhar com arte no interior de Minas Gerais. Desde que começou na cultura, aos 13 anos, como um soldadinho de chumbo em uma peça chamada “Brinquedos do favo de mel”, foram muitos papéis e oportunidades, como no espetáculo surrealista “Triciclo” e no solo “A casa dos espelhos”. Atualmente, ele voltou para sua cidade natal, São João del-Rei, e se divide entre lá e Juiz de Fora para dar conta do trabalho: entre os projetos mais recentes, estão fazer parte do elenco do longa-metragem “Duas iguais”, de Simone Caetano, e o espetáculo “Santidade”. Mas, como quem não perde de vista a presa, ele continua projetando muitos sonhos e planos para realizar seus desejos.

Vinícius se mudou com 17 anos para fazer faculdade de Jornalismo na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). “Eu nasci ator e cresci criativo, para dar conta da vida de artista sendo de uma cidade do interior”, explica. Aquela decisão já tinha em mente dar conta da sua vontade de trabalhar com arte, mas entendendo que precisava aprender a se virar da forma que fosse para sobreviver — algo que, mais tarde, ele provou que era verdade. Naquele momento, ele tinha tido apenas uma experiência anterior com o teatro adulto, aos 15 anos, quando estreou “Mater Crucis, a estrepitosa história do homem que não sabia morrer”, junto com o grupo de pesquisa em artes cênicas de São João. Mas essa experiência já tinha mostrado a ele algo importante: que era possível fazer teatro por meio do som e da luz, que foi a maneira pela qual ele colaborou com a apresentação.

Ele entendeu que, mexendo com esses elementos, era capaz de impactar demais o público. “A arte do teatro é do ator. Mas a magia, com luz, som, cenografia e direção de movimento, dão ferramentas para que o ator chegue ao público de uma forma que ele não tem nem mais defesa. É uma junção de coisas tão lindas”, explica. Quando chegou à faculdade, então, passou a desenvolver essas duas habilidades, com a ajuda do professor Cristiano Rodrigues, que considera “um mestre” em Juiz de Fora. Foi assim que começou a trabalhar como produtor em uma televisão e participou como ator de um espetáculo que adaptava a novela “Pela noite”, de Caio Fernando Abreu.

Foram muitos pontos de virada em sua carreira — até porque a carreira de artista demanda quase diariamente a capacidade de transformação. Mas o espetáculo “Triciclo” certamente foi um deles, pois naquele momento ganhou sete prêmios junto com os outros participantes, no primeiro festival nacional de teatro de Juiz de Fora. “Sempre quis buscar o meu próprio caminho, tenho gratidão a todas as técnicas que aprendi e vivenciei, mas sempre quis entender o que é meu nisso, inclusive para poder oferecer a outras pessoas”, conta. Em 2004, ele se formou na faculdade e passou uma temporada de 8 anos no Rio de Janeiro. Naquele momento, o lado produtor tomou conta por necessidade. E ele também enxerga que vieram muitas experiências positivas com isso: tanto em termos de contato quanto para poder proporcionar novas vivências. 

Caminho de coragem

Vinicius Cristóvão
(Foto: Marcella Calixto/ Divulgação)

Todos esses espetáculos passaram a chamar a atenção de Vinícius por um aspecto em especial: o trabalho com o corpo para criar personagens e personas. Isso se tornou uma pesquisa para ele, em um primeiro momento, de maneira intuitiva. Até que, durante sua temporada no Rio de Janeiro, conheceu o método do ator Mikhail Chekhov, que ressoou com o que achava mais interessante dentro da atuação. “Meu trabalho, como ator, é deixar nascer outra pessoa a partir do meu corpo, minha voz, minha imaginação. É muito melhor e mais divertido do que repetir o que já sei”, conta. 

Quando voltou para Juiz de Fora e já estava com o trabalho do Corpo Coletivo e Andar de Baixo, começou a desenvolver uma oficina no campo da instrumentalização da presença, pensando justamente nessa técnica, inicialmente apenas para atores. Se chama Oficina Coragem, que pensa o “agir com o coração”. Ele explica, a esse respeito: “O resgate da coragem, para mim, faz parte do resgate da nossa individualidade e do autoconhecimento. É para trazer à tona esse ser diante do outro”. E foi assim que a oficina foi recebendo políticos, estudantes, professores e até padres que se interessavam pelo curso. Esse trabalho, em seguida, foi sistematizado como um método próprio no mestrado de Artes Cênicas em São João del-Rei, e também irá avançar no próximo ano para o Doutorado. Além disso, foi também o estudo sobre a coragem que motivou o espetáculo solo que sairá no próximo ano, chamado de “O mundo depois dela”, no qual ele irá estrelar com direção de Pri Helena e dramaturgia de Suzana Nascimento.

Unindo formações

Além da atuação, Vinícius também foi responsável por produzir espetáculos como “Tom na fazenda”, “Ficções” e “Nastácia”, que movimentaram Juiz de Fora nos últimos anos. Em muitos momentos, ele se dividiu entre ator e produtor — e já chegou a ter que resolver problemas com disjuntor 10 minutos antes de entrar em cena — algo que, agora, prefere não fazer. Mas foi encontrando uma forma de unir suas formações que viu a própria potencialidade e até a possibilidade de experimentar.  Nos últimos anos, por exemplo, tem atuado como diretor audiovisual, especialmente em curtas de animação, que dialogam com temas como adoção responsável, proteção animal e autismo. 

Vinícius conta, ainda, que não tem medo de trabalho. Que sabe que se assumir artista exige justamente a palavra que guia sua reflexão, mas que, para ele, é também preciso que os artistas criem uma rede de confiança para que não parem. “Minha mãe é professora e meu pai é taxista. Eu não tenho herança. Se eu não trabalho, eu não ganho. Eu não posso parar”, conta.  Apesar das dificuldades, não cogita fazer outra coisa e acredita sempre na potencialidade que tanto Juiz de Fora quanto São João del-Rei têm como criadoras de cultura. “Precisamos acreditar mesmo que é possível. Eu não consigo fazer outra coisa. Conseguir, até consigo, mas só sou feliz a partir da arte e da cultura”, diz ele.

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