Sobre amor e Desejo
Escrever não é apenas o ato de colocar em palavras aquilo que está “gritando” em nosso peito, é também saber observar o que está à sua volta, ter o lampejo a partir de uma simples palavra, notícia, e daí vir a inspiração, a tão falada transpiração e chegar, por fim, à criação. É a partir destes e outros detalhes que a escritora Maria Diva Boechat lança o seu segundo livro de poesias “Sobre amor e ervilhas”, que terá uma sessão de autógrafos, nesta quinta-feira, no Espaço Manufato. Sucessor de “Cerâmicas”, de 2011, o trabalho vem integrar um universo literário que vai além do poético, incluindo ainda os livros “Arret” (o primeiro de todos, publicado em 2008), “O carro de Pedro” e “João e Maria da Amazônia” (em coautoria com Marta Gusmão), direcionados ao público infanto-juvenil, e a participação com outros autores em “Crônicas-Esportes”, lançado este ano.
Publicado por meio da Lei Murilo Mendes – assim como “Cerâmicas” -, “Sobre amor e ervilhas” (título inspirado no conto “A princesa e a Ervilha”, de Hans Christian Andersen) é resultado da gestação de textos criados ao longo dos anos, de acordo com as leituras da vida feitas por ela, e que não precisam traduzir o que Maria Diva passava em sua vida pessoal – ao contrário do que se pensa, nem todo artista derrama em versos, letras, canções etc. suas alegrias e dissabores.
“A poesia não é necessariamente biográfica. As pessoas confundem muito o eu lírico, o ‘eu’ que é escrito na poesia, com o ‘eu’ do poeta”, explica. “O livro pode ter coisas da Maria Diva? Pode, sim, mas o objetivo não é expressar somente a Maria Diva, e, sim, o mundo que está a minha volta. De modo geral, a ‘inspiração’ vem de livros, pinturas, esculturas, músicas, filmes, imagens; vem de pessoas conhecidas ou completamente desconhecidas. Vem também da natureza, de histórias reais e de outras nem tanto, vem de histórias em quadrinhos. E vem também das palavras. Aliás, a inspiração não é algo que caia no colo do escritor. Na verdade, ela é o trabalho desses olhares que armazenamos sobre o mundo no decorrer do tempo”, reflete a escritora.
Dentre as coisas que a cercam, Maria Diva destaca que uma das fontes para suas poesias está nas artes plásticas, tanto que a ideia de publicar poemas para o público adulto teve início ao conhecer a Oficina Brennand, localizada em Recife (PE), em 2006. “Fiquei deslumbrada com as esculturas e pinturas de Francisco Brennand. Quando retornei a Juiz de Fora, enviei os poemas para Brennand dizendo que, se algum dia aqueles poemas fossem publicados, o meu sonho seria poder usar, na capa, a imagem da escultura Lara (cujo rosto assemelha-se ao meu de forma impressionante!). Dias depois, recebi um e-mail de Brennand dizendo que havia gostado muito dos poemas e que para ele seria uma honra ceder a imagem de Lara para capa do livro!”, recorda. “A partir disso, surgiu uma bela amizade entre nós. O incentivo dele foi e é fundamental para que eu continuasse e continue escrevendo”, diz ela, acrescentando que a capa de “Sobre amor e ervilhas” tem projeto gráfico da artista Flávia Paula a partir da pintura “A ninfa do bosque”, de autoria do artista plástico.
Inspirações e desejos mil
Dentre os diversos temas abordados por Maria Diva em seus poemas, há citações a personalidades da Grécia Antiga, personagens da mitologia grega, a Bíblia e alguns nomes mais influentes das artes no século XX, como o músico americano Chet Baker e o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade. E também há a questão do desejo, que não é algo contido: em “Sobre amor e ervilhas”, ele pode pulsar com o calor do sangue que corre em nossas veias. “O desejo está muito presente no livro, não só no sentido amoroso. Há o desejo pelo desejo – que é o que faz a vida fluir. E leio essas personalidades e épocas desde o início de minha formação como leitora. Isso faz parte de mim. Não é nem necessidade de citar; é algo que vem natural, algo que me toca, mas não de uma maneira premeditada. A minha história de leitora está ali.”
O desejo, mais uma vez, é o tema a ser tratado com a autora, por estar espalhado nas mais de cem páginas do livro – e também por saber o quanto ele se mistura com aquela coisinha chamada amor. “Não sei se no livro faço essa separação entre o amor ‘espiritual’ e ‘carnal’ – ao menos espero que não! (risos). Acho que eles se entrelaçam. Cada um ‘lê’ de uma maneira. Passei alguns poemas para amigos lerem, e cada um viu ou sentiu de um jeito. Cada um tinha uma concepção de amor. É a leitura da pessoa que vai direcionar isso.”
A história de Hans Christian Andersen que inspirou o nome do livro é sobre uma princesa que prova seu título de nobreza ao reclamar de uma simples ervilha sob o colchão após uma noite de sono. A situação, diz, tem muito a ver com o contexto de seu mais recente lançamento. “‘Ervilha’ seria algo que incomoda, por vezes pequeno, mas que nos espeta. Assim como os pequenos detalhes que muitas vezes vão nos minando aos poucos. No poema que leva o nome do conto, ‘ervilha’ está relacionada ao sentimento de culpa. Amor e culpa são recorrentes na lírica amorosa, assim como na concepção cristã. Essa, entre várias outras, é uma das temáticas com as quais gosto de trabalhar. As pessoas vão acessando suas ervilhas durante seu percurso de leitor, seu percurso de vida. Porém a ervilha no colchão da princesa pode ser algo belo. Como eu digo na orelha do livro: ‘sem incômodas ervilhas, inexistem princesas verdadeiras…’.”
E com que situação seria mais fácil de se acostumar: as pequenas ervilhas incômodas ou o aperto provocado pelos amores dessa vida?
SOBRE AMOR
E ERVILHAS
Lançamento do livro de poesias de Maria Diva Boechat
Nesta quinta-feira, às 20h
Espaço Manufato
(Rua Morais e Castro 307 – Alto dos Passos)