Polícia realiza apitaço para coibir crimes de assédio dentro dos coletivos
Delegacia de Atendimento à Mulher faz ação na Avenida Getúlio Vargas para conscientizar passageiras nos pontos

Arma contra a importunação sexual. Dessa forma, dois mil apitos foram distribuídos para mulheres na Avenida Getúlio Vargas, no Centro, nesta segunda-feira (26), a fim de que elas denunciem crimes de assédio sexual. A ação da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, em parceria com o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, foi realizada durante a tarde, em toda extensão da via, quando era intenso o movimento de pedestres. Além do apito, as mulheres foram orientadas sobre como e quando usá-lo. A iniciativa, em Juiz de Fora, marca o início do ativismo contra violência de gênero, uma campanha internacional que acontece todos os anos, entre 25 de novembro, Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, e 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos. A campanha pretende conscientizar mulheres para que não sejam alvo da importunação de homens no transporte coletivo nem mesmo em outros espaços.
Desde setembro deste ano, a Lei 13.718 tornou crime a importunação sexual. Casos de assédio em coletivos, por exemplo, antes eram apenas contravenção penal sujeitos a multa. Agora, conforme o artigo 215-A do Código Penal, “quem praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, pode ficar de um a cinco anos atrás das grades. Na cidade, a primeira prisão em decorrência do novo crime de importunação sexual ocorreu em 30 de outubro, contra um homem de 49 anos. Ele é suspeito de passar as mãos nas nádegas de uma menina de 9 anos, que comprava biscoitos em um bar e mercearia da Zona Norte.
Um caso por semana

“Já fui vítima dentro do ônibus do meu bairro. Entrei, quando, de repente, um homem chegou muito perto e falou ‘olha o estado que eu estou. Olha o jeito que você me deixou'”, disse o homem, mostrando o órgão genital à aposentada J., 63 anos. “Ninguém fez nada, e ele simplesmente desceu do ônibus e foi embora. Eu passei mal e não sabia como reagir”, completa ela ao aguardar o coletivo no mesmo ponto onde ocorreu a ação da Polícia Civil. Assim como a aposentada, várias mulheres são vítimas de abusadores diariamente. Segundo informou a delegada Ione Barbosa, à frente da iniciativa na cidade, a cada semana, uma média de um novo caso de importunação sexual ocorrido no transporte público chega à delegacia. “Homens entram nos ônibus simplesmente para abusarem de mulheres que, muitas vezes, estão saindo do trabalho, da escola e são submetidas a este tipo de violência. Na maioria dos casos, eles encostam o órgão genital nas nádegas delas. As vítimas, por sua vez, não procuram a polícia por vergonha. O apito passa a ser o símbolo do encorajamento para que elas denunciem”, ressalta a policial.
A partir do sinal de socorro emitido pela mulher, funcionários das empresas de transporte poderão acionar a Guarda Municipal ou a polícia. “Neste momento, todos os presentes no ônibus irão olhar. Ou seja, ela terá testemunhas à vontade. Em seguida, deverá acionar o motorista, que deve parar o coletivo e acionar a PM para registrar o caso e realizar a prisão em flagrante do sujeito”, diz Ione. Não é a primeira vez que o apito se torna uma “arma” a favor da mulher. Em outubro, artistas de São Paulo distribuíram o objeto também com a finalidade de coibir abusos, e o movimento ganhou a hashtag #MexeuApitou. Em 2016, a Cidade do México também entrou na onda, com a distribuição de 15 mil apitos para estimular a denúncia.
A iniciativa foi aprovada pela estudante Michele Oliveira, 22. “A partir de agora, vou andar sempre com meu apito em mãos. Nunca fui vítima, mas tenho amigas que já sofreram com este tipo de abuso, e não souberam como agir. A gente se sente desprotegida. Acredito que, a partir de agora, os homens irão pensar duas vezes em ter alguma atitude.” A opinião é compartilhada pelo encanador Adenaldo Batista, 52, e pelo soldador Sebastião Francisco Pacheco, 61. “Infelizmente têm muitos homens que aproveitam da lotação dos ônibus para abusarem das mulheres. Eu mesmo já vi. Elas devem gritar e apitar, sim. Vou falar para minha esposa sempre andar com um apito na bolsa”, revela o soldador. “Os homens deveriam ter mais respeito. É um absurdo aproveitarem dos ônibus e dos pontos cheios para desrespeitarem nossas esposas e filhas”, completa Sebastião.
Quinto país mais perigoso
Na avaliação de Ione, o maior rigor na punição da legislação que torna crime a importunação sexual representa um avanço não só para mulheres, mas para toda a sociedade, e o apitaço pretende ter mais adeptas e tirar os abusadores de circulação. “Nós vivemos em um país extremamente machista. Ainda há homens que se acham no direito de passar a mão, quando as mulheres estão vestidas com roupas curtas ou mais sensuais. A mulher tem o direito de andar como ela quiser. Devemos desconstruir essa visão que o homem tem sobre a mulher. Essa visão de poder, de submissão.”
Levantamento da InterNations, empresa especializada em levantamentos e serviços relacionados a quem mudou de território, apontou o Brasil como o quinto lugar mais perigoso onde um estrangeiro pode estar no mundo hoje. A conclusão foi da pesquisa realizada com 18.135 imigrantes e expatriados de 187 territórios e países (da Alemanha à Groenlândia). Dos entrevistados, 8.855 eram mulheres. O estudo traz diferentes rankings, e o Brasil lidera dois deles: a lista geral de países mais perigosos para se viver e a de países mais perigosos para as mulheres. Neste contexto, a delegada Ione Barbosa acredita que, com mulheres informadas e armadas contra o abuso sexual, Juiz de Fora siga na contramão destes números. “Para conscientizar mais pessoas, devemos ampliar a campanha, fazendo apitaço em outras regiões da cidade, principalmente mais próximo ao Natal. Neste período, há grande circulação de pessoas nas ruas do Centro e também nos coletivos urbanos, época em que os abusadores se aproveitam para praticar crimes”, pontuou.
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