Fila de castração da PJF tem quase 3 mil animais inscritos

Para tutores e ativistas da causa animal, a grande quantidade de demanda não está sendo atendida devidamente e pode gerar problemas no futuro


Por Por Elisabetta Mazocoli, estagiária sob supervisão de Marcos Araújo

25/09/2022 às 07h00

Existem quase 3 mil animais inscritos na fila de castração realizada pelo Município, de acordo com a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF). Desse total, o Poder Público indica que muitos já foram castrados de forma particular ou por outros mutirões enquanto aguardavam sua vez, fazendo com que o número real de animais em espera não seja exatamente o montante acumulado. Mesmo assim, a Administração afirma que a fila ainda pode demorar de três a quatro meses para ação efetiva na região do animal cadastrado, enquanto parte da população afirma que o atendimento está atrasado.

A Tribuna conversou com ativistas e líderes da causa animal para entender mais sobre o assunto e abordar os impactos que essa realidade pode trazer para a cidade, além do problema mais direto gerado para os tutores que precisam do serviço. A castração adequada para animais que estão em fase de procriação é apontada por Míriam Nader, resgatadora independente e ativista há mais de 30 anos, como um dos fatores mais importantes para combater a grande quantidade de animais em situação de rua. “O animal está abandonado porque o tutor não exerceu a guarda responsável, mas também é obrigação do Poder Público zelar pelo controle reprodutivo desses animais”, ela explica.

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A gatinha da tutora Clara Freguglia foi retirada das ruas está na espera do procedimento de castração desde o mês maio (Foto: Arquivo pessoal)

A tutora Clara Freguglia, por exemplo, adotou uma gata de rua, quando, de acordo com os veterinários, a mesma tinha entre um e três meses. Clara está na espera desde o dia 10 de maio, quando a gata ainda não estava na idade adequada para o procedimento. Quando foi contactada para a realização da castração, no último mês, Clara contou que os horários eram bem limitados e que não foram avisados com a devida antecedência, o que fez com que ela não conseguisse levar sua gata para ser atendida no horário agendado. “Afirmaram que no próximo mês ia ter horário no período da tarde, porque aí não iria coincidir com meu horário de trabalho, mas ainda não fui contactada novamente”, diz.

A tutora Marina Veloso também explica que, ao adotar seu gato, que passou a estar na convivência com uma fêmea, precisou do serviço de castração para que os dois não procriassem. Ela chegou a conseguir o procedimento para o gato, mas afirma que teve que esperar quase o dia inteiro para conseguir o atendimento, o que gerou muito desconforto para o animal, que até passou mal durante o processo. O outro animal sob sua tutela, por sua vez, não conseguiu o atendimento público, mesmo ela tendo entrado em contato com o Município e outras figuras envolvidas com a causa. “Como a situação era de urgência, levamos o gato para um atendimento particular que tinha um preço mais acessível”, explica.

Além de apontar os benefícios para os animais, Míriam também destaca que ampliar as campanhas de castração pode trazer inclusive economias para o Município. “É bem mais barato castrar o animal do que resgatar, levar no veterinário, pagar um tratamento, ficar no canil e ter todos os gastos para manter esse animal lá”, explica. A relação entre o maior número de animais na rua e a falta de castração, para a ativista, é bastante clara. Maria Elisa de Souza, diretora da ONG Sociedade Juizforense de Proteção aos Animais (SJPA), também afirma que a demora no serviço público de castração traz uma sobrecarga para todos os órgãos que trabalham com a causa animal, ainda mais em um cenário em que o Canil Municipal está revendo o perfil dos animais que vão ser resgatados.

Ampliar campanha e educar tutores

Em uma faixa de dois anos, de acordo com Maria Elisa, é possível que apenas uma cadela não castrada, em situação de rua, gere cerca de 2.400 animais – levando em conta tanto aqueles que ela vem a parir, quanto aqueles filhotes que também passam a se reproduzir. As fêmeas, como ela explica, tem o período do cio e ficam sem procriar após parir, mas os machos podem estar reproduzindo de forma ainda mais rápida, com uma multiplicidade de cadelas. Para ela, o ideal seria que o Poder Público considerasse a demanda de acordo com o perfil do bairro, o tempo de vida e de cio dos animais, além de outros fatores sociais. “Uma pessoa de baixa renda é a que menos consegue acesso à castração. Se não for feito um trabalho social de apoio, ela não vai levar no particular e muitas vezes nem vai aguardar longas filas no bairro para castração. É preciso que seja feito um trabalho extenso por parte da Administração municipal”, explica.

A resgatadora Míriam considera que, como a castração não é um procedimento barato, muitas famílias economicamente mais vulneráveis acabam não conseguindo arcar com esse cuidado – e justamente por isso defende que essa pauta precisa ser tratada como prioridade para a qualidade de vida dos animais, inclusive levando em conta o cenário em que se encontram quando há superlotação nos espaços onde estão ou quando os animais ficam em lares que não são adequados.

A educação dos tutores em relação a todos os cuidados que os animais precisam, inclusive a castração, também é apontada por ambas como muito importante para o bem-estar dos bichos. Maria Elisa conta, por exemplo, que no abrigo em que é diretora, os animais filhotes geralmente acabam sendo adotados mais rápido, mas no momento da adoção não é possível garantir completamente que os animais vão ser castrados na época correta. “A gente tenta incentivar, ao ficar com a ficha do tutor e insistir que a pessoa faça o procedimento no animal, além de trabalhar com uma clínica que ofereça esses cuidados por um preço mais acessível. Mas é preciso um trabalho mais direto nos bairros, de acordo com a demanda de cada um”, diz.

Problemas para a saúde pública

A grande quantidade de animais em situação de rua e a tendência desse número aumentar nos próximos anos, caso a castração não seja ampliada, preocupa Míriam Nader. Ela explica que, em sua vivência, já vem percebendo um aumento na demanda e os efeitos disso. “É um problema que pode trazer impactos inclusive para a saúde pública”, explica. Em sua visão, pensar em políticas públicas relacionadas com a causa animal é uma questão de pensar em uma convivência harmoniosa entre todos os seres.
Levando em consideração sua experiência, ela afirma que tem notado um aumento da transmissão de doenças entre os animais e até uma proliferação de zoonoses que podem ser transmitidas para humanos. Além disso, ela alerta que o maior número de animais de rua traz mais chances de acidentes – inclusive entre veículos. “Uma cidade cheia de animais abandonados é uma ameaça à saúde humana”, ressalta.

PJF explica como funciona cadastro e fila

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O gato da tutora Marina Veloso, passou a estar na convivência com uma fêmea, precisou do serviço de castração e, como a situação era de urgência, realizou o procedimento de forma particular (Foto: Arquivo pessoal)

De acordo com a PJF, o cidadão que deseja que seu animal seja castrado precisa acessar o portal da PJF para realizar o cadastro. Após esta inscrição, é possível acompanhar o andamento da fila através de um protocolo para o encaminhamento do pedido de castração para seu pet. A lista de espera para a castração de cães e gatos com visualização para todo cidadão ainda não está disponível, e a fila segue de acordo com a ação mensal realizada nas regiões da cidade.

O Município afirma, ainda, que o castramóvel está em pleno funcionamento na cidade. No momento, a média de pets atendidos por mês é de 130 a 180 animais. “A variação se dá devido às faltas no dia e horários marcados, tirando a vaga de algum animal em situação de prioridade”, justifica, em nota.

Quando questionada pela Tribuna sobre a nova portaria, que determina que o Demlurb só vai recolher animais com traumas ou doentes, e perguntada ainda sobre uma possível ampliação desse serviço, a PJF respondeu que a expectativa é de ampliar a castração e demais atendimentos ambulatoriais através de parcerias com a Universidade Federal de Juiz de Fora.

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