Comerciantes do Poço Rico relatam prejuízos após fechamento de passagem em nível

De acordo com a população, medida isolou o bairro, causando impactos financeiros e insegurança pública; moradores também reclamam da falta de limpeza e capina na região 


Por Nayara Zanetti

22/10/2025 às 06h00

PASSAGEM DE NIVEL POCO RICO LEO COSTA
(Foto: Leonardo Costa)

A passagem em nível sobre a linha férrea no cruzamento das ruas Pinto de Moura e da Bahia, no Bairro Poço Rico, Zona Sudeste da cidade, foi fechada no dia 26 de abril deste ano e, desde então, os comerciantes locais têm sofrido impactos financeiros devido a redução da circulação de carros e pessoas na região. Os lojistas procuraram a Tribuna e relataram queda significativa no faturamento e necessidade de medidas drásticas, como cortes de funcionários, para a sobrevivência de seus negócios. Em quase seis meses desde a intervenção, cerca de cinco empreendimentos tiveram que fechar as portas. Além das questões econômicas, os moradores ouvidos pela reportagem também manifestaram insatisfação com a falta de limpeza e a sensação de insegurança no bairro. 

Edmilson Souza é um dos comerciantes afetados pelo fechamento da passagem em nível. Há 40 anos, ele é proprietário de uma padaria na Rua da Bahia e estima queda de 30% a 40% nas vendas, especialmente no período da manhã, quando a demanda costumava ser alta. O comerciante explica que, com a passagem aberta, havia um fluxo constante de pessoas vindo do Centro, que faziam suas refeições matinais em seu estabelecimento. Antes da intervenção, Edmilson recebia cerca de 500 clientes por dia na parte da manhã. Hoje, esse número caiu para aproximadamente 200. “Aqui era um ponto de passagem. Todo mundo vinha aqui.” 

Com o comércio sendo sua única fonte de renda, a situação gera preocupação para o sustento de sua família. Em 40 anos de funcionamento, a padaria nunca precisou reduzir seu quadro de funcionários, mas agora o proprietário se vê obrigado a tomar essa medida. “É a pior fase do meu comércio.” Atualmente, Edmilson emprega dez pessoas e terá que cortar quatro postos de trabalho. Além do impacto comercial, ele aponta que o fechamento da passagem prejudicou o acesso ao bairro como um todo. Edmilson sugere a reabertura da Rua da Bahia, que era mão dupla, como alternativa para aliviar o tráfego. “Ajudaria muito a gente”, afirma. Outra sugestão seria a criação de uma rua paralela à linha do trem, passando por baixo do viaduto, facilitando o acesso ao Hospital Albert Sabin. 

Loja de artesanato à beira da falência 

POCO RICO RUA DA BAHIA TREM FOTO LEONARDO COSTA 08
(Foto: Leonardo Costa)

Outro comerciante impactado é Elvio Rodrigues, proprietário de uma loja de artesanato há 30 anos no Poço Rico. Elvio relata que as vendas de seu estabelecimento caíram em 90% após o fechamento da linha férrea, colocando seu negócio à beira da falência. “Essa obra aqui, ela foi extremamente prejudicial para todo o entorno, não somente para o Poço Rico”, afirma. 

Ele explica que o acesso a bairros adjacentes como Granbery e Bom Pastor foi severamente comprometido, isolando o Poço Rico. “As pessoas que querem ter acesso ao Granbery, ao Bom Pastor e aos bairros adjacentes, elas não têm como usar essa passagem mais”, lamenta. Para Elvio, o fechamento “matou o bairro” e “matou o ganha-pão de várias pessoas”. Ele relata que cinco lojas já fecharam na região, e as que permanecem abertas não têm condições de funcionamento. “Estou aqui parado o dia inteiro, à toa. Muito difícil”, desabafa. 

Ele lamenta a maneira como as mudanças ocorreram, dizendo que não foi realizado nenhum estudo de impacto na comunidade. O comerciante, que antes faturava entre R$ 20 mil e R$ 30 mil por mês, agora não vende “absolutamente nada”. Com seu comércio sendo a única fonte de renda, Elvio está apreensivo com seu sustento. “Onde vou arrumar outro emprego aos 64 anos?” Ele reforça a sugestão de reabrir a Rua da Bahia em mão dupla, o que poderia “melhorar alguma coisa” em termos de acesso ao bairro. 

‘Acabou com o comércio’ 

Juam Maini, proprietário da loja Art Puxe, foi forçado a fechar uma de suas unidades e realocar a loja para dentro de seu espaço industrial, resultando na demissão de três funcionários. “Acabou com o comércio, o bairro acabou.” A unidade fechada, que operava como um ponto de atendimento, era vital para seu negócio. Agora, ele diz que está começando do zero com o atendimento em seu espaço industrial. “Aqui é a minha parte industrial. Lá, eu tinha espaço para atender um cliente com calma, para mostrar o produto, sem esse barulho.” 

O comerciante questiona a justificativa para o fechamento da passagem por parte da MRS, que seria a ocorrência de acidentes. “Eu estou aqui no posto há 35 anos. Teve apenas um acidente, mas isso em 30 anos.” Ele também critica a falta de planejamento e diz que a medida não deu nenhum retorno para o bairro. O comerciante ainda aponta a contradição de construir um viaduto em Santa Tereza, um bairro diferente de Poço Rico, sem resolver o problema de mobilidade local, que resulta em trânsito engarrafado nos horários de pico. 

Juam concorda que a volta da mão dupla na Rua da Bahia “ajuda”, mas acredita que uma solução mais eficaz seria mão única da Avenida Brasil em direção ao bairro, para facilitar o acesso. Ele critica a ineficácia das decisões tomadas e a falta de sensibilidade dos governantes. “Nosso governo não pensa em quem paga os impostos. Quem fez isso, fez errado.”  

‘O bairro está abandonado’ 

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(Foto: Leonardo Costa)

Os moradores e os comerciantes também manifestam prejuízos em relação a segurança do bairro após o fechamento. Edmilson descreve que, a partir das 19h, as ruas ficam desertas. “Era um bairro residencial. O pessoal saía, vinha nos comércios, andava na rua. Mas agora, quando chega 19h, todo mundo já está em casa. Não tem ninguém na rua”, explica. O longo tempo de deslocamento para a polícia chegar ao local, devido ao engarrafamento, torna a situação ainda mais complicada. “O engarrafamento para chegar na Rua da Bahia é uma meia hora no momento de pico”, diz. A insegurança também é uma preocupação para Elvio, que reforça o que Edmilson fala sobre as pessoas ficarem receosas de sair devido ao pouco movimento nas ruas. “A insegurança aqui aumentou bem”, observa. 

Para completar o cenário, a população afirma que o bairro também ficou mais sujo. “O bairro, depois desse fechamento total, ficou muito sujo. Tinha varredor constante. Agora, não tem mais”, afirma o proprietário da padaria, destacando a falta de zeladoria na região. “É um bairro que está totalmente abandonado. Está abandonado mesmo.” Os outros moradores entrevistados pela Tribuna, que preferiram não ser identificados, acrescentaram que a ausência de capina é outro problema urbano que tem se agravado no Poço Rico.  

PJF e MRS se posicionam sobre queixas da população  

A reportagem solicitou posicionamento da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) e da MRS a respeito das queixas dos moradores e do pedido por alternativas para reverter o impacto negativo do fechamento da passagem em nível aos comerciantes locais. A PJF reiterou que o fechamento da passagem em nível do Bairro Poço Rico aconteceu devido a intimação do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), determinando que a passagem deveria ser bloqueada sob pena de restituição total e corrigida dos valores gastos na construção do Viaduto Engenheiro Renato José Abramo. “A passagem de pedestres sobre a linha férrea construída recentemente foi obra de responsabilidade da MRS, então as demandas específicas sobre esse ponto devem ser encaminhadas à empresa.” 

Em relação às mudanças nos sentidos das ruas, o Executivo disse que a Secretaria de Mobilidade Urbana (SMU) realiza periodicamente estudos de trânsito para definir adequações que atendam às demandas da comunidade local e garantam, principalmente, a segurança viária. Já sobre as questões de zeladoria e varrição solicitadas, a PJF informou que as intervenções necessárias foram programadas para os próximos dias. “Pedidos como estes devem ser solicitados pela população por meio do Gabinete Comunitário (32) 3690-7241”, finaliza a Administração municipal. 

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(Foto: Leonardo Costa)

Já a MRS afirma que não se trata de uma decisão tomada pela empresa. “A MRS Logística esclarece que o fechamento da passagem em nível no Bairro Poço Rico, em Juiz de Fora, já estava previsto no convênio firmado entre o DNIT e a Prefeitura de Juiz de Fora.” Segundo a empresa, o objetivo foi viabilizar a construção de equipamentos de infraestrutura de mobilidade urbana para eliminar riscos de abalroamentos nas passagens em nível existentes no município, “salvando vidas, promovendo maior fluidez ao tráfego urbano e, por consequência, mais segurança para a população”. 

A MRS ficou a cargo da elaboração dos projetos executivos das obras previstas no convênio. O DNIT disponibilizou os recursos financeiros e a Prefeitura de Juiz de Fora ficou responsável pela execução dos empreendimentos. Entre as intervenções entregues e em operação estão os viadutos Hélio Fadel, Roza Cabinda, a alça do Viaduto Augusto Franco e o Viaduto Renato José Abramo (Tupinambás), construído mediante a contrapartida do fechamento da passagem em nível do Poço Rico para veículos. 

“Importante destacar que a passagem em nível foi revitalizada e entregue à comunidade pela MRS, estando acessível e em plenas condições de uso como travessia segura para pedestres.” A empresa disse que está à disposição para esclarecimentos e diálogo com a sociedade e o Poder Público. 

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