‘Ovos de Ouro’: preço do ovo dispara antes da Quaresma

Apesar de ser considerado sazonal, aumento na proteína impacta consumidores e comerciantes


Por Mariana Souza*

21/02/2025 às 06h00

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(Foto: Leonardo Costa)

O preço dos ovos apresentou aumento expressivo na última semana, chegando a 40% no atacado, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras). No varejo, a inflação dos produtos avícolas e ovos foi de 1,69% em janeiro, conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulando alta de 7,84% nos últimos 12 meses, conforme o IBGE. 

De acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o aumento é sazonal e ocorre tradicionalmente no período que antecede a Quaresma. Entretanto, outros aspectos contribuem para a alta, como o aumento nos custos de produção ao longo dos últimos oito meses. O milho, principal componente da ração das aves, teve reajuste de 30%, enquanto os custos com embalagens mais que dobraram. As temperaturas elevadas também impactaram a produtividade das aves, reduzindo a oferta do produto.

Os consumidores sentem diretamente o impacto no bolso. A manicure Thaila Maria, 27 anos, consome ovos quase diariamente e afirma que não há como substituí-los, pois são essenciais em diversas receitas. Antes, pagava entre R$ 8 e R$ 10 pela cartela de 20 ovos, mas agora desembolsa, em média, R$ 17 por semana, diz. Já Poliana Gomes, 29, dona de casa, relata que o preço dobrou, passando de R$ 9,90 para R$ 19,90, também a cartela com 20 ovos. Como consome a proteína diariamente, precisa adquirir com frequência e também não consegue substituto na alimentação.

Para o comerciante Érico de Paula, 62, proprietário da Nutri Sempre, as vendas de ovos seguem estáveis, embora o aumento nos preços tenha impactado diretamente seus custos. Antes, ele pagava R$ 220,00 pela caixa com 30 dúzias de ovos adquiridos de fornecedores. Hoje, o preço subiu para R$ 350,00 pela mesma quantidade. Em relação aos preços de venda, Érico vendia a dúzia de ovos brancos por R$ 10, e os ovos vermelhos, por R$ 12. Atualmente, ele comercializa a dúzia de ovos brancos por R$ 15, e os ovos vermelhos, por R$ 17. Isso representa  aumento de 50% no preço dos ovos brancos e 42% no preço dos ovos vermelhos.

Ceasa registra aumento de quase 50% em um ano 

A Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasa) registrou aumento expressivo nos preços do alimento entre 15 de fevereiro de 2024 e 17 de fevereiro de 2025, com reajustes que chegaram a 47,8%. O ovo de granja vermelho extra liderou o aumento, com  reajuste de 47,8%, passando de R$ 230 para R$ 340 a caixa com 30 dúzias. O ovo de granja branco extra subiu 45%, indo de R$ 200 para R$ 290. O ovo de granja branco grande também teve acréscimo considerável, de 38,5%, subindo de R$ 195 para R$ 270. Os valores referem-se a Juiz de Fora. 

Além dos ovos de galinha, o ovo de codorna também teve alta no período, de 36,4%, passando de R$ 110 para R$ 150 a caixa com 50 dúzias. O ovo de granja branco médio teve o menor reajuste entre os ovos, mas ainda assim subiu 25%, indo de R$ 120 para R$ 150.

Odila Maria de Oliveira, 62 anos, consome ovos diariamente, com uma média de quatro unidades por dia. Antes, ela pagava R$ 10 pela cartela de ovos brancos, mas agora custa R$ 14,90. Quando não consegue um preço razoável, ela precisa deixar de consumir. Além do aumento de preço, Odila também reclama da queda na qualidade dos ovos em alguns estabelecimentos.

Para garantir ovos frescos, Helio José Paulo Filho, responsável pelo Box do Buriti, no Mercado Municipal, precisou adaptar sua forma de abastecimento. Antes, buscava os produtos na Ceasa, hoje compra diretamente de pequenos produtores vizinhos para atender sua clientela fiel. “A Ceasa exige um mínimo de compra, como uma caixa com 30 ou 15 dúzias. Com o calor e um prazo de 20 dias para consumo, a baixa demanda dificulta a venda nesse período. Por isso, prefiro adquirir em menores quantidades para garantir sempre produtos frescos aos meus clientes”, explica.

Redução do peso e nova lei

A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) alertou para mais um desafio enfrentado pelos consumidores: além do impacto financeiro, quem compra ovos nos supermercados tem lidado com uma redução no peso médio do produto. A decisão, tomada pela Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura e Pecuária, resultou em uma diminuição de quase 10 gramas por unidade, o que afeta diretamente o custo-benefício para os consumidores.

Além disso, a partir de março, ovos destinados ao consumo direto, sem embalagem primária, deverão conter informações na casca, como data de validade e registro do produtor, permitindo a rastreabilidade do produto. O objetivo da portaria é reforçar a segurança alimentar dos consumidores e viabilizar a identificação da origem dos ovos em casos de contaminação ou outros problemas sanitários.

Oferta limitada

A Tribuna foi às ruas na quinta-feira (20) e encontrou estabelecimento já adotando restrições na venda de ovos. Em um hortifrúti localizado no Centro, por exemplo, uma placa informa que a compra está limitada a quatro cartelas por cliente.

De acordo com Márcio Milan, vice-presidente da Abras, as empresas já começaram a programar o abastecimento das lojas para atender à demanda sazonal da Quaresma. No entanto, ele destaca que a restrição na oferta e o aumento contínuo nos preços geram preocupações nos supermercados. Além disso, ele aponta que os consumidores estão recorrendo mais aos ovos de galinha, devido ao aumento nos preços de outras proteínas.

José Márcio Gerônimo, gerente do estabelecimento Caçulinha, afirma que, apesar do aumento no preço, a demanda por ovos continua alta – e até cresceu devido à escassez do produto. “A procura está muito boa, mas o preço segue elevado, pois a oferta é limitada”, comenta. Antes, a empresa comprava os ovos diretamente de fornecedores por valores entre R$ 180 e R$ 200 pela caixa com dez cartelas de 20 ovos. Atualmente, esse valor aumentou para R$ 280. No mercado, a dúzia de ovos, que antes era vendida por R$ 9,90, agora custa R$ 17,90, aumento de 80%.

Já Evandro Valverde, proprietário do  Valverde, identifica as vendas de ovos sofreram leve redução. “O aumento de cerca de 50% no valor dos ovos acaba impactando”, afirma. Antes, Evandro pagava R$ 7,50 pela cartela com 20 ovos, adquiridos de uma fornecedora direta. Com a alta dos preços, ele tem buscado alternativas que garantam qualidade a um custo mais acessível. Atualmente, a mesma cartela custa R$ 15 para o comerciante. A margem de lucro também foi comprometida. “Trabalhamos com um retorno de 20%, mas, com essa alta, fica difícil fazer promoções como antes. Hoje, vendemos a cartela por R$ 17, mas pagamos R$ 15, então não há como oferecer descontos duas vezes por semana, como fazíamos”, explica.

Conforme dados do Instituto Ovos Brasil, em 2023, o país produziu mais de 52,4 bilhões de ovos, consolidando-se como o quinto maior produtor mundial. Minas Gerais, por sua vez, ocupa o segundo lugar na produção nacional, sendo responsável por mais de 10% da produção do país. O consumo médio per capita de ovos no Brasil aumentou de 242 unidades em 2023 para 269 unidades em 2024, com expectativa de atingir 272 unidades por pessoa em 2025.

Impacto em outro produtos

O aumento expressivo no preço dos ovos tem gerado impacto importante para as padarias. “A maioria das receitas de panificação leva ovos, e o preço subiu drasticamente, o que interfere diretamente nos custos”, afirma Heveraldo Lima de Castro, presidente da Sindicato dos Panificadores de Juiz de Fora. “Os ajustes nos valores estão sendo feitos com cautela, pois o poder de compra do consumidor está baixo. No entanto, algumas receitas já estão gerando prejuízo, o que nos obriga a rever os preços sem comprometer a qualidade. Produtos que antes tinham uma margem maior agora rendem menos”, explica Heveraldo.

Mesmo com esse esforço, ele alerta que segurar os preços pode não ser sustentável por muito tempo. “Por enquanto, algumas padarias evitam repassar a alta para o consumidor, mas essa estratégia pode não durar”, diz. O consumo de ovos no setor é elevado. “Algumas padarias chegam a utilizar até 20 caixas por semana, o equivalente a 600 dúzias de ovos”, destaca o presidente do sindicato. 

O comerciante Leonardo Homem, dono da Cantina do Léo, relata que utiliza, em média, 200 ovos por semana, o equivalente a duas cartelas por dia. Antes, pagava R$ 180 pela caixa com 360 ovos, mas agora desembolsa R$ 330. E o cenário pode piorar. “Vai aumentar depois do carnaval”, prevê. 

*estagiária sob supervisão da editora Fabíola Costa

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