Com redução orçamentária, UFJF planeja corte de terceirizados e de bolsas
Para conter gastos, 860 bolsas acadêmicas e 307 empregados serão cortados do quadro universitário. Restrições podem dificultar o retorno presencial
O reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Marcus David, anunciou, na manhã desta quarta-feira (14), alterações no funcionamento da instituição para adequar os gastos à previsão de receitas de 2021 imposta pelo Ministério da Educação (MEC). Com redução orçamentária de 20% em relação ao ano anterior, 860 bolsas acadêmicas e 307 funcionários terceirizados serão cortados do quadro universitário, enquanto as políticas de manutenção estudantil também sofrerão forte retração, com diminuição dos valores. Segundo a Universidade, as restrições do orçamento ainda podem dificultar o retorno presencial das atividades estudantis.
Pelo orçamento da União aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado em março – que depende apenas da sanção do presidente Jair Bolsonaro para entrar em vigor -, a UFJF terá de reduzir despesas das políticas de assistência estudantil, bolsas de ensino, pesquisa e extensão, além de obras e serviços de manutenção do campus de Juiz de Fora. Com a disponibilização de verbas debilitada, o Conselho Superior (Consu) da Universidade aprovou, após discussões na última sexta-feira (9) e na segunda (12), medidas severas de contenção de gastos. “Definitivamente, nós chegamos ao ponto em que nós não tínhamos como administrar essa situação sem absorver cortes muito duros no funcionamento da nossa instituição”, justifica David.
Além da perda de 860 bolsas acadêmicas, que significa 35% do total fornecido pela UFJF, a Universidade também vai reduzir o valor daquelas que ainda serão mantidas. Auxílios de R$ 400 reais por aluno, que incluem bolsas de pesquisa, treinamento profissional e monitoria, serão reduzidos para R$ 300. Bolsas de assistência estudantil que anteriormente vigoravam com o valor de R$ 500, atendendo aos alunos mais vulneráveis, passam ao valor de R$ 400; enquanto as bolsas de auxílio moradia, também para estudantes em situação de vulnerabilidade financeira, serão reduzidas de R$ 370 para R$ 340.
De acordo com o reitor, a instituição de ensino optou por manter as bolsas de pós-graduação, que envolvem alunos do mestrado e do doutorado, mas com redução de 75% dos valores destinados aos programas de pós-graduação. O corte influencia na compra de insumos necessários para a realização de pesquisas e na participação de estudantes em eventos acadêmicos. “Certamente, a produção de conhecimento desses programas fica comprometida”, lamenta Marcus David.
Outra faceta da retração orçamentária será nos serviços administrativos da UFJF, com corte de 307 postos de trabalho referentes aos funcionários terceirizados da instituição. A decisão foi tomada após análise de todos os contratos que a Universidade possui, segundo David. “Além do grave problema social e econômico que esse problema gera, nós temos que anunciar que essa decisão gera impacto na qualidade do funcionamento da nossa Universidade”, alerta.
Retorno presencial prejudicado
As adequações também vão causar dificuldades no planejamento do retorno presencial das atividades universitárias, de acordo com o reitor. Com a necessidade de adaptação da estrutura da UFJF e também de compra de itens que garantam a segurança sanitária, a Universidade precisaria de uma ampliação de investimento, conforme Marcus David. “Nós temos que colocar os estudantes com EPIs (equipamentos de proteção individual) e temos que fazer adaptações nos laboratórios. Necessitamos de uma ampliação no orçamento de 2021 para que possamos fazer as adaptações para retornarmos o mais rapidamente com as atividades presenciais. Essa lógica da ampliação de gastos nos locais onde ocorre o enfrentamento da pandemia deveria ser a lógica do Governo federal”, argumenta.
Com a necessidade emergencial de conter gastos, as adequações levaram em conta o cenário atual de aulas à distância. Um futuro retorno presencial das atividades, então, vai demandar uma nova análise da situação pelo Consu e novas alterações. “Os estudos feitos para a redução do quantitativo consideraram algumas atividades presenciais suspensas e que, quando voltarmos plenamente, teremos outro tipo de dificuldade para deliberar sobre isso. Imaginando um retorno pleno das atividades, o desafio será ainda mais difícil”, projeta David.
Arrocho após o teto de gastos
A UFJF atribui as restrições orçamentárias à Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos, sancionada em 2016. Comparando o orçamento de 2021 com o de cinco anos atrás, os gastos foram reduzidos em mais de R$ 75 milhões, atingindo todos os âmbitos do funcionamento da Universidade: custeio de bolsas, apoio estudantil, obras e serviços de manutenção.
O efeito dos sucessivos cortes nos últimos cinco anos é a necessidade da realização de contenções severas que foram anunciadas hoje pela administração universitária, de acordo com o reitor. “Começamos com o capital de investimento de 157 milhões (em 2016), e recebemos agora 80 milhões. Foi no ano de 2016 que o Brasil fez uma opção que claramente sinalizava para consequências fortes no futuro”, avalia.
“São mais de 300 famílias desamparadas”, afirma sindicato
O Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Asseio, Conservação e Limpeza Urbana (Sinteac), entidade que representa os trabalhadores terceirizados da UFJF, já esperava o corte de empregos, segundo o presidente Sérgio Félix. Desde o ano anterior, os efeitos da contenção de gastos já são sentidos pela categoria, que passou a conviver com demissões. “Devido aos cortes do Governo federal nas instituições, essa situação já era esperada. No ano passado, já houve algumas reduções e agora ocorrem essas demissões”, conta.
O presidente do Sinteac afirmou não se lembrar de um quantitativo tão grande de demissões simultâneas pela UFJF. “Nós estamos em uma situação de penúria. São mais de 300 famílias desamparadas. E, principalmente, na nossa categoria, em que a reposição dos trabalhadores no mercado de trabalho é quase impossível, por conta da idade e da escolaridade, que é mais baixa”, lamenta Félix.
“Tentativa de extinguir a produção científica”, alerta entidade estudantil
O Diretório Central dos Estudantes (DCE), por sua vez, lembrou a importância da pesquisa pública brasileira, sobretudo durante o período de pandemia. “Frente à crise sanitária e econômica que nosso país se encontra, a ciência advinda do ensino público é ainda mais fundamental para que possamos superar esse momento e é inadmissível que o governo interrompa a ampliação de estudos tão importantes para nossa conjuntura”, afirma a conselheira do DCE, Maria Edna Fernandes.
Na visão da entidade, o Governo federal tem as instituições públicas de ensino como “inimiga”. “Estamos denunciando os cortes orçamentários nas universidades como uma tentativa do Governo Bolsonaro de extinguir a produção científica, a formação de pensamento crítico e uma ameaça à educação superior e técnica brasileira”, alerta a representante estudantil.