Estudo juiz-forano insere musculação nas sessões de hemodiálise
Junto das demoradas e rotineiras sessões de hemodiálise, inaptidão para algumas atividades até então cotidianas, perda de massa muscular, queda no vigor físico, baixa autoestima e, em alguns casos, até mesmo depressão. Estes costumam ser quadros comuns em pessoas que enfrentam o método de filtração do sangue. Mas um projeto desenvolvido por estudantes e pesquisadores das faculdades de medicina e educação física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) busca trazer mudanças para este cenário. Criado em 2014, e realizado no Centro de Tratamento de Doenças Renais (CTDR), em funcionamento no Bairro São Mateus, o estudo leva aulas de musculação para 15 assistidos atendidos pelo SUS e convênios particulares. Além de ser pioneiro em Minas Gerais, o estudo é um dos primeiros a tratar o assunto em nível nacional.
Após passar por avaliações com nefrologistas, cardiologistas e educadores físicos, que verificaram a aptidão para os exercícios, o paciente renal Antônio Carlos da Silva, 56 anos, passou a conviver com halteres, caneleiras e anilhas todas as segundas, quartas e sextas-feiras, durante as sessões de hemodiálise. Uma nova rotina que gradativamente vem surtindo efeitos, segundo ele próprio. “Antes eu tinha muita dor pelo corpo, mas agora parou. Confesso que ganhei ânimo para vir à clínica, já que agora tenho alguma coisa para preencher meu tempo. Por não conseguir deitar e dormir, como muitos fazem, ficar parado era uma agonia para mim. Com certeza, dos quatro anos que faço hemodiálise, esses últimos oito meses (tempo em que foi inserido no projeto) foram os que ganhei mais qualidade de vida”, revela.
Por estarem ligados à máquina, as séries têm que ser montadas levando em consideração a especificidade da situação. Mesmo assim, não falta disposição. Nem mesmo a manhã fria no dia da visita da Tribuna tirou o bom humor do grupo. Se nem sempre a disposição é observada entre todos os frequentadores das academias convencionais, o sorriso fácil reina nos hemodialíticos.
Além da notável disposição, dados coletados e analisados pela equipe de estudo comprovam melhoria na qualidade de vida, ganho de força e minimização dos efeitos das sessões. Um exemplo está no aumento do deslocamento. “Antes do início das aulas, eles davam entre 2.400 a 2.500 passos por dia. Agora, são aproximadamente 5.400, mais da metade dos dez mil, número para que uma pessoa seja considerada ativa”, avalia o doutorando da UFJF, Antônio Paulo de Castro, um dos mentores do projeto.”Outra situação observada é que muitos faziam uso de medicamentos para conseguir controlar problemas de pressão e de qualidade do sono, por exemplo. A partir da musculação, as doses foram reduzidas ou até mesmo eliminadas”.
Que o diga o paciente José Ramos da Silva. Aos 66 anos, quase dez deles necessitando das hemodiálises, ele também avalia positivamente o estudo. “Comecei (a fazer parte do estudo) em outubro do ano passado e acho uma maravilha. Toda vida caminhei muito, mas os exercícios me fizeram voltar aos 100%. Lá pelo décimo quinto dia após eu ter começado, eu já tinha abandonado o remédio para dormir. Hoje não necessito tanto do Rivotril. O que os meninos mandam eu fazer, eu faço”, brinca.
Bom, saudável e barato
Como toda boa inovação, além da melhora dos aspectos físicos e psicológicos dos assistidos, o estudo pode ajudar a desafogar uma demanda muitas vezes onerosa para o Estado. Com um investimento relativamente baixo, que envolve basicamente a compra e esporádica manutenção de equipamentos, além do pagamento das bolsas aos pesquisadores, o investimento na expansão do projeto pode apresentar cifras bem mais modestas se comparado ao montante destinado pelo Governo aos remédios. “Certamente, a compra dos medicamentos acaba sendo muito mais cara do que a manutenção da musculação nas clínicas de hemodiálise. Sem contar que muitas vezes faltam remédios básicos para os usuários do SUS. Se o projeto pudesse ser oferecido a todos que fazem hemodiálise, teríamos profissionais em contato direto com os pacientes, ajudando a reduzir o uso da medicação e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida”, analisa Antônio Paulo.
Melhoria que passa pelo resgate de funções cotidianas, muitas vezes reduzidas após o diagnóstico da necessidade da filtração sanguínea via diálise. “Faço os exercícios há cinco meses, estou mais feliz e melhorei muitas das minhas atividades de casa. Hoje varro, passo, limpo o chão, sem ficar muito cansada. Durante os cinco anos de hemodiálise, eu tinha muitas câimbras e agora não. Até mesmo as minhas filhas perceberam melhoras em mim. Agora também bato perna para lá e para cá na rua”, revela aos risos Nísia Pinto de Oliveira, de 69 anos.
O próximo passo do estudo é aumentar o número de pacientes assistidos e firmar convênios com outras clínicas interessadas na cidade. Segundo os pesquisadores, algumas parcerias que estão sendo fechadas com outros núcleos de pesquisa podem, em um futuro próximo, levar o projeto para outras partes do país.