Palmadas e beliscões ainda são aplicados a crianças por quase 30% dos cuidadores, aponta pesquisa

Estudo mostra desconhecimento sobre a importância da primeira infância e o uso de práticas disciplinares agressiva


Por Tribuna

09/08/2025 às 14h00- Atualizada 09/08/2025 às 14h39

Palmadas e beliscões ainda são aplicados a crianças por quase 30% dos cuidadores, aponta pesquisa
(Foto: Pexels)

Apesar da proibição legal, 29% dos cuidadores de crianças de até 6 anos admitem utilizar castigos físicos, como palmadas e beliscões, como forma de disciplina. Desses, 13% afirmam adotar essas práticas com frequência. Os dados são do levantamento Panorama da Primeira Infância: O que o Brasil sabe, vive e pensa sobre os primeiros seis anos de vida, divulgado nessa semana pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, em parceria com o Instituto Datafolha.

O estudo indica que 17% dos entrevistados consideram os castigos físicos eficazes, sendo que 12% admitem agredir crianças mesmo reconhecendo que a prática não é eficiente. A pesquisa ouviu 2.206 pessoas em todo o país, das quais 822 são cuidadoras de crianças de até 6 anos. A divulgação integra as ações do Agosto Verde, campanha de conscientização sobre a importância da primeira infância.

No Brasil, desde 2014, a Lei 13.010, conhecida como Lei Menino Bernardo ou Lei da Palmada, proíbe castigos físicos e tratamento cruel ou degradante aplicados a crianças e adolescentes. A legislação prevê advertência e encaminhamento dos responsáveis para cursos e programas de orientação. A lei leva o nome de Bernardo Boldrini, morto aos 11 anos após sofrer agressões do pai e da madrasta, em Três Passos (RS), em abril daquele ano.

A diretora-executiva da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Mariana Luz, avalia que os dados da pesquisa refletem a repetição de um padrão cultural ineficaz. “A gente é o país do ‘eu apanhei, sim, e estou aqui, sobrevivi’. A gente é o país que acha a criança inferior”, afirmou em entrevista à Agência Brasil. Para Mariana, os castigos físicos não contribuem com a educação e não devem ser considerados formas adequadas de disciplina.

A fundação alerta que nenhuma forma de violência contra crianças é inofensiva, apontando consequências como desenvolvimento de agressividade, ansiedade, depressão e marcas físicas. A pesquisa mostra que 14% dos cuidadores gritam ou brigam com crianças. Ainda assim, os métodos disciplinares mais mencionados foram conversar e explicar o erro (96%) e acalmar a criança ou retirá-la da situação (93%).

Entre os cuidadores que admitem praticar agressões, 40% acreditam que a medida resulta em maior respeito à autoridade. Um terço (33%) reconhece que o impacto é o aumento da agressividade da criança, e 21% identificam prejuízos à autoestima e à confiança dos filhos.

“A violência, a palmada, as agressões, as violações de direitos, os abusos, as negligências são detratores diretos do desenvolvimento”, enfatiza Mariana Luz. Ela também observa que ainda há resistência social à intervenção em casos de violência infantil. “Um cachorro você não agride em praça pública, porque alguém vai denunciar. Uma criança não, ela recebe um tapa, um berro, um beliscão dentro de um equipamento público e ninguém fala nada”, comenta.

Outro dado que chama atenção, segundo Mariana Luz, é o desconhecimento sobre a primeira infância. De acordo com a pesquisa, 84% dos entrevistados não sabem que essa é a fase mais importante do desenvolvimento humano, e apenas 2% souberam identificar corretamente o período – que vai do nascimento até os 6 anos, conforme a legislação brasileira.

“Todos os picos do desenvolvimento físico, motor, cognitivo e socioemocional acontecem nos primeiros seis anos de vida”, explica a diretora. Ela ressalta que, nessa fase, o cérebro da criança realiza cerca de 1 milhão de sinapses por segundo, com 90% das conexões cerebrais já estabelecidas.

Apesar das evidências científicas, 41% dos entrevistados acreditam que o desenvolvimento mais significativo ocorre na vida adulta e 25% indicaram a faixa etária entre 12 e 17 anos como a mais relevante. Mariana defende ações de conscientização para ampliar o conhecimento sobre a importância da primeira infância. “A terceira idade hoje está super consolidada, mas houve uma época em que também não havia esse entendimento claro”, compara.

Ela cita estudos do economista James Heckman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2000, que indicam que cada dólar investido na primeira infância pode gerar sete dólares de retorno. “A primeira infância traz melhorias para diversas áreas, como educação, saúde, segurança pública e geração de emprego e renda”, afirma.

A pesquisa também investigou quais práticas são consideradas mais importantes para o desenvolvimento infantil. Para 96% dos entrevistados, ensinar a respeitar os mais velhos é prioridade, superando ações como conversar com a criança (88%), frequentar creches e pré-escolas (81%) e permitir que a criança brinque (63%).

Para a diretora-executiva, o resultado revela uma baixa valorização da educação infantil e do brincar. “A brincadeira é o eixo principal da aprendizagem na primeira infância. Você não pode sentar uma criança pequenininha em uma cadeira e escrever no quadro negro, você precisa do processo lúdico”, defende.

Em relação ao uso de telas, a média de exposição diária das crianças de até 6 anos é de duas horas. Em 40% dos casos, esse tempo varia de duas a três horas. A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que crianças de até 2 anos não tenham contato com telas e, entre 2 e 5 anos, o limite seja de uma hora por dia, sempre com a presença de um adulto.

Mariana Luz reconhece que, muitas vezes, a realidade impõe desafios. “A pessoa não tem com quem deixar”, observa. Como alternativa, sugere incluir a criança na rotina da casa, como nas tarefas domésticas. Ela destaca também que é dever do Estado oferecer vagas em creches, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2022, que reafirma o direito à educação para crianças de até 5 anos.

“A responsabilidade dessa criança, pela Constituição, é minha, sua, é da família, é do Estado”, conclui.

*Texto com informações da Agência Brasil, reescrito com o auxílio do Chat GPT e revisado por nossa equipe

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