Estudo mostra que dias com ondas de calor no paĆs aumentaram de 7 para 52 no ano
RegiĆ£o Sul foi a que menos elevou as temperaturas, mas tem sido a mais afetada pelas chuvas extremas ao longo das Ćŗltimas dĆ©cadas
O paĆs estĆ” cada vez mais quente. As temperaturas extremas sentidas em vĆ”rias regiƵes do Brasil nesta semana nĆ£o sĆ£o um fenĆ“meno isolado. De acordo com um novo estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a mĆ©dia de dias com onda de calor no territĆ³rio nacional passou de sete para 52 nos Ćŗltimos 30 anos. A pesquisa, feita a pedido do MinistĆ©rio da CiĆŖncia, Tecnologia e InovaĆ§Ć£o (MCTI) para a atualizaĆ§Ć£o do Plano Clima – AdaptaĆ§Ć£o, foi desenvolvida para responder Ć seguinte pergunta: como o clima estĆ” mudando no Brasil?
Os especialistas envolvidos no estudo apontam que conhecer as mudanƧas climĆ”ticas Ć© essencial para identificar a ameaƧa e analisar possĆveis impactos, vulnerabilidades e adaptaĆ§Ć£o. O cĆ”lculo foi elaborado com base em dados das seis Ćŗltimas dĆ©cadas. Os pesquisadores estabeleceram 1961 a 1990 como perĆodo de referĆŖncia e efetuaram anĆ”lises segmentadas sobre o que aconteceu com o clima para trĆŖs perĆodos: 1991-2000, 2001-2010 e 2011-2020.
O estudo define onda de calor como “o mĆnimo de seis dias consecutivos em que a temperatura mĆ”xima superou um limiar de ao menos 10% do que Ć© considerado extremo, comparado ao perĆodo de referĆŖncia”. O resultado mostra que houve aumento gradual das anomalias de ondas de calor em praticamente todo o Brasil, exceto a RegiĆ£o Sul, a metade Sul do estado de SĆ£o Paulo e o Sul do Mato Grosso do Sul.
Para se ter uma ideia, no perĆodo de 1961 a 1990, o nĆŗmero de dias com ondas de calor nĆ£o ultrapassava sete, enquanto entre 1991 a 2000 subiu para 20 dias; entre 2001 e 2010 atingiu 40 dias; e de 2011 a 2020, o nĆŗmero de dias com ondas de calor chegou a 52. Os nĆŗmeros ainda nĆ£o incluem os dados referentes a 2023, que caminha para ser o mais quente da histĆ³ria.
“Essas informaƧƵes sĆ£o a fonte que podemos reportar como fidedignas daquilo que estĆ” sendo sentido no dia a dia da sociedade. Estamos deixando de perceber para conhecer. Esse Ć© um diferencial de termos essa fonte de dados robusta”, afirmou o diretor do Departamento para o Clima e Sustentabilidade do MCTI, Osvaldo Moraes.
Nordeste mais quente, e Sul mais chuvoso
A pesquisa do Inpe tambĆ©m aponta que o Nordeste do paĆs registrou nĆ£o sĆ³ mais dias com ondas de calor, como tambĆ©m recordes de temperaturas mĆ”ximas. No perĆodo de referĆŖncia, a mĆ©dia de temperatura mĆ”xima no Nordeste era de 30,7 graus e sobe, gradualmente, para 31,2 entre 1991-2000, 31,6 em 2001-2010 e 32,2 em 2011-2020. Em relaĆ§Ć£o a taxa de precipitaĆ§Ć£o acumulada, do Nordeste ao Sudeste e na RegiĆ£o Central foi registrada queda no perĆodo de chuvas, enquanto a RegiĆ£o Sul e parte dos estados de SĆ£o Paulo e Mato Grosso do Sul apresentaram aumento entre 10% e 30% das chuvas.
Os mapas mostram que a RegiĆ£o Sul vem sendo a mais afetada pelas chuvas extremas ao longo das Ćŗltimas dĆ©cadas. No perĆodo de referĆŖncia, a precipitaĆ§Ć£o mĆ”xima em cinco dias era de cerca de 140 milĆmetros (mm). O nĆŗmero subiu para uma mĆ©dia de 160 mm. “SĆ£o dados relevantes para fazer a ciĆŖncia climĆ”tica dar suporte Ć tomada de decisĆ£o. Estamos deixando a percepĆ§Ć£o de lado para aprofundar o conhecimento”, destaca Osvaldo.
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Planejamento contra futuras crises
Um dos objetivos do estudo Ć© ajudar no planejamento contra futuras crises. Conforme o levantamento, os principais desafios na adaptaĆ§Ć£o Ć s mudanƧas climĆ”ticas devem ser enfrentados pelos setores de energia e agropecuĆ”ria. TambĆ©m foi identificado que as mudanƧas afetam as regiƵes do paĆs de forma distintas: enquanto em algumas Ć”reas hĆ” aumento de temperatura, em outras observa-se aumento da precipitaĆ§Ć£o ou ocorrĆŖncia de seca.
Para o estudo, foram considerados dados observacionais de 1.252 estaƧƵes meteorolĆ³gicas convencionais, sendo 642 estaƧƵes manuais e 610 automĆ”ticas para construir as sĆ©ries de temperatura mĆ”xima, e um total de 11.473 pluviĆ“metros para os dados de precipitaĆ§Ć£o. Os pesquisadores destacam a importĆ¢ncia de observar o conjunto das informaƧƵes e nĆ£o apenas indicadores isolados.
O pesquisador do Inpe Lincoln Alves, que coordenou os estudos, reforƧa que o relatĆ³rio do painel do clima da ONU (IPCC) jĆ” havia abordado os impactos das mudanƧas climĆ”ticas em diversas partes do mundo de forma distinta. “Nossas anĆ”lises revelam claramente que o Brasil jĆ” experimenta essas transformaƧƵes, evidenciadas pelo aumento na frequĆŖncia e na intensidade de eventos climĆ”ticos extremos em vĆ”rias regiƵes desde 1961, que irĆ£o se agravar nas prĆ³ximas dĆ©cadas proporcionalmente ao aquecimento global.”