Qual a regiĆ£o mais quente de Juiz de Fora? Estudo registra 46,8 graus durante onda de calor
Pouco verde e recursos hĆdricos, alĆ©m de intensa urbanizaĆ§Ć£o, fazem com que moradores de alguns bairros da cidade sintam calor de forma mais intensa do que outrosĀ
Daqui a uma semana, no dia 22, o inverno chega ao fim no Brasil com poucos registros de dias com frio intenso. O cenĆ”rio atĆpico alerta para uma primavera e verĆ£o ainda mais quentes do que o esperado. Ao transitar por diferentes regiƵes de Juiz de Fora, Ć© possĆvel sentir Ć”reas mais amenas e outras com calor mais rigoroso. Pesquisadores do LaboratĆ³rio de Climatologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) analisam o comportamento do tempo no municĆpio desde a dĆ©cada de 1970 e desenvolveram estudos sobre as zonas mais quentes e, consequentemente, mais secas da cidade.Ā
Em entrevista Ć Tribuna, a climatologista e professora da UFJF CĆ”ssia Ferreira, a frente desses estudos, explica que a pouca arborizaĆ§Ć£o, recursos hĆdricos reduzidos e a intensa urbanizaĆ§Ć£o faz com que alguns locais sejam mais quentes do que outros em uma cidade. No caso de Juiz de Fora, tais caracterĆsticas sĆ£o percebidas no triĆ¢ngulo entre as avenidas Rio Branco e GetĆŗlio Vargas.Ā
Para se ter uma ideia, os estudos chegaram a registrar 46,8 graus na Avenida GetĆŗlio Vargas, esquina com a Rua Floriano Peixoto, durante uma onda de calor em 12 de novembro do ano passado. De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a temperatura mĆ”xima da cidade em 2023 foi de 35,8 graus.
Essa diferenƧa acontece devido Ć posiĆ§Ć£o em que as mediƧƵes ocorrem. Conforme a pesquisadora, o dado do Inmet foi extraĆdo do 5Āŗ Distrito de Meteorologia, localizados no campus da UFJF, que tem caracterĆsticas de uso e ocupaĆ§Ć£o distintas das do centro de Juiz de Fora, onde o LaboratĆ³rio de Climatologia aferiu a marca de 46,8 graus.
“A UFJF tem quase 300 metros de altitude a mais do que o centro da cidade, este fato tambĆ©m interfere na temperatura do ar. Mesmo que o dado oficial represente a temperatura oficial da cidade, dentro do ambiente urbano vamos ter temperaturas mais altas e talvez mais baixas do que esse valor, em funĆ§Ć£o das caracterĆsticas urbanas de cada localidade. Por isso, o LaboratĆ³rio de Climatologia tenta fazer registro da temperatura em outras regiƵes da cidade, principalmente no centro, pois em funĆ§Ć£o das caracterĆsticas de uso e ocupaĆ§Ć£o da Ć”rea: muito prĆ©dios altos, asfalto, alta circulaĆ§Ć£o de veĆculos, quase inexistĆŖncia de Ć”reas verdes, gera um ambiente mais quente. A esse fenĆ“meno, chamamos de ilha de calor”, explica a climatologista.
Tempo mais quente e secoĀ
Ao descer o calƧadĆ£o da Rua Halfeld da altura do Parque Halfeld atĆ© a GetĆŗlio Vargas, a sensaĆ§Ć£o de calor aumenta, e isso tem relaĆ§Ć£o com a formaĆ§Ć£o de ilhas de calor. AlĆ©m da falta de vegetaĆ§Ć£o e de corpos hĆdricos nessas Ć”reas, o concreto dos prĆ©dios, o asfalto e alta densidade populacional, assim como o intenso trĆ”fego de veĆculos, contribuem para temperaturas acima da casa dos 30 graus e umidade relativa do ar abaixo de 30%. āNeste ano, estamos estamos tendo uma mĆnima de umidade do ar bem mais significativa por causa da ausĆŖncia de chuva – esperada no inverno – e das temperaturas bem mais elevadas do que o padrĆ£o para a Ć©poca, o que resulta em mais evaporaĆ§Ć£o e perda de Ć”gua da superfĆcie, consequentemente, um tempo mais secoā, aponta a pesquisadora.Ā
Em relaĆ§Ć£o aos bairros, SĆ£o Pedro Ć© o que apresenta temperaturas mais amenas, em razĆ£o da arborizaĆ§Ć£o viĆ”ria, recursos hĆdricos e altitude, enquanto no SĆ£o Mateus e Manoel HonĆ³rio, por exemplo, o calor Ć© maior. āEssa definiĆ§Ć£o dos espaƧos mais e menos quentes estĆ” muito atrelada ao prĆ³prio processo de urbanizaĆ§Ć£o da cidade. EntĆ£o, as Ć”reas muito adensadas tendem a ser mais quentes e, consequentemente, mais secas.āĀ
āCidade precisa de menos concreto e mais verdeāĀ
HĆ” dĆ©cadas pesquisando sobre o tema, a pesquisadora acredita que a cidade ainda estĆ” atrasada em relaĆ§Ć£o a aƧƵes efetivas e polĆticas pĆŗblicas relacionadas Ć adaptaĆ§Ć£o Ć s mudanƧas climĆ”ticas. āO municĆpio tem em algum grau revitalizaĆ§Ć£o de praƧas, de jardins, mas a contribuiĆ§Ć£o real em termos climĆ”ticos estĆ” muito atrelada a Ć”rvore, ou seja, precisamos aumentar as Ć”reas verdes em Juiz de Fora, principalmente em uma distribuiĆ§Ć£o mais igualitĆ”ria. NĆ³s temos grandes Ć”reas sem nenhum espaƧo verde e isso Ć© um prejuĆzo muito grande para toda populaĆ§Ć£o que mora naquele espaƧo.āĀ
A professora cita algumas alternativas que poderiam ser implantadas de forma mais imediata como o aumento da arborizaĆ§Ć£o viĆ”ria para diminuir o aquecimento dos asfaltos, a obrigatoriedade de grandes condomĆnios verticais terem Ć”reas verdes e permeĆ”veis – que permitem que a Ć”gua da chuva penetre no solo, mais praƧas. āNovos loteamentos sĆ£o implantados e nada Ć© feito ao mesmo tempo. A obrigatoriedade Ć© uma alternativa para causar mudanƧas a partir do que vem sendo construĆdo e, mais tarde, incorporando as demais construƧƵes antigas. A cidade precisa ter menos concreto e mais verde, se nĆ£o termos sempre uma cidade cada vez mais quenteā, afirma CĆ”ssia.Ā
Algumas cidades estĆ£o apostando em corredores ecolĆ³gicos e refĆŗgios climĆ”ticos como alternativa para oferecer alĆvio e assistĆŖncia Ć populaĆ§Ć£o durante ondas de calor, atravĆ©s de sistemas de resfriamento e abastecimento de Ć”gua potĆ”vel, por exemplo. CĆ”ssia diz que uma mudanƧa no sistema de circulaĆ§Ć£o urbana poderia ajudar a diminuir a poluiĆ§Ć£o e amenizar esse calor. āA GetĆŗlio e a Rio Branco sĆ£o muito quentes porque tem muitos Ć“nibus e carros transitando ali, as Ć”rvores sĆ£o poucas e as praƧas na regiĆ£o central sĆ£o cimentadas e impermeĆ”veis, tudo isso colabora para esse aquecimento.āĀ