Vinhos de inverno

Por Marcelo Sepulveda

Hoje vamos abrir espaço para conhecer uma técnica que vem transformando a vitivinicultura brasileira nas últimas duas décadas. Também conhecida como dupla poda ou poda invertida, esse sistema é fruto de pesquisas, avanços tecnológicos e adaptação da cultura. A técnica consiste na inversão do ciclo da videira e possibilita a “colheita de inverno”, ou seja, a produção das uvas que vão dar origem aos vinhos de inverno se concentra durante os meses mais secos e com maior amplitude térmica, noites amenas e dias ensolarados.

A técnica de dupla poda faz com que o ciclo da videira se altere, trazendo a maturação para o Inverno. Estrategicamente, uma poda é feita em meados de agosto e a outra em janeiro. Com a segunda poda, no início do ano, o ciclo recomeça e a planta floresce em abril e maio. As uvas são, portanto, colhidas entre o final de julho e início de agosto. Nesta época de colheita, os dias são bastante quentes e ensolarados (até 27º), as noites obviamente bem mais frias (cerca de 10º) e a amplitude térmica, que é a diferença do dia e da noite, chega a 15 e 17º, um cenário ideal para as uvas. Além disso, historicamente, não chove. A chuva é uma das grandes vilãs para a uva utilizada para a produção de vinhos finos.

Estas características ambientais vão proporcionar, portanto, uma bebida com perfil distinto entre os vinhos finos brasileiros, configurando qualidade e identidade ao produto. Essa técnica começou a ser testada, e depois aperfeiçoada, no início dos anos 2000 pelo professor e produtor Murilo de Albuquerque Regina. Então pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), Murillo havia acabado de retornar da França, onde concluiu o seu doutorado. Na ocasião, percebeu que as condições de produção de vinhos finos na Europa eram semelhantes às características do inverno no Sul de Minas Gerais, na região da Mantiqueira, onde o café era a principal referência agrícola.

Murillo foi, então, aprofundando os seus experimentos e observações, o que resultou num projeto bem-sucedido de produção de vinhos de inverno em larga escala, uma técnica adotada por várias vinícolas e que acabou sendo consolidando ano a ano, safra a safra. Os primeiros vinhos obtidos pela técnica chegaram ao mercado uma década depois. O retorno e o reconhecimento foram imediatos, com a adoção desses vinhos pela rede enogastronômica e com premiações nacionais e internacionais atestando a qualidade do produto. Hoje, a dupla poda não se resume ao Sul de Minas. Outras regiões do País, que possuem microclima similar, têm adotado a prática com excelentes resultados.

A uva tinta Syrah, originária do Vale do Rhône- França, se adaptou perfeitamente por aqui e vem se tornando a uva símbolo dos vinhos de Inverno. Nas últimas edições do Decanter World Wine Awards, a mais influente competição em escala global, o vinho de invernos vem ganhando vários prêmios, e só para destacar, na edição de 2023 que aconteceu em Londres, a vinícola Ferreira localizada no Sul de Minas recebeu a medalha de ouro em seu vinho Piquant Soléil, produzido 100% com a uva Syrah.

Aos amantes de vinho, trago uma excelente notícia, entre os dias 29 de agosto a 2 de setembro, nossa Juiz de Fora receberá um grande festival de vinhos. O JFwine Festival promete ser o maior evento de vinhos já visto em nossa cidade, e nele será possível conhecer de perto várias vinícolas que elaboram seus vinhos pela técnica da dupla poda. Vinícolas com vários prêmios internacionais, tais como: Maria Maria, Cave das Vertentes, Estrada Real, Góes, Casa Geraldo, Villa Santa Maria, Serra das Galés, Barbara Eliodora, Vinícola Bruxel, Luiz Porto, irão apresentar seus rotulo numa feira no Hotel Trade. Para participar basta adquirir um passaporte no valor de R$ 90 na plataforma sympla.com, e você além de ganhar uma taça, poderá provar até 6 doses desses vinhos incríveis.

E é celebrando o vinho nacional que me despeço de vocês. Durante essas onze edições me “atrevi” a compartilhar um pouco da minha paixão pelo vinho. Espero que de alguma forma minhas palavras possam ter despertado em você o desejo de conhecer mais sobre essa caminhada fascinante e milenar da cultura do Vinho!
Até breve…

 

Marcelo Sepulveda

Marcelo Sepulveda

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