
Tem gente que acorda e a primeira coisa que faz é olhar o celular. Seu corpo ainda nem começou a funcionar direito, e a pessoa já está focada nas notificações e urgências. Essa atitude é reflexo do tempo em que vivemos: uma época em que é preciso estar atento nas 24 horas do dia, com o propósito de sempre adiantar alguma coisa, sob a falsa promessa de que assim sobrará mais tempo.
Porém, esse tempo nunca resta, e a oportunidade de estarmos com alguém torna-se mais escassa. Às vezes, dizemos “vamos marcar”, mas essa hora nunca chega. Está todo mundo ocupado, e isso foi normalizado.
Nesse contexto, estar disponível parece ser um erro, uma falha. Mas estar disponível, na verdade, é um ato de generosidade. Dispor do próprio tempo, algo tão cobiçado hoje em dia, para estar na presença do outro é uma atitude de extremo valor.
Claro que, quando digo estar na presença do outro, estou me referindo a um momento de troca, de partilha, em que haja uma disposição para a escuta sincera, para o acolhimento, para o cuidado. Estar disponível é uma maneira de nos oferecermos como abrigo, como abraço, como aconchego. É um jeito de dizer: “pode contar comigo, mesmo que eu também esteja me desmoronando”.
É claro que há quem pense que estar sempre disponível é uma forma de servidão, de submissão, mas a verdadeira disponibilidade não está vinculada a um tipo de obrigação. Ela nasce, sim, da escolha. Escolher estar presente quando seria mais fácil não comparecer. Escolher dar ouvidos quando seria mais fácil fazer-se de surdo. Escolher enxergar quando seria mais fácil fingir que não viu. Escolher dizer quando seria mais fácil ficar calado. Escolher abraçar quando seria mais fácil se afastar. Generosidade é assim: dar e não contar com o retorno, sem esperar reciprocidade.
Se tudo é urgente, estar disponível é um gesto de subversão. Porque requer pausa, olhar detalhado, escuta atenciosa. Há uma necessidade de se importar, e se importar, nos dias de hoje, é joia rara. Ainda mais quando o que mais se vê são relações sem lastro e conversas superficiais.
Ser disponível não significa abrir mão de si. Existem muitas formas de estar, como oferecer um olhar atento, enviar uma mensagem na hora certa, um “lembrei de você”, um “estou aqui”. Por meio de pequenas atitudes, somos capazes de estar disponíveis.
No fim das contas, o tempo que damos ao outro é também o tempo que oferecemos a nós mesmos. Porque, toda vez que estendemos a mão a alguém, somos generosos conosco.