Rompendo amarras femininas

“Assumir a própria identidade, autêntica e feminina, diante de uma sociedade que sustenta narrativas opressoras, preconceituosas e altamente julgadoras, é muito difícil.”


Por Ferdí Mendes, Psicanalista especialista em identidade e estilo, psicoeducadora e fundadora da Escola Jiah

24/08/2023 às 07h00

Compreender os estereótipos e o verdadeiro espaço da mulher em uma sociedade que insiste em cercear sua existência é necessário, libertador e urgente.

Estes padrões acabam por impactar de maneira relevante na vida e no autoconhecimento da mulher, limitando e reduzindo suas possibilidades de ser, de estar e de escolher. Este cerceamento reflete de maneira factual no desenvolvimento pessoal, faz com que as identidades femininas que não cabem nas caixinhas padronizadas se sintam desencaixadas, perdidas, despreparadas, insuficientes e culpadas.

O caminho para o autoconhecimento de um indivíduo é um processo cheio de ruídos e inconstâncias (como diria Lulu Santos: “nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”), é árduo, muitas vezes dolorido, se constrói ao longo do tempo, somando experiências. Um processo pautado no pensamento lógico, na ciência e na absorção das narrativas, das histórias vividas, vistas e ouvidas, de maneira real ou ficcional.

Assumir a própria identidade, autêntica e feminina, diante de uma sociedade que sustenta narrativas opressoras, preconceituosas e altamente julgadoras, é muito difícil. Tem que aprender a não seguir o fluxo de uma sociedade que padroniza tudo – inclusive seres humanos, propósitos, roupas e escolhas -, que encaixota os demais em valores patriarcais, capitalistas, etnocêntricos, como juízes soberanos desqualificando talentos, limitando espaços, rechaçando diferenças e enaltecendo padrões estruturais.

Estereótipos são padrões que a sociedade constrói com base no inconsciente coletivo, atribuindo características específicas aos indivíduos a partir de construções sociais. Separa as pessoas e seus semelhantes em “caixinhas”, criando rótulos, ditando seus comportamentos e padronizando sua imagem de forma bastante limitadora e preconceituosa.

“Normal” é mulher falando suavemente sobre produtos de beleza, da vida da vizinha e dos homens. Mulher que se resolve com uma transformação visual, ou largando tudo para viver um grande amor. Que privilegia sua carreira em detrimento de sua vida pessoal e se arrepende, voltando para sua família perfeitamente imperfeita. “Mulheres-maravilha”, guerreiras que aguentam tudo – papel social inalcançável, que romantiza a sobrecarga feminina, normaliza expectativas insustentáveis e desestabiliza quem não consegue atingir o padrão.

Estes e outros estereótipos – e a necessidade de se encaixar neles – comprovadamente geram grandes danos à saúde mental. E é exatamente compreendendo a existência destes padrões que a mulher consegue se perceber para além de todos eles, criando forças para rompê-los e para assumir livremente, com orgulho e autenticidade, toda a sua potência feminina.

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