CPI dos Fura-Filas pede indiciamento de ex-secretário de Saúde de MG
Carlos Eduardo Amaral afirma que suas ações no comando da pasta foram “marcadas pelo mais estrito rigor legal”
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) criada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para apurar denúncias sobre irregularidades na vacinação de servidores da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) aprovou seu relatório final, em que sugere ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) a denúncia do ex-secretário de Estado de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, por suposta prática de peculato e improbidade administrativa. Dois ex-profissionais da pasta e uma servidora também foram citados. O indiciamento foi apontado pelo relator da CPI dos Fura-Filas, o deputado estadual Cássio Soares (PSD), em documento apresentado nesta quinta-feira (8). Com a aprovação, a recomendação será encaminhada ao MPMG.
Em resposta à Tribuna, o ex-secretário de Estado de Saúde, afirmou que “todas as ações da SES-MG, durante nossa gestão, foram marcadas pelo mais estrito rigor legal”. “Em relação à vacinação, seguimos a legislação e, em especial, o Programa Nacional de Imunizações. O relatório é atribuição e responsabilidade dos membros da CPI. Ele contém a visão política do processo. De nossa parte, reiteramos o que já dissemos: seguiu-se toda a legislação e o Programa Nacional de Imunizações”, pontuou Carlos Eduardo Amaral.
Gestão da saúde
O documento feito por Cássio Soares considera que a SES falhou como gestora do sistema estadual de saúde, “no que se refere à gestão dos sistemas públicos de alta complexidade, de referência estadual e regional”, principalmente, “tendo em vista que os leitos disponibilizados foram insuficientes para atender à demanda”. “Também deixou de administrar adequadamente os recursos orçamentários e financeiros destinados à saúde na medida em que, como vimos, não aplicou o percentual mínimo constitucional em Ações e Serviços Públicos de Saúde”, diz o relatório final da CPI dos Fura-Filas. A reportagem fez contato com a SES, questionando sobre os apontamentos feitos pelo relator, mas, até a edição deste texto, ainda não havia recebido uma resposta.
“Estamos encaminhando ao Ministério Público a sugestão da responsabilização de alguns servidores da Secretaria, em especial do núcleo de comando naquele momento. Também estamos fazendo algumas recomendações ao Governo do Estado para o cumprimento do mínimo constitucional em saúde e a observância destes recursos aplicados em melhoria na prestação de serviços à população mineira. Infelizmente, através de números e de informações, foi constatado, de forma inequívoca, que o Estado não aplicou quase R$ 1 bilhão em saúde no ano de 2020, o que certamente deixou os municípios e as entidades de saúde desassistidas em pleno ano de pandemia”, afirmou o deputado Cássio Soares.
Encaminhamento
Segundo a ALMG, a apresentação da denúncia por crime de peculato será feita em requerimento da CPI ao coordenador do Centro Operacional de Apoio às Promotorias de Justiça Criminal da Capital. “Segundo a CPI, a prática, em tese, do crime de peculato se deu por no mínimo três vezes. Já o requerimento que recomenda ação de improbidade administrativa também contra Carlos Eduardo Amaral e os outros três citados será encaminhado ao coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Minas Gerais (CAOPP)”.
Trabalhos tiveram quatro meses de duração
Chamada de CPI dos Fura-Filas, a comissão parlamentar de inquérito foi instaurada em março para, segundo a ALMG, “investigar a operacionalização da Campanha Nacional de Vacinação contra Covid-19, em especial o desvio de recursos referentes à vacinação irregular de grupos não prioritários definidos pelo Ministério da Saúde”. O colegiado também apurou ações no Estado, classificadas como de “baixo investimento em ampliação de leitos para enfrentamento da pandemia no Estado, concomitantemente à não aplicação do mínimo constitucional em serviços públicos de saúde”.
Os trabalhos foram instaurados para investigar informações de que cerca de 800 servidores administrativos da Secretaria de Estado de Saúde terem sido vacinados contra a Covid-19, apesar de estarem fora das prioridades definidas no Plano Nacional de Imunização. A CPI se estendeu por quatro meses e concluiu que há indícios de irregularidades no processo de vacinação de servidores.
Segundo a comissão, a vacinação dos servidores em questão foi feita mesmo “sem levar em conta a vinculação com o órgão, se eram servidores efetivos ou trabalhadores públicos contratados a título precário, a formação acadêmica, o risco sanitário a que estivessem submetidos e se esses servidores se enquadravam no conceito de trabalhadores de saúde, previsto no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO) para fins de vacinação prioritária”.
O relatório ressalta ainda que, em 19 de fevereiro, o próprio secretário, o adjunto e o chefe de gabinete receberam a primeira dose, mesmo sem se enquadrarem nos critérios de prioridade do PNO. A vacinação ocorreu na Central da Rede de Frio da SES, em Belo Horizonte, no dia em que ainda havia médicos e enfermeiros por vacinar. O ex-secretário de Estado de Saúde prestou depoimento à CPI no dia 20 de maio. Na ocasião, Amaral afirmou que ele próprio recebeu o imunizante como forma de exemplo para os funcionários da pasta que então comandava.
“O processo foi extremamente correto. Não tenho dúvidas de que isso será levado em consideração por esta CPI. Fizemos um processo exemplar. Não há vício ou nada diferente do que deveria ser feito. Não houve fura-fila”, disse, na ocasião, em entrevista à imprensa da capital, conforme publicação do jornal O Estado de Minas. “Para os servidores da Saúde, eu queria ser um bom exemplo. Gostaria que fosse interpretado dessa forma”, completou Amaral.
Para a CPI, Governo de Minas não aplicou o mínimo constitucional
Segundo o relatório, com relação aos investimentos do Estado em saúde, o Governo de Minas deixou de cumprir o mínimo constitucional no exercício de 2020, uma vez que o índice de 10,75% da receita que foi aplicado em Ações e Serviços Públicos de Saúde (Asps) está abaixo do patamar de 12% estabelecido pela legislação vigente. “O documenta ressalta que a maior parte (68,26%) da despesa realizada pelo Estado em 2020 e até 28 de maio deste ano para garantir leitos disponíveis para tratamento da Covid-19 foi custeada com recursos provenientes da União, ao passo que o esforço fiscal realizado com recursos do Tesouro Estadual foi proporcionalmente bem menor (23,41% sobre o total)”, diz material publicado pela ALMG.
Apesar de mencionar a expansão de leitos na rede de saúde do Estado durante a pandemia, o relatório ressalta que a capacidade instalada não foi suficiente para atender à demanda por internação na segunda onda da pandemia. O documento ainda classifica como preocupante o fato de que, da soma de todas as despesas empenhadas e não pagas entre os exercícios de 2009 e 2020, o Estado deva a seus credores, em 2021, mais de R$ 8 bilhões. Do montante, quase 85% dessa dívida é para com os municípios mineiros.
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