‘Esquecemos de pensar enquanto sociedade’, analisa infectologista sobre a pandemia em JF
Para médico Guilherme Côrtes, primeiro profissional da saúde na cidade a alertar sobre o risco do coronavírus, contexto epidemiológico é reflexo da falta de controle da transmissibilidade viral
Um ano após o início das primeiras medidas adotadas pela Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) para conter o avanço do coronavírus, a cidade vive o pior momento da pandemia, com recorde na hospitalização em decorrência de agravos causados pela Covid-19, e com altas taxas de ocupação de leitos intensivos e de enfermaria. Para o infectologista Guilherme Côrtes, o atual contexto epidemiológico é reflexo da falta de controle da transmissibilidade viral.
“A sociedade não focou no cerne do problema, que era a transmissão e a replicação viral. Todos os outros problemas que surgiram ao longo desse ano de pandemia foram decorrentes da existência do vírus e de sua transmissão. A gente deu importância a todos os desafios secundários à presença do vírus, sem conseguir focar no combate à transmissão viral. Isso eu entendo como tendo sido a principal falha da nossa sociedade”, avalia o médico, que foi o primeiro profissional da saúde na cidade a alertar sobre o risco do coronavírus em março de 2020.
“Enquanto sociedade, não conseguimos entender o bem comum que seria o controle da transmissão viral. Ficamos, ao longo desse ano, analisando interesses e questões individuais, os danos secundários da presença do vírus e esquecemos de pensar enquanto sociedade. Sendo assim, estamos vivendo, atualmente o pior cenário epidemiológico, e que ainda pode ser pior se continuarmos sem agir no controle da transmissão viral.”
‘Aumento de leitos e protocolos sanitários não são suficientes’
Apesar de o Município ter avançado em relação à implementação de novos leitos, a medida, na avaliação do especialista, é ineficaz para o combate à propagação do vírus. “Tivemos um avanço muito grande em relação à disponibilização dos leitos. Porém, o objetivo quando se abre mais leitos é, na verdade, ganhar tempo para agir na transmissão viral, e não achar que iríamos conseguir mudar a história da pandemia. Quando foram propostos todos esses protocolos sanitários, eles vieram também para mitigar a frequência de transmissão, mas nunca foi a ferramenta para controle da pandemia. Os protocolos e a abertura de leitos não são suficientes para conter o vírus. Ao longo desse ano a gente não agiu, de fato, para o controle da transmissão viral. Pelo contrário, a partir de maio começamos a progressivamente implementar flexibilizações”, lembra.
Controle
Para Côrtes, a mudança do quadro epidemiológico passaria pelo controle da transmissão viral de forma consistente, por pelo menos duas semanas, e pelo investimento em vigilância epidemiológica. “Isso significa aumentar a nossa capacidade de detectar e isolar os casos, detectar os contactantes e colocá-los em quarentena. Com isso iríamos quebrar a cadeia de transmissão. Sem nenhuma dessas ações, hoje existe o atual cenário, em que possivelmente temos uma nova variante do vírus circulando, que parece ser mais agressiva. Isso só está acontecendo nesta intensidade porque a gente não foi capaz em agir na transmissão viral. Se ao longo desse período observarmos as curvas de casos em Juiz de Fora, ela é sempre progressiva, e mesmo assim insistimos na flexibilização.”
Tópicos: coronavírus