O retorno do Midnight Oil e outros lançamentos musicais

Por Júlio Black

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Oi, gente.

A coluna desta semana era para ser das mais felizes, por dois motivos: a minissérie britânica “Years and years” havia acabado de errar uma de suas previsões para o futuro (bronzeamento laranja nunca mais), e o Midnight Oil lançou em 30 de outubro o miniálbum “The Makarrata Project”, primeiro trabalho de inéditas desde “Capricornia”, de 2002.
Porém, não há felicidade que dure para sempre, e recebemos no final de semana a notícia da morte de Bones Hillman, baixista do quinteto australiano, aos 62 anos, por causa de um câncer, depois de 33 anos de serviços bem prestados à maior banda de rock do maior país da Oceania.

Apesar do luto, é preciso escrever a respeito do miniálbum, em que a qualidade mais que compensa a (pouca) quantidade de canções. Com mais de 40 anos de estrada, os Oils são conhecidos por lançarem álbuns bem diferentes entre si, basta comparar “Red sails in the sunset” (1984) com “Redneck Wonderland” (1998) e “Diesel and Dust” (1987). É deste, aliás, que “The Marrakata Project” pode ser considerado uma continuação. Na época, a banda havia feito uma longa turnê pelo interior da Austrália, tocando para os povos nativos como os aborígenes, e o álbum tratava principalmente o drama dos primeiros habitantes da terra e a relação do branco “invasor” com os verdadeiros “donos” da Austrália.

“Diesel and dust” é um grande álbum, de uma banda conhecida pelo seu ativismo político, ambiental e a defesa dos povos indígenas de seu país, mas é um grande álbum de branquelos falando pelos aborígenes. Desta vez, entretanto, o novo trabalho conta com um grande número de convidados entre os artistas das “Primeiras Nações”, que dão voz justamente a esses povos _ incluindo uma contribuição póstuma e inédita do músico aborígene Geoffrey Gurrumul Yunupingu, morto em 2017. A ele se juntam nomes como Tasman Keith, Frank Yamma, Leah Flanagan e Kaleena Briggs, entre outros.

“The Makarrata” é um miniálbum sobre um povo que teve sua terra roubada e que até hoje se ressente disso, mas também é sobre a relação dos “invasores” com os povos aborígenes _ vale lembrar que “Makarrata” é uma palavra yolngu que poderíamos traduzir como “processo de resolução de conflitos, pacificação e justiça”. Musicalmente, é mais melodioso que pesado, ainda que as guitarras tradicionais da banda estejam por ali. As letras, claro, continuam críticas, mas em busca de uma solução para injustiças seculares.

Músicas como “First Nation”, “Gadigal Land”, “Terror Australia” e “Change the date” mostram que o Midnight Oil segue relevante na música e no discurso. A banda vai doar toda sua parte nas vendas e streaming para organizações ligadas ao The Uluru Statement From The Heart, movimento que busca incluir a “Voz das Primeiras Nações” na Constituição da Austrália. Mais um bom motivo para comprar o disco ou deixar eternamente no repeat de sua plataforma de streaming.

Enquanto o Midnight Oil retorna de um longo hiato, um de nossos heróis da guitarra lança outro grande álbum em sua prolífica carreira solo. Thurston Moore, do finado Sonic Youth, está na área com “By the fire”.

Seu sétimo trabalho forever alone tem muitas semelhanças sonoras com sua antiga banda, e isso é bom. Estão lá o noise, as distorções, influências do jazz, as longas viagens musicais e o experimentalismo em nove canções e 82 minutos de ótima música.

Acompanhado por nomes como o baterista Steve Shelley, que também integrou o Sonic Youth, Debbie Googe (My Bloody Valentine) e o guitarrista James Sedwards, Thurston Moore produziu pérolas sônicas do naipe de “Breath”, “Hashish”, “Siren” e “Venus”, com letras que tratam – sim, senhor, acredite – de amor, da natureza e outras coisas no estilo “paz e amor” – mas com muito noise, claro, que é como a gente gosta.

E ainda temos o novo e ambicioso álbum do Gorillaz, um dos projetos musicais e audiovisuais mais interessantes deste nosso novo milênio. O projeto virtual de Damon Albarn, do Blur, acabou de lançar o álbum “Song Machine, Season One: Strange Timez”, que dá continuidade à websérie lançada no início de 2020.

Como já é tradição no Gorillaz, o álbum é marcado por uma salada mista de estilos musicais que nunca dão enjoo no ouvinte: tem indie rock, hip-hop, synth-pop, R&B, electropop e convidados de todas as origens, como Robert Smith (The Cure), Joan as Police Woamn, Beck, Peter Hook (ex-New Order), ScHoolboy Q, Elton John, St. Vincent, Octavian e Unknown Mortal Orchestra, entre outros.

O resultado? Ótimas canções, entre elas “The Pink Phantom”, “Severed Heart”, “Aries”, “Strange Timez”, “Chalk Tablet Towers”, “Momentary bliss” e “The Valley of the Pagans”.

Quando foi criado, em 1998, por Damon Albarn e pelo ilustrador/designer/diretor/etc Jamie Hewlett, o Gorillaz surgiu como a antecipação do que seria a música do século XXI, ao unir música e audiovisual com o conceito de banda virtual, tendo à frente os personagens animados Stuart “2-D” Pot, Noodle, Russel Hobbs e Murdoc Niccals _ que chegou a ser substituído em 2018 pelo personagem Ace, da animação “As Meninas Superpoderosas”, durante o período em que “esteve preso”. Mais de duas décadas depois, o conceito continua original e sempre dando um jeito de ficar à frente de seu tempo.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

Júlio Black

Júlio Black

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