A pandemia do novo coronavírus e a necessidade de mitigar os seus efeitos continuam afetando a situação fiscal do Brasil. As contas públicas permanecem fortemente condicionadas pela calamidade sanitária, ao passo que as receitas diminuem por conta da retração da atividade econômica e das desonerações do pagamento de tributos. De forma simultânea, as despesas sobem muito para tentar contornar os efeitos sobre a renda da parcela da população mais vulnerável, além dos gastos com o sistema de saúde e os destinados a pequenas empresas.
O déficit primário do governo central projetado para o ano de 2020 pelo Relatório de Acompanhamento Fiscal de junho deste ano da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal passou para R$ 877,8 bilhões. A projeção é impulsionada pelo aumento dos créditos extraordinários editados para financiar as medidas de combate à pandemia, no total bruto de R$ 487,3 bilhões.
Desse total de R$ 877,8 bilhões do déficit primário, a IFI projeta que o impacto fiscal das medidas de mitigação sobre os efeitos do coronavírus poderá chegar a R$ 601,3 bilhões. A maior parte desse valor estará concentrada nos gastos para ajuda aos trabalhadores: R$ 338,8 bilhões, sendo que só o auxílio emergencial responderá por R$ 308,8 bilhões. Algumas decisões a serem tomadas pelo governo central, como a prorrogação do auxílio emergencial por mais alguns meses, e as desonerações relacionados aos pagamentos dos tributos para os próximos anos podem aumentar ainda mais esses números.
A IFI ainda projeta que a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) deve encerrar 2020 em 96,1% do PIB, algo em torno de R$ 6,5 trilhões, sendo este valor superior à projeção anterior (do mês de maio) em 9,5 pontos percentuais. O aumento da relação dívida/PIB pode ser explicado pela piora das estimativas para o déficit primário do setor público consolidado combinada com a própria deterioração do PIB. Para os próximos dez anos, a dívida poderá crescer até 117,6% do PIB, atingindo 100% já em 2022.
As projeções econômicas e fiscais, portanto, indicam que será muito importante retomar a agenda da sustentabilidade fiscal e do ajuste das contas públicas a partir de 2021. Caso isso não ocorra, a frágil recuperação esperada para o ano que vem poderá ser prejudicada pela necessidade de conter o aumento da percepção de risco e da alta do dólar. A resposta acabaria gerando a alta dos juros, causando prejuízos à dinâmica da dívida pública, que estará cerca de 20 pontos percentuais do PIB acima do nível de 2019, além de mais curta e indexada à Selic. O rombo das contas públicas será gigantesco. O ônus da pandemia é altíssimo e, quando tudo passar, ainda teremos essa conta para pagar.
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