Diretor de Ações Afirmativas da UFJF fala sobre denúncias de fraudes nas cotas
Julvan Moreira de Oliveira explicou como é feita a apuração de queixas oficializadas na instituição
Depois que perfis no Twitter e no Instagram divulgaram listas com os nomes e fotos de estudantes que supostamente teriam fraudado o sistema de cotas, o titular da Diretoria de Ações Afirmativas (Diaaf) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Julvan Moreira de Oliveira, falou sobre o assunto em um vídeo, lançado no canal “Na Hora do Lanche (em casa)” da UFJF, no Instagram, nessa sexta-feira. A live tinha como objetivo não só elucidar as questões relativas às queixas, mas também discutir o racismo estrutural em um contexto mais amplo, contando com entrevistas com a historiadora Giovana Castro, com a mestranda em Letras e membro do coletivo AfroFlor, Andressa Maria da Silva, e o estudante de Jornalismo e influencer digital, Maycon Nutella.
Julvan reforçou o conteúdo da nota publicada pela UFJF na quarta-feira (3), afirmando que todas as denúncias que são registradas na instituição pela Ouvidoria Especializada em Ações Afirmativas, pela Ouvidoria Geral e até mesmo pela Pró-Reitoria de Graduação são apuradas.
Ele relembrou que as primeiras denúncias foram recebidas pela Universidade em fevereiro de 2018, quando 96 alunos foram denunciados como possíveis autores de fraudes em cotas destinadas a pretos, pardos e indígenas. “Naquela ocasião, o reitor criou, por meio de uma portaria, uma comissão de sindicância que ouviu todos os 96 estudantes e mais três testemunhas, indicadas por cada estudante. Naquele momento, foi verificado que 17 deles tinham fraudado. Foi aberto processo administrativo, que chegou ao Conselho Superior, que decidiu desligar aqueles estudantes.” Ele enfatizou que, em alguns casos, os alunos suspeitos não esperaram o final do processo e se desligaram antes. Outros entraram na Justiça.
Em 2019, para evitar que novos casos pudessem ocorrer, segundo Julvan, foi criada a banca de heteroidentificação, que no ato da matrícula verifica as autodeclarações. “Quando é indeferido, o estudante tem o direito de recorrer. O seu recurso é analisado por uma comissão específica de heteroidentificação, que é formada por cinco membros.” Ele ainda acrescentou que esse grupo de avaliação tem respaldo na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186 do Supremo Tribunal Federal, que considerou as cotas constitucionais.
Os casos anteriores à composição da banca podem ser denunciados pelos meios citados pelo professor. “É o que legalmente deve ser feito, para que a pessoa tenha direito de defesa. No fim, a UFJF encaminha se desliga ou não o estudante que fraudou.” Julvan explicou que a autodeclaração, que também é alvo de críticas, não é uma posição do Governo brasileiro. Ela foi definida em conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), da qual o Brasil faz parte, em 2001, em Durban, na África do Sul. “Ela discutiu diversidade, tolerância. Os países que participaram tomaram a posição de que a identidade étnica, ou identidade racial, é uma autodeclaração. A pessoa não pode falsificar, assim como acontece com outros documentos, como um RG. Não pode mentir sobre isso.”
O diretor pontuou ainda que o que pode estar causando tantos apontamentos de possíveis fraudes, que não passaram por denúncias formais, é o fato de que a Universidade não publiciza o resultado das ações, para não expor os fraudadores. O resultado do processo é mostrado para a pessoa que entra com a denúncia, mas os nomes não são divulgados nas mídias.
Critérios internos
Sobre o processo de investigação dos casos, Julvan ainda explicou que os critérios foram construídos coletivamente por pesquisadores e são constituídos por meio de pesquisas nas áreas de Antropologia e Direito, justamente, para que não ocorram injustiças. Outro questionamento respondido por Julvan no programa diz respeito à representação de estudantes no processo. Ele afirmou que além dos pesquisadores e dos Técnicos Administrativos em Educação (TAEs), as bancas são formadas por alunos dos cursos de Pós-Graduação da UFJF. Todos, segundo o titular da Diaaf, recebem capacitação antes de atuar nas comissões.
“Todas as denúncias são encaminhadas. Como pesquisador, estive desde 1983 junto com o Movimento Negro. Participei das discussões nacionais. Eu, Julvan, tenho responsabilidade com isso. Desde 1983, quando o Movimento Negro veio brigando pela instalação das cotas no Brasil, eu participei. Tem mão minha nesse projeto de lei. Eu sou um dos mais interessados em que não tenha fraude. Isso é fruto da luta do Movimento Negro. Para mim, a política de ações afirmativas é uma forma de inserção da nossa comunidade negra e da população cada vez maior na sociedade brasileira. Não podemos criar mecanismos que não sejam legais”, defendeu.