Beleza do voo das garças surpreende no Museu Mariano Procópio
Presença das aves no local, no entanto, tem impactado na coloração da água do lago e é indicador de desmatamento no entorno
É preciso olhar com um pouco mais de atenção para notar a presença das garças no Museu Mariano Procópio (Mapro). Todos os dias, dezenas de exemplares da ave chegam, aos poucos, para ocupar o bambuzal da ilha central do lago artificial do Parque do Museu. Os pássaros esguios chegam sempre acompanhados, lançando voos em sincronia afinada, como uma grande companhia de balé aéreo. Ao mesmo tempo, a fixação dessas aves no local também indica que as áreas verdes do entorno diminuem. Além disso, os excrementos lançados pelas garças no lago também são um dos componentes que ajudam a propagar as algas que deixam o lago do parque com uma coloração esverdeada, detalhe que não passa despercebido pelos juiz-foranos.
A quantidade de aves e toda a coordenação do voo formam um show que chama a atenção de quem passa pelo Parque do Museu. Elas começam a chegar, timidamente, entre 17h30 e 18h, no horário de fechamento do espaço para o público. Em poucos minutos, preenchem de branco o horizonte esverdeado. Além dos graciosos movimentos das asas, o alto gazear completa o espetáculo. Elas formam linhas circulando o topo das árvores e, de repente, se escondem entre as folhas verdes, formando um contraste que impressiona. As aves vão, aos poucos, tomando o espaço, onde ficam até o dia seguinte, quando partem, em outra revoada, para passarem o dia em outros pontos da cidade.
Quebra de rotina
Na Rua Mariano Procópio, onde fica a entrada do Museu, quem passa de carro ou à pé se surpreende com a plasticidade do evento. A surpresa provocada pelas aves emociona as pessoas que têm a oportunidade de experimentar a visão da revoada. Em visita ao parque, Mariana Godinho, do lar, mostrava ao filho Téo, de 5 anos, a chegada das garças. “É a primeira vez que vemos, mas elas parecem estar muito acostumadas, tanto que não se incomodam com a presença das pessoas. É uma imagem linda de se ver, lembra até as cidades do interior. Ver essas aves em um espaço que permite o contato com a natureza é muito legal.” De acordo com Mariana, é uma oportunidade de apresentar às crianças uma vivência fora das estruturas de concreto. “Meu filho ficou maravilhado com as garças e até com os patinhos. Ele achou tudo lindo, veio apontando cada detalhe do parque.” Natural de Cataguases e morando em Juiz de Fora há dois anos, ela elogia a presença do verde no Museu.
Se exercitando pelo parque nos horários que a rotina permite, o militar Sérgio Nardes foi surpreendido pelo balé das aves pela primeira vez ao final de sua corrida, há duas semanas. “Era uma revoada muito grande, tinha muitos pássaros juntos. Nunca tinha percebido até então, embora eu more perto e sempre passe de carro aqui em frente. Mas, de fato, é algo realmente bonito para se admirar. Elas pousam, voam juntas, descem, o movimento é muito bonito de acompanhar.” Sérgio é natural do Rio Grande do Sul e está em Juiz de Fora desde 2008.
Trabalhando no parque como vigia há quatro anos, Ivan Rodrigues de Oliveira ainda se encanta com o espetáculo das aves. “Parece que elas gostam de ser vistas, porque sempre se posicionam do lado do bambuzal que dá para ver da rua. Quem geralmente aproveita mais essa paisagem são os moradores do entorno, que sempre assistem a chegada delas das janelas. Tem dias que há tantas garças que fica tudo branquinho.”
Mudanças no ambiente
Antônio Carlos Duarte relata que, há cerca de 20 anos, quando foi diretor do Mapro pela primeira vez, o bambuzal era habitado por macacos. Quando eles foram retirados, começaram a aparecer as garças. “Agora, elas pousam não só no bambuzal, mas também nas várias árvores menores do entorno. De pelo menos dez anos para cá, percebemos um grande aumento da presença delas.” De acordo com ele, o momento da chegada das aves, por mais bonito e emocionante que seja, ainda não é tão visto ou procurado pela população.
“Agora elas fazem parte do contexto do Museu. Toda a chácara de Mariano foi construída na época do Romantismo, então, elas casam com a arquitetura das pontes, grutas, chafarizes, pergolados, que possuem características desse momento histórico, compondo o ambiente com outros elementos, como o paisagismo, e as outras espécies, como os cisnes, os marrequinhos e as saracuras”, diz o diretor.
Riscos
Além da beleza das aves, entretanto, há outros fatores que precisam ser pensados. De acordo com Marcela Miranda, bióloga e pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de São José dos Campos (SP), a permanência das garças no parque do Mapro é um indicador de que ocorre desmatamento no entorno. A diminuição de áreas verdes seria, então, uma das explicações para a fixação dos animais no local.
Outra situação que gera alerta é que as garças passam cerca de 12 horas do dia no espaço. As condições são perfeitas para elas, que, conforme Marcela, gostam de pernoitar em áreas que têm água por perto. “Se olharmos em imagens de satélite, o Museu representa uma área verde em meio a um ambiente urbano e tem a fonte de água. Como as aves fazem suas necessidades biológicas nas margens do lago, os dejetos são fontes de nutrientes para as algas.”
Para combater o problema há alguns caminhos, segundo Marcela. Um deles poderia ser ensinar as aves, por meio de um sistema sonoro, a irem para outros lugares. Também seria possível instalar uma rede para impedir que elas acessem o bambuzal, já que ele não pode ser retirado, por ser um patrimônio histórico. Outras medidas poderiam incluir fazer a água circular pelo lago, evitando que ela fique muito tempo parada. “Essas seriam algumas das medidas que o Museu precisaria tomar para resolver o problema”, reforça a bióloga. O maior risco que as garças representam, no entanto, seria a possibilidade de proliferação das algas para outras fontes de água da cidade, por meio de suas asas, bicos, patas e penas.
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