A LGBTTIfobia e seus efeitos
PUBLIEDITORIAL
Coluna de Respeito

LGBTTIfobia é um conceito amplamente difundido nos dias de hoje. Durante muito tempo era um termo que circulava entre os membros da comunidade LGBTTI, mas que ao longo dos anos, em função da sua gravidade e dimensão, foi sendo difundido no senso comum como um conceito importante para entendermos as relações da sociedade na construção dos sujeitos LGBTTIs ou não. Um conceito só pode ser entendido no conjunto de outros que ele aciona. Com a LGBTTIfobia não é diferente. Minimamente ele aciona o conceito de homofobia, do qual ele é originário, mas também outros como heterossexismo, heterossexualidade compulsória e heteronormatividade. LGBTTIfobia é uma ampliação do conceito inicial _ homofobia _ que passou a ser entendido como qualquer atitude ou comportamento de agressão, repulsa, medo ou preconceito contra as homossexualidades. Um conceito importante para caracterizar nossa sociedade como violenta, discriminatória e preconceituosa com as homossexualidades.
Mas o movimento LGBTT, na sua organização política e ação de construção de imagens mais positivas da comunidade LGBTT, reivindicou a ampliação dessa forma de lidar com as homossexualidades, entendendo que a homofobia não dava conta da variação de agressão e violência que atinge as pessoas LGBTT. Um exemplo disso é que as mulheres lésbicas sofrem mais violência e agressão no âmbito privado e advindas de conhecidos, enquanto os homens gays são mais atacados em espaços públicos por desconhecidos. Com isso não queremos dizer que a prevalência de ataques nesses espaços para gays e lésbicas não eliminam as violências e agressões nos outros contextos sociais. LGBTTI sofrem, cotidianamente, violência e agressão nos mais variados espaços sociais em que circulam, como escolas, igrejas, bares, shoppings, ruas, lares, etc.
Os números da violência são assustadores, o que demonstra que essa não é uma questão somente para a comunidade LGBTTI, mas diz de um problema de todos nós, visto que atinge a todos. Atinge a todos por que lutar contra a LGBTTIfobia é lutar contra o sexismo e o machismo que são características do homem brasileiro. Não por acaso que os estados brasileiros que mais matam LGBTTI são os estados brasileiros que mais matam mulheres. Há anos o Grupo Gay da Bahia (GGB) vem realizando investigações e pesquisa que apontam o aumento dos assassinatos, das agressões e dos suicídios da comunidade LGBTTI. Segundo GGB, a cada 20 horas, um(a) LGBTTI morre no Brasil por conta da LGBTTIfobia. O grupo também registrou um aumento de 30% nas mortes em 2017, quando 445 pessoas foram mortas, em relação a 2016, ano em que 343 mortes foram motivadas por LGBTTIfobia. Já em 2018 esse número caiu, mas ainda se manteve alto, com 420 mortes. Todo esse contexto me faz argumentar que a LGBTTIfobia destrói a sociedade e tem efeitos que ultrapassam a comunidade LGBTTI.
Primeiro porque a LGBTTIfobia diz da nossa sociedade de enquadramento. O primeiro enquadramento que estamos sujeitos diz do gênero. Antes mesmo de uma criança nascer queremos saber o gênero, de maneira que enquadramos esse corpo que sequer nasceu em um ou outro gênero, constituindo nossa sociedade como caracterizada no binarismo de gênero. Mas o fato de saber que o feto será do sexo masculino ou feminino não é suficiente, fazemos um investimento social para que, de fato, se tornem homens ou mulheres depois de nascerem, contanto com a organização, divisão e enquadramento por gênero que nossa sociedade nos disponibiliza, como brinquedos para homens ou para mulheres, roupas e acessórios para um ou outro gênero. Mas ser homem ou mulher no Brasil não diz somente de uma questão de enquadramento no gênero, mas na sua relação com a heterossexualidade compulsória, ou seja, para ser considerado homem ou mulher “de verdade”, há um certo embaralhamento com a sexualidade, ou melhor, com a heterossexualidade. A homossexualidade se constitui, assim, em relação com a construção da heterossexualidade compulsória, como se toda menina ou menino fossem heterossexual “por natureza”. A homossexualidade vai se constituindo como uma ameaça a heterossexualidade, como se fosse um terceiro gênero.
Neste sentido, a LGBTTIfobia também limita as possibilidades de sermos homens e mulheres de variadas formas. Acabamos lidando com um tipo de ser e estar homens e mulheres tido como “normal”, como se essas formas de ser e estar no mundo fossem “naturais”. Na verdade, ser homem e mulher são construções sociais e culturais, investimentos que vamos fazendo nas crianças desde muito cedo. Assim, vamos afastando os meninos das brincadeiras e brinquedos tipos como “de meninas” e vice-versa. Vamos aceitando somente alguns tipos de homens e mulheres como possíveis.
Temos dificuldades de aceitar homens mais frágeis e sensíveis como mulheres mais agressivas e brutas. Combater a LGBTTIfobia é, para nós, uma possibilidade de ampliar as formas de ser e estar no mundo, de compartilhamento e sociabilidade na diversidade que nos constitui e que deveria representar nossa riqueza e não nosso problema.
Data: 17 de agosto
Local: Terrazzo · Juiz de Fora
www.facebook.com/missbrasilgayoficial/