Lendas vivas do Tu-Tu relembam antigos clássicos
Adversários em 1970, o zagueiro Murilo, do Tupi, e o centroavante David Chaves, do Baeta, lembram os antigos clássicos Tu-Tu
De preto e branco, Lumumba; Santana, Murilo, Jair e Danilo; Jaílton e Oberdan (Osvaldo); Hércules, Adair, Cristóvão (Edinho II) e Ninha. Francinha era o técnico. Do lado vermelho, Batista; Moreco, Índio, Vilmar e Enéas; Divino e Miguel; Beto, Luiz Augusto (Roberto), Nilo (David) e Pio, time comandado por Joaquim Fonseca. Estas foram as escalações do histórico Tu-Tu de 19 de abril de 1970, o último clássico entre os dois times na primeira divisão do Campeonato Mineiro. Entre as lendas de Carijó e Leão, dois ex-jogadores que colecionam histórias de rivalidade municipal e arquibancadas lotadas nas décadas de 1950 a 1970.
O zagueiro Murilo, 75 anos, certamente está na seleção de todos os tempos do Tupi. O mesmo vale para o centroavante David Chaves, o Tremendão, 77, pelo Baeta. A dupla, que esteve presente em capítulos vitoriosos das duas equipes, recordou as passagens pelas agremiações e garantiu que irá ao estádio nesta quarta com a esperança de reviver o clima que vidrava torcedores de Tupi, Tupynambás e Sport há décadas.
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“O clima era de competição, mas sem brigas, confusões. O Tu-Tu era visto por 5, 10 mil pessoas nos campos da cidade. Acredito em 7 mil torcedores nesta quarta pela história do clássico. As famílias vão sentir aquela emoção da época. Tinha o slogan que o Baeta perde, mas é bronca. E participei de um Tu-Tu que ficou na história que enfrentamos o Tupi do Fantasma do Mineirão, que encarou a Seleção Brasileira em 1966. E depois tinha uma final de campeonato regional aqui no Tupynambás. Não cabia ninguém no Estádio Eucalipto, como era chamado. E qual foi o resultado? Dois a zero para o Tupynambás. Era uma competição muito sadia, e ganhar do Tupi com aquela fama foi muito importante”, lembra Tremendão.
“Fora do esquema”
Entre as centenas de histórias, uma mudou a vida do então jovem Murilo, em 1960, antes torcedor do Baeta. “Para o clássico vou torcer para o Tupi. Tenho um carinho pelo Tupynambás, minha família era quase toda torcedora do Baeta, meu pai apaixonado pelo clube, mas saí fora do esquema! Na verdade era para eu ter ido para o Tupynambás, mas na semana que fui fazer teste não tinha avaliações. E tinha um senhor que era agente da Estrada de Ferro Leopoldina que me viu batendo pelada no campo de Leopoldina. Aí me deu dinheiro para ir para Santa Terezinha, no Tupi. Mas eu não sabia onde era. Então ele me dava dinheiro e eu gastava! Um dia fui levar almoço pro meu pai e este senhor estava lá. Sabe como são alguns mais antigos, meu pai tinha uma mão grandona…! Fui no dia seguinte para Santa Terezinha e em dez minutos de teste já fiquei no clube. E permaneci por uma vida. Saí no fim para o Paraná, interior de São Paulo, mas voltei para Juiz de Fora”, conta o ex-beque, morador do bairro Bonfim, Zona Leste da cidade, hoje com 75 anos, que defendeu o Galo entre 1960 e 1971.
Murilo chegou a defender o Baeta uma única vez, diante de um adversário também histórico. “Foi em um amistoso contra o Botafogo. Não me lembro se foi em 1967 ou 1968. Fizeram um combinado com o Tupi, mas quem atuou contra o Botafogo foi o Tupynambás. Perdemos de 3 a 2 para um time com Gerson, Leônidas… só gente boa.”
Amor pela camisa
Na época de Murilo e David, o verdadeiro amor pelo manto defendido prevalecia. “Minha caminhada foi maravilhosa. Trabalhei por quase 17 anos no Tupynambás. Os próprios jogadores do clube fizeram um campeonato, e cada um tinha um time. Fui escolhido para defender o time do Délio. Minhas chuteiras com defeito, mas nesse campeonato eu surgi no Tupynambás. Gostaram de mim, me trataram com mordomia e assim comecei. Só não fiquei milionário porque naquela época não tinha esse dinheiro no futebol. Jogava mais por amor. O Palmeiras, Botafogo e Cruzeiro tentaram me levar, mas meu amor me prendia aqui. Não tinha vontade de sair”, conta o ex-atacante.
O sentimento, para eles, anos depois do adeus aos gramados, ainda é inenarrável. “Não sei como explicar essa ligação com o Tupi. Isso diante da família que eu tinha… porque até eu era Tupynambás! Morava mais próximo do Baeta, fui ao Tupi sem saber onde era”, relata Murilo.
A emoção no sorriso de David reflete o espírito de um evento como o desta quarta. “Tem pais de amigos meus que choram quando me veem até hoje. Parece que sou um Deus, o ídolo deles, e passar por isso é muito bonito. Eles choram de alegria. Para ver o que o Tupynambás fez com a minha vida. Sou agraciado, tenho uma esposa maravilhosa, filhos, neto. Essas coisas te engrandecem. Fiz por onde. São todos Tupynambás”, relata, ao pedir um espaço para destinar um abraço ao amigo e ex-jogador, Mauro Lima.
Provocações, palpites e torcida em comum
Nas ruas, desde o acesso do Baeta, Murilo conta ser alvo de brincadeiras de amigos. “Levo muitas amizades dos meus tempos de Tupi. Passo na rua e sempre sou reconhecido, muita gente me procura até hoje. As pessoas falam que o manto vermelho voltou… eu fico quieto! Dizem que o Tupi não vai aguentar e eu deixo brincarem, não levo a sério. Até quando jogava tinha muitos amigos lá, brigávamos em campo e saíamos depois, naquela mesma noite, juntos”, conta o zagueiro que acredita, apesar do coração carijó, em um empate sem gols ou com um tento para cada lado.
A confiança no Leão é maior por parte do Tremendão. “Sou muito cauteloso porque é início de campeonato, e sabemos das dificuldades dos dois times. Mas acredito em 1 a 0 para o Tupynambás. É um placar perigoso, mas acho que vão sair vencedores nesta noite. E meus familiares todos vão. Filho, nora, só meus pais que não estão mais aqui, mas que eram Baeta doentes, que não vão poder ir. Mas deve sair até ônibus do nosso bairro (Furtado de Menezes) para ver a partida.”
Unânime é a torcida para que o clássico alavanque o esporte de Juiz de Fora. “Torço para reviver minha época. Acredito que o clássico pode trazer um pouco disso. Queria que este jogo inflamasse novamente o futebol de Juiz de Fora. Os times não têm muito trabalho de base, os jovens vão para fora com 10 anos, não vemos mais pessoas que realmente vestem a camisa do clube. Antes éramos criados nos clubes, dávamos tudo por eles. Agora tudo mudou”, analisa Murilo.
Tópicos: campeonato mineiro / tupi / tupynambás