Grafiteiros de JF promovem campanha para tratamento de menina
Setor 276 grafitou muro da Itamar Franco para pedir doações para criança que sofre com Atrofia Muscular Espinhal
Quem passa pela Avenida Itamar Fraco, próximo à Rua Antônio Passarela, no Bairro São Mateus, Zona Sul de Juiz de Fora, se depara com um muro grafitado. Estampado na parede, um ato de solidariedade: três artistas do coletivo Setor 276 se reuniram para grafitar o painel, que tem o desenho de uma menininha, um elefante de pelúcia e um acróstico com o nome de uma doença, a Atrofia Muscular Espinhal (AME).
A menininha retratada trata-se de Ayla, de um ano recém-completado. Ela trava uma precoce luta contra a AME tipo 1, que causa a perda do controle sobre os músculos. Os artistas do Setor 276 souberam, através de vídeos que circularam pelas redes sociais, que Ayla necessitava tomar diversas doses de um remédio, o Spinraza, que custa R$ 372 mil (por dose).
Sensibilizados com a situação da menina e de sua família, eles resolveram ajudar da forma que podiam. “Podemos ajudar com a nossa essência, com o que a gente sabe fazer, para ajudar a divulgar, já que somos conhecidos pelo que fazemos pela cidade, e a gente quis divulgar através da arte”, contou Matheus Oliveira, conhecido como Kobe, um dos seis integrantes do Setor 276.
Matheus conta que o coletivo recebeu muitos elogios por utilizar o grafite para ajudar na campanha. Segundo ele, na hora em que faziam os desenhos, muita gente parou e os abordou para saber do que se tratava. Os artistas não conheciam a doença até fazerem a pesquisa para tentar ajudar a menina.
A mãe de Ayla, Franciele Verli, disse à Tribuna que só ficou sabendo do ato de solidariedade quando o painel já estava pronto. Ela diz que só tem a agradecer a atitude de pessoas que ela sequer conhece, que se dispuseram a ajudar, mesmo morando tão longe de Curitiba, no Paraná, onde ela e Ayla residem. “É uma atitude muito linda a deles, que eu só tenho a agradecer, porque a Ayla tocou o coração de muitas pessoas. Ela tem vontade de viver. O vídeo que eu gravei se espalhou, até para fora do país, pedindo ajuda, porque o medicamento é muito caro e eu não tenho como pagar. Por conta do povo de fora do país e de outras cidades, que se uniu, conseguimos o valor para o primeiro ano.”
A campanha já conseguiu arrecadar o valor de seis doses, que a menina precisará tomar no primeiro ano de tratamento. A primeira dose foi aplicada nesta terça-feira (4). Após este primeiro ano de tratamento, Ayla precisará tomar três doses todos os anos, durante toda a vida, o que significa um gasto de mais de R$ 1 milhão por ano, apenas com o medicamento. Franciele conta que está tentando fazer com que o Governo federal pague pelo medicamento. A primeira liminar foi negada, mas foi para a segunda instância após recurso. Ela disse que continuará tentando, já que “não tem como as pessoas ficarem mantendo (as doações) a vida inteira”.
Apesar de terem arrecadado o valor suficiente para manter o tratamento durante o primeiro ano, a campanha continua, já que os gastos com a menina são altos. Franciele contou que tem despesas com fonoaudiólogos e que Ayla precisa de equipamentos específicos, como uma cadeirinha especial. Para doar, os interessados podem acessar a página dedicada à campanha AME Ayla no Facebook ou no Instagram, onde encontrarão mais informações, como número de contas de bancos para realizarem os depósitos.
A descoberta da AME
Franciele contou que teve uma gestação normal, e que Ayla nasceu sem apresentar nenhum problema aparente, e que inclusive se mexia e virava na cama. No entanto, quando a menina completou quatro meses, ela notou que a criança estava “mole”. Franciele procurou diversos médicos, que não detectaram um problema de saúde. Apenas quando procurou um hospital especializado em doenças raras é que a AME foi diagnosticada, quando Ayla já tinha nove meses.
Todo o processo de iniciar a campanha para arrecadar o valor necessário foi muito rápido, já que quanto antes Ayla recebesse as primeiras doses do remédio, menor seriam as chances de haver sequelas. Apesar de os médicos dizerem que a menina não poderá andar, devido ao fato de ser AME tipo 1, na qual a criança consegue apenas sentar e mover o tronco, a mãe tem esperanças de que mais esta barreira será vencida. “Eu tenho fé e esperança, Deus é maior e ela vai conseguir andar. Ela é uma AME forte, ela mexe as mãozinhas e os pezinhos, já começou a falar algumas palavras… os próprios médicos ficam bobos de ver as coisas que ela faz, mesmo sendo AME tipo 1”.
O que é AME?
Segundo a Associação dos Amigos da AME, as Atrofias Musculares Espinhais têm origem genética e caracterizam-se pela atrofia muscular secundária à degeneração de neurônios motores localizados no corno anterior da medula espinhal. A AME, a segunda maior desordem autossômica recessiva fatal, depois da fibrose cística, afeta aproximadamente 1 em 10.000 nascimentos , com uma frequência de doentes de 1 em 50 portadores. Casais que tiveram uma criança afetada têm 25% de risco de recorrência em cada gravidez subsequente.
O grupo 1 (doença de Werdnig-Hoffmann) pode se manifestar desde a fase intra-útero até os três meses de vida extra-uterina. Durante a gravidez verifica-se pouca movimentação fetal, e o recém-nascido apresenta fraqueza acentuada das musculaturas proximal e intercostal. Tem dificuldades de sucção, de deglutição e respiratórias. As infecções respiratórias se repetem, sendo a causa do óbito na maioria dos casos.
Nos grupos 2 e 3, os sintomas se manifestam entre três e 15 meses e de 2 anos à vida adulta, respectivamente. O quadro clínico caracteriza-se por deterioração motora após um período de desenvolvimento aparentemente normal. Na forma tipo 2, ou forma intermediária, a criança adquire a habilidade de sentar, mas tem uma parada do desenvolvimento motor a partir deste marco. A forma tipo 3, ou forma juvenil, ou ainda doença de Wolfhart-Kugelberg-Welander, começa normalmente a dar os primeiros sinais de fraqueza depois de 1 ano de idade ou até mais tarde. De maneira lenta a fraqueza nas pernas faz com que as crianças caiam mais, tenham dificuldade para correr, subir escadas e levantar do chão. Também aparece fraqueza nos ombros, braços e pescoço.
Às vezes, a doença é confundida com distrofia muscular. A fraqueza aumenta com o passar dos anos e a cadeira de rodas se torna necessária em algum momento na vida adulta. Os sinais da doença são menos proeminentes, e a progressão, mais lenta, na AME tipo 3, sendo que deformidades ósteo-articulares, principalmente escoliose, aparecem à medida que o curso se prolonga. Há outras formas, variantes da AME, sem um padrão perfeitamente definido de herança, de comportamento clínico heterogêneo eventualmente associado a outras manifestações.
Todas as três formas acima não têm cura definitiva. No entanto a fisioterapia, os bons cuidados no acompanhamento clínico e alguns aparelhos ortopédicos ajudam a manter a independência destas crianças, a função de seus músculos e a integridade física e mental.
Setor 276
O Setor 276 é um coletivo de grafiteiros que existe há cerca de dez anos. Eles possuem diversos trabalhos espalhados pelos muros de Juiz de Fora, como os desenhos que retratam o fundo do mar na Praça Cívica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), e outro, também na Itamar Franco, que tem o tema dinossauros.