O café mineiro e a força dos dados: como a informação pode transformar o agronegócio

“Os dados têm se tornado um aliado estratégico capaz de transformar o modo como o agronegócio é gerido, vendido e valorizado”


Por Franciele Cristina da Silva Moreira, formada em Gestão de Vendas pela USP/ESALQ

26/11/2025 às 07h17

Minas Gerais é sinônimo de café. Dos grãos colhidos no estado ao aroma que desperta o Brasil, a cafeicultura mineira é mais do que uma tradição: é um motor econômico que sustenta milhares de famílias e movimenta mercados dentro e fora do país. O que poucos percebem é que, por trás desse sucesso, os dados têm se tornado um aliado estratégico capaz de transformar o modo como o agronegócio é gerido, vendido e valorizado.

O estado responde por cerca de 46% da produção nacional de café, segundo o IBGE. Só o Sul de Minas representa um terço de tudo o que é cultivado no país. É uma região privilegiada: altitudes elevadas, clima ameno e solo fértil formam as condições ideais para o cultivo de cafés especiais, reconhecidos e premiados mundialmente. Ainda assim, a região carece de um elemento essencial de diferenciação — a indicação geográfica, selo que garante a origem e agrega valor ao produto.

No Cerrado Mineiro, por exemplo, a obtenção da Denominação de Origem mudou completamente o cenário econômico. Desde 2013, o selo permite que os produtores daquela região certifiquem seus cafés, assegurando autenticidade, qualidade e proteção contra falsificações. A valorização foi imediata: o preço do café subiu, as exportações cresceram e o nome “Cerrado Mineiro” se tornou uma marca global. O mesmo caminho poderia beneficiar o Sul de Minas, que hoje ainda não possui essa certificação.

Mas conquistar um selo de origem exige algo que vai além da tradição e da qualidade sensorial. Exige dados — e, sobretudo, a capacidade de analisá-los. O acesso a informações sobre produtividade, área plantada, clima, práticas agrícolas, assistência técnica e canais de comunicação com os produtores é o que permite construir diagnósticos precisos e embasar políticas públicas e estratégias de mercado. É nesse ponto que o estudo da gestão de dados no agronegócio ganha protagonismo.

A pesquisa realizada com base no Sistema IBGE de Recuperação Automática e no Censo Agropecuário mostra como o uso inteligente das informações pode ajudar a entender o perfil dos produtores mineiros, identificar gargalos e melhorar a gestão de vendas. Em Minas, o levantamento aponta que a maioria dos agricultores ainda depende de meios tradicionais, como rádio e televisão, para se informar. Por outro lado, cresce o número dos que acessam a internet e participam de grupos e cooperativas — um sinal de que o campo está, pouco a pouco, se digitalizando.

Esses dados revelam um desafio e uma oportunidade: é preciso investir em educação digital e assistência técnica. Muitos produtores ainda não têm acesso contínuo a orientação especializada, o que limita o aproveitamento de tecnologias e o planejamento comercial. Ao mesmo tempo, o avanço da conectividade rural abre espaço para plataformas de gestão, aplicativos de previsão climática e sistemas de rastreabilidade, que aproximam o produtor do mercado e ajudam a construir uma relação mais transparente com o consumidor.

Quando bem utilizados, os dados se tornam o elo entre o campo e o mercado. Eles orientam decisões de plantio, definem preços, ajudam a prever safras e permitem que as vendas sejam feitas de forma mais eficiente e estratégica. No caso da cafeicultura mineira, são também a chave para fortalecer a identidade regional, atrair investimentos e garantir que o “café do Sul de Minas” seja reconhecido — e valorizado — no mundo todo.

Mais do que máquinas, sementes e fertilizantes, o futuro do agronegócio depende da informação. Saber transformar números em conhecimento e conhecimento em estratégia é o que fará diferença nas próximas décadas. Minas Gerais, com sua tradição e potencial, tem diante de si uma oportunidade rara: unir a força da terra à inteligência dos dados. E quando o campo e a ciência caminham juntos, o resultado é um café ainda mais forte, sustentável e capaz de contar a história de um Brasil que cresce de forma inteligente.

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