A política e as nuvens


Por BRUNO CARLOS MEDEIROS Colaborador

20/08/2014 às 06h00

A política é como nuvem. Ao captar o estado de transformações que caracterizam o céu, a célebre comparação, poetizada pelo ex-governador de Minas Gerais Magalhães Pinto, é certeira em sua intenção de sintetizar o caráter imprevisível do jogo político. Decerto, a disposição das nuvens no céu é provisória; logo aquelas que admirávamos instantes antes seguirão, lenta e continuamente, rumos incógnitos, enquanto outras vão assumindo seus lugares, construindo desenhos que, em caminhos incertos, fatalmente virão a surpreender seus espectadores. Tal qual a política.

A perda repentina de Eduardo Campos fez da então pouco dinâmica disputa eleitoral um caldeirão de indefinições. Se antes as dúvidas concentravam-se na possibilidade já não tão remota de um segundo turno, a divisão dos papéis de protagonistas e coadjuvantes mostra-se, agora, com notáveis variações.

Marina Silva, ao fracasso da tentativa de registrar o seu próprio partido, a Rede Sustentabilidade, viu ruir suas pretensões de repetir a posição de terceira via no embate entre PT e PSDB que assumira no último pleito presidencial, quando se candidatou pelo PV e conquistou uma expressiva votação. A contragosto, restava-lhe, desta vez, o papel secundário – embora estratégico – de candidata à vice na chapa de Campos, o promissor ex-governador de Pernambuco, nome que vinha tentando alastrar-se pelo restante do país e que pouco conseguiu reverter a apatia do eleitorado por sua candidatura.

Atestando que, de fato, política e nuvens se assemelham na imprevisibilidade de suas trajetórias, Marina se vê novamente na condição que encarnou há quatro anos, como figura central de uma chapa, agora com benefícios que, mesmo originados de uma tragédia, tornam sua influência mais consistente do que se consagrada pelo meio a que intencionava – pelas bênçãos de seu próprio partido. Caso sua Rede estivesse oficializada, seu tempo na televisão seria irrisório. E, com o sumiço inesperado de Campos, a comoção popular intrínseca aos desastres paira sobre o seu nome, enquanto as alianças costuradas pelo falecido ex-governador, se mantidas por Marina, reforçam a estrutura política de seu projeto, infactível se no cenário que antes lhe soava mais vantajoso. Trata-se de uma inverossímil e enigmática reviravolta que se fez real.

Pelas inconstâncias dos interesses, lógica e política, definitivamente, pouco se relacionam. E, graças à natureza implacável da biologia, garantias esbarram-se na fragilidade da vida, inesperada feito nuvens.

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