Propagandas de cursos de inglês


Por MARIO LUIS MONACHESI GAIO, DOUTORANDO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM PELA UFF

16/02/2014 às 06h00

Dada a grande concorrência, alguns cursos de inglês têm se esmerado em criar propagandas cada vez mais criativas e sugestivas. À parte o fato de que todos eles prometem o aprendizado do idioma em pouco tempo (o que é aprender uma língua? Em quais habilidades? Em qual nível de competência?), a apelação da publicidade a recursos baseados em estereótipos preconceituosos me provocam mal-estar. Vejamos o exemplo de um cursinho on-line. Na propaganda, seu aluno prototípico é homem, jovem, branco, dentro dos padrões de beleza que nos são impostos; a professora é mulher e loura e pronuncia a última frase do esquete elevando os seios avantajados; o aluno do curso concorrente, de metodologia supostamente ultrapassada, é de estatura baixa, cabelos encaracolados e desarrumados e tem (ou faz) voz de taquara rachada.

Numa das peças, há também a professora do curso tradicional: gordinha, baixinha e séria. A publicidade sugere que os professores americanos (vejam bem, americanos!) são os melhores, pelo fato de terem o inglês como língua materna (o bordão cheio de sotaque da loura peituda é professores americanos, 24 horas por dia. Uma grande falácia. Não há sequer um (a) negro (a) brasileiro (a). O único que aparece numa das peças é americano e igualmente estereotipado: um jogador uniformizado de futebol americano, que agride o aluno para corrigir sua suposta pronúncia ruim.

Há também aquele outro curso cujo cenário da propaganda é uma sala de trabalho de uma empresa moderna, com alguns funcionários trabalhando em seus postos. De repente, um deles se levanta e grita para os outros: pessoal, o gringo tá chegandooo!. Uns se levantam baratinadamente e correm para se esconder; outros fingem não olhar para o gringo com medo de que ele lhes pergunte alguma coisa. Afinal, é uma vergonha não falar inglês… uma moça simpática e sorridente, com ar confiante, é a única que não foge.O estrangeiro – branco, alourado, alto, de terno e gravata – a procura e lhe pergunta onde é o escritório do sr. Silva (seria fortuita a escolha do nome?). A simpática moça estabelece uma conversa mínima com o elegante senhor e o acompanha. Cerca de 15 atores compõem a cena, entre eles não há nenhum (a) negro (a).

Considero as duas propagandas constrangedoras. A primeira, pelo caráter preconceituoso e pelos estereótipos enaltecidos, que só estimulam a regra da lei da selva. A segunda é um resumo do famoso complexo de vira-latas. Apresenta quase todos os mesmos preconceitos da primeira e valoriza a nossa subserviência histórica e a nossa suposta condição de incapazes e de eternos dependentes.

Eu não contrataria nenhum dos dois cursos com base nessas publicidades. Mas se foram pensadas assim e levadas ao ar assim, provavelmente trata-se de um modelo que vende. E dane-se o resto.

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