Buraco negro


Por MARIO EUGENIO SATURNO, tecnologista sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)

15/03/2015 às 06h00

O magnífico filme “Interestelar”, grande sucesso de público, crítica e entre os cientistas, trouxe ao público diversos temas, como o aquecimento global (na minha juventude, dizíamos efeito estufa), buraco de minhoca, buraco negro e singularidade.

Um dos momentos mais marcantes aconteceu quando a nave espacial Endurance dirige-se ao planeta Miller, que está muito próximo de um buraco negro, e, por isso, no planeta ocorre uma enorme dilatação gravitacional temporal – cada hora na superfície equivale a sete anos na Terra. Uma nave auxiliar é enviada, e, quando retornam para a Endurance, Cooper e Amelia descobrem que já se passara 23 anos.

Fiquei intrigado e julguei descobrir um erro do roteiro. A primeira vez que me dei conta de que a gravidade provocava dilatação do tempo foi quando analisei as equações de um GPS, o sistema de posicionamento global. Nestas equações, a dilatação do tempo é dividida em duas partes, a primeira, devido à velocidade do satélite (velha conhecida, usada em filmes como “O planeta dos macacos”, de 1968), e a segunda, devido à massa da Terra.

Quando falamos de buracos negros, extrapolamos o senso comum. Nasceu como um fato curioso da teoria de Einstein, por Karl Schwarzschild em 1916. Uma estrela gigante, quando morre, acabam as reações nucleares de fusão, e, então, a gravidade esmaga a matéria.

Estrelas com até dez vezes a massa do nosso Sol não são suficientes para fundir carbono. Um Sol dessa magnitude, após sua fase de gigante vermelha, ejetará sua camada externa, formando uma nebulosa planetária e deixando para trás um núcleo composto praticamente de carbono e oxigênio e 60% da massa do Sol e o tamanho da Terra. Este núcleo é mil vezes mais luminoso que o nosso Sol e é chamado de Anã Branca. Em algumas centenas de bilhões de anos, ela esfria e torna-se uma Anã Negra.

Estrelas com mais de oito vezes a massa do Sol podem gerar Supernova, uma explosão que ejeta a maior parte de sua massa. Em alguns dias, o seu brilho pode intensificar-se em um bilhão de vezes. Em nossa própria galáxia, foram registradas, até agora, apenas três supernovas: em 1054, 1572 e 1604 (essa estimulou Galileu a atacar o sistema vigente).

Anãs com massa superior a 1,5 à massa do Sol, a gravidade é tão forte que os elétrons dos elementos são esmagados no núcleo, originando nêutrons, e o resultado é uma estrela de nêutrons, com aproximadamente 15km de diâmetro.

Nos casos em que a massa desse núcleo ultrapassa três massas solares, a compressão não para, gerando um buraco negro. A matéria fica esmagada em um ponto com um campo gravitacional tão forte que nem a luz consegue sair. Isso não passava de uma curiosidade matemática até que surgiu o primeiro candidato a buraco negro em 1972 e, depois, a primeira evidência em 2008.

O filme “Interestelar” ignorou a enorme radiação no entorno do buraco negro e atribuiu ao planeta a dilatação do tempo (na verdade, quem estivesse na órbita do planeta também teria sua hora equivalente a sete anos da Terra), mas nos trouxe muitos temas científicos importantes para aprender e refletir.

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