Finanças públicas e tributação precisam ser discutidas
Nelson Saldanha, falecido em 2015, escreveu um belo texto, intitulado “O jardim e a praça”, em que demonstra nosso déficit civilizatório em tratar do espaço público, das discussões coletivas – daí a metáfora da “praça” -, sob uma lógica personalista, se cabível, apenas no espaço privado, no trato de questões individuais – daí o uso da expressão “jardim”.
O caso da tributação e das finanças públicas mostra como a lógica personalista impede avanços. Falta-nos, ainda, cultura genuinamente pública, de enxergar nos tributos o canal de realização de direitos fundamentais e políticas públicas. Direitos fundamentais e políticas públicas não nascem em árvores, têm custos, de modo que a resistência injustificada a pagamento de tributo impacta toda a sociedade.
Por outro lado, a cultura personalista leva governantes a atuações ineficientes, gastando mais do que os recursos permitem, ou à política indiscriminada de concessão de favores a setores econômicos e sociais, que diminuem as receitas públicas. Quando não, os recursos públicos escorrem pelos ralos da impunidade, diminuindo a legitimidade na cobrança tributária, pois o cidadão não percebe seu dinheiro voltando em prestações públicas.
É isso o que ocorre no problema recorrente dos benefícios fiscais, concedidos muitas vezes sob a alegação de que desenvolverão a economia, desconsiderando-se o fato de que o aumento da base tributável não é compatível com o que se deixa de arrecadar pelas renúncias feitas.
Encontrar um equilíbrio entre finanças públicas e tributação é uma das mais difíceis equações no arranjo social. Não se consegue apenas com discurso político: algum grau de estudo técnico sério pode apontar soluções institucionais. Nem deve ser uma discussão apenas circunscrita a gabinetes: a sociedade, em sua pluralidade, pode e deve ser ouvida.
Diante desse desafio e tentando colaborar, o IDT-JF promoverá nos dias 5 e 6 de novembro seu segundo congresso temático. Nele, oito expositores, com as mais variadas experiências de atuação profissional em torno do direito tributário e financeiro, debaterão sobre guerra fiscal, penalização dos contribuintes, impactos à livre concorrência pela tributação, criação abusiva de taxas e conflitos entre os entes políticos.
Destacam-se, entre eles, um ex-ministro do STJ, o atual procurador-geral do Estado de Minas Gerais, advogados com atuação em grandes escritórios, tributaristas de renome e advogados públicos com experiência e atuação nacional. Inovando, porém, ocorrerá paralelamente uma Jornada de Direito Tributário Municipal, quando serão expostos quatro temas sensíveis à realidade da cidade: a ausência de um Conselho de Contribuintes Municipal, os limites da tributação ambiental, o protesto da dívida ativa dos devedores junto ao Município e, ainda, o possível uso de depósitos dos contribuintes dados em ações tributárias como receita corrente.
Os próprios congressistas deliberarão sobre esses temas, apontando ao Município possíveis soluções. Espera-se que uma cultura cidadã, de aproximar as questões das finanças públicas e da tributação, surja, pois não basta mais reclamarmos do que está errado – “a má conservação de nossas praças” -, se não verificarmos que nós mesmos criamos a necessidade de atuação estatal por conta dos nossos erros.