Eleições 2018: Marte e o Sufrágio Universal


Por Isabela Monken Velloso, professora e pesquisadora do Instituto de Artes e Design da UFJF

03/10/2018 às 07h00- Atualizada 03/10/2018 às 08h08

 

Aproximam-se as eleições. Iremos à urna eletrônica e registraremos, secretamente, nosso voto. Ele será computado. Simples? Não. Esse gesto, muitas vezes realizado por tantos brasileiros, foi alcançado com pausadas e custosas progressões. Durante muito tempo, apenas pessoas muito abastadas, do sexo masculino, podiam participar dos processos de escolha. Somente no decorrer do século XX, começou a existir, paulatinamente, uma ampliação da participação de eleitores. Em 1932, mulheres brasileiras puderam ser contempladas. Em seguida, dois longos períodos de ditadura iriam também comprometer a qualidade representativa do voto: o Estado Novo e o Golpe de 1964, que perdurou até 1985. O processo eleitoral, tal como conhecemos hoje, somente se realizou no final do século XX, quando assistimos às Eleições Diretas, com voto universal e secreto, respaldadas pela Constituição de 1988. Com o caminhar dos anos, foram obtidas muitas conquistas sociais e uma ampliação de direitos civis. Certamente, todos esses progressos não ocorreram sem os esforços de muitos, a fim de que pudéssemos assistir, hoje, a este cenário oriundo da redemocratização e do Estado de Direito. Existe, portanto, muito suor humano nessa conquista pelo voto. E, nela, há muitas possibilidades.

O período eleitoral é sempre uma narrativa de escolhas. Os problemas políticos produzem desistência e desânimo, um desejo popularmente conhecido como vontade metafórica de “fuga para Marte”. Neste planeta, o Curiosity, rover da Nasa, continua pesquisando a possibilidade controversa da presença de vida. Investigam, com grandes aparatos tecnológicos, o aparecimento de água, moléculas orgânicas com certa complexidade e um ainda misterioso gás metano.

Afastadas as fugas, ainda que a jornada do robô possa trazer dados importantes, voltemos ao planeta azul, como nos apresentaram as retinas inaugurais do olhar de Yuri Gagárin. Desta grande esfera, os brasileiros estão entre as nações possuidoras das maiores fatias territoriais e dos maiores contingentes populacionais. Aqui temos certeza de que há vida inteligente. Decidiremos juntos, a partir dos votos válidos, como nosso país será. Para os que desejam a fuga simbólica ao processo de escolha, cabe a lembrança de que ela não nos trará a nação sonhada: para conquistá-la, precisamos estar acordados e em atenta vigília, fazendo valer o esforço dos que nos precederam.

Deixemos a fuga interplanetária para o Curiosity, pois ela não elegerá um presidente cósmico, ao contrário, nosso representante será escolhido por quem aqui estiver, com os olhos abertos e os pés no chão, atuando na concretude algébrica dos coeficientes eleitorais. Esses números definirão a que distância estaremos dos sonhos e se poderemos, com a satisfação dos direitos mais elementares, lançar tranquilos nossos olhos para o céu.

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