Laranjas na política

Em pleno Mês da Mulher, é, no mínimo, triste que candidaturas femininas ainda sejam colocadas apenas como tapa-buracos, e agora como laranjas, para preencher a cota de 30% reservada a elas nos cargos do Legislativo


Por Tribuna

12/03/2019 às 06h42- Atualizada 12/03/2019 às 07h25

Em pleno Mês da Mulher, é, no mínimo, triste que candidaturas femininas ainda sejam colocadas apenas como tapa-buracos, e agora como laranjas, para preencher a cota de 30% reservada a elas nos cargos do Legislativo. Como se não bastasse a pequena representatividade feminina, ainda há casos de mulheres que aceitam este papel de fazer parte de esquemas da velha e má política.

A situação se agravou nas últimas eleições porque o Tribunal Superior Eleitoral definiu também que pelo menos 30% do fundo eleitoral deveriam ser destinados às mulheres candidatas, com intuito de melhor distribuir os recursos. O que se esperava era que, com a destinação de mais verba paras as mulheres, a sub-representação feminina fosse mais bem resolvida, já que, com mais dinheiro, as mulheres poderiam ter campanhas mais bem estruturadas financeiramente. Mas a banda podre da política voltou a atacar, criando manobras para que a verba destinada a elas tivesse outra finalidade. Mesmo assim, a bancada feminina na Câmara Federal teve um crescimento de 50%, passando de 51 para 77 mulheres parlamentares.

De acordo com reportagem do jornal “Folha de S. Paulo”, duas candidatas por Pernambuco do PSL teriam agido como laranjas. Elas teriam se candidatado apenas para desviar dinheiro do fundo eleitoral, criado, exatamente, com o objetivo de combate à corrupção eleitoral. Em Minas, também houve uma denúncia. A candidata não eleita a deputada federal Adriana Moreira Borges, também do PSL, denunciou que o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, deputado reeleito pela mesma legenda, em Minas, teria proposto encaminhar R$ 100 mil a ela do fundo eleitoral. Deste total, ela devolveria R$ 90 mil à legenda. Essa maior parte do dinheiro seria destinada a candidatos “mais promissores”, de acordo com a denúncia.

O golpe não é exclusivo de um partido, mas também estaria presente em outras legendas. As candidaturas fictícias de mulheres são uma realidade em quase todas as eleições. O importante papel da lei das cotas de 30% para as mulheres com a intenção de aumentar a diversidade de gênero na representatividade política acaba ficando só no papel. Isso mostra que só esta lei não tem sido suficiente para levar as mulheres aos cargos públicos e que é preciso repensar novas estratégias, lembrando que a maior parte do eleitorado brasileiro é composta por mulheres.

Especialistas apontam que há múltiplas causas para esta baixa representatividade, entre elas as próprias questões culturais, somadas a fatores políticos, sociais, econômicos e institucionais. Ainda se pensa muito no país que a política é coisa para homem, no entanto, em muitos outros setores, a mulher tem conseguido mostrar a sua capacidade e galgar postos e avanços. Para que isso se resolva no mundo político, é preciso construir a ideia de que a mulher tem competência para as tarefas governamentais. Dentro desta mesma proposta, porém, é preciso reduzir o caldo profundamente machista dentro de nossa sociedade. Do contrário, mulheres vão continuar sendo fictícias ou laranjas no espaço que também é delas.

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