Medidas amargas
Governo tem que fazer o corte de gastos sem insistir em medidas compensatórias como a mudança, agora, na faixa do IR
A despeito de sua relevância, a inserção no pacote de corte de gastos de uma reforma na tabela do Imposto de Renda, para aumentar, para R$ 5 mil, a faixa de isenção do tributo, foi um contrassenso político cuja resposta do Congresso já se fez de pronto. Tanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), quanto o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já avisaram que farão todos os esforços para votar o pacote no mais breve possível, antes mesmo do recesso de fim de ano, mas anteciparam que a questão do IR ficará para o ano que vem.
Os parlamentares reverberam uma preocupação coletiva com a ação do Governo. O Planalto aceitou cortar gastos, para garantir as metas definidas no arcabouço fiscal, mas jogou para a plateia ao subir a taxa de isenção. Não que ela fosse desnecessário, mas pelo momento. Em outra etapa é possível atender tal demanda, que vai beneficiar expressiva parcela da população, mas falar em desoneração de receita no mesmo momento em que se é induzido a cortar gastos, não há sentido.
Não é de hoje que o país flerta com a inflação mantendo os gastos acima do desejado. O trabalho do ministro Fernando Haddad foi longo e penoso, pois corta na própria carne. O IR não passou pela mesa do ministro, tendo sido visto como uma compensação defendida pelo presidente Lula.
A questão é a inviabilidade de se atender ao mesmo tempo duas pautas que se chocam. Se insistir na tese, o Governo corre o risco de novos problemas, advindos especialmente da oposição que já ameaça fazer um pacote paralelo. Fora do poder, os adversários do Governo tentam, agora, fazer o que já deveria ter sido iniciado no mandato passado.
Nos seus pronunciamentos, os presidentes do Senado e da Câmara admitiram que concordam com o pacote, mas observaram que a responsabilidade fiscal é inegociável. Trata-se de um aviso claro que não irão avançar nas duas pautas ao mesmo tempo, mesmo diante da relevância de ambas.
Como 2025 é um ano sem eleição, o Governo ganha uma pausa da opinião pública mesmo diante da impopularidade da medida. E aí, de novo, volta o senador Rodrigo Pacheco, que, em nota, advertiu que “em se tratando de política fiscal, é preciso afastar o medo da impopularidade que constantemente ronda a política”. Mais claro do que isso é desnecessário.
O presidente Lula, especialmente, sabe que a redução na capacidade de investimento é sempre um problema, mas ele também, por já estar num inédito terceiro mandato, sabe que é melhor adotar medidas amargas agora, quando seu posto não está em jogo, do que no período eleitoral. E 2026 está muito próximo.
A próxima eleição, além da natural polarização que se fará presente, pode ter uma agenda mais ampla, na qual a economia será a referência. Daí, cortando agora, o presidente Lula – com possibilidade de buscar a reeleição – terá tempo de passar por um período de bonança econômica se o pacote ora em questão render os bons e esperados resultados.