Cesama tem superávit, e PJF volta a descartar privatização
Situação da empresa pública foi discutida em audiência na Câmara, em meio a receios trazidos por novo marco regulatório do saneamento básico
A Câmara Municipal de Juiz de Fora realizou, na tarde desta terça-feira (27), uma audiência pública que discutiu os possíveis reflexos da lei federal que, no ano passado, implementou novo marco regulatório do saneamento básico no Brasil na Companhia de Saneamento Municipal (Cesama). Nos últimos dias, vários atores políticos da cidade demonstraram temor de que as mudanças nas regras poderiam resultar em uma privatização dos serviços de abastecimento de água e esgoto prestados pela Cesama. Representantes da Prefeitura presentes à discussão, todavia, foram taxativos ao reforçar que a prefeita Margarida Salomão (PT) e sua equipe não trabalham com a hipótese de uma privatização da empresa pública, que apresentou saldo positivo de R$ 46 milhões no exercício financeiro de 2020.
“A prefeita Margarida Salomão (PT) tem uma posição clara e não tem nenhuma intenção de participar de processo de privatização, nem da Cesama e nem do Demlurb, e nem de abertura de capital destas empresas, o que acabaria por trazer impactos nas tarifas”, afirmou o diretor-presidente da Cesama, Júlio Teixeira. Tal posição foi reforçada ainda por falas das secretárias municipais de Governo, Cidinha Louzada; e da Fazenda, Fernanda Finotti. “Não está na pauta da Prefeitura. Não temos a menor intenção de fazer qualquer movimento neste sentido”, afirmou Fernanda, reforçando se tratar de uma empresa “superavitária”, da qual a PJF tem 99% das ações.
Números de 2020
Em sua apresentação, o diretor-presidente da Cesama apresentou números dos balanços da empresa pública no exercício financeiro de 2020. De acordo com os dados elencados, no ano passado, a Cesama obteve receitas da ordem R$ 241,3 milhões, compostas majoritariamente por arrecadação das tarifas cobradas pela prestação de serviço de água (58,4%) e de esgoto (38%). Já as despesas somaram um total de quase R$ 195 milhões. Os principais dispêndios dizem respeito a gastos com pessoal (32,87%); despesas fiscais e tributárias (29,09%); além de serviços terceirizados (11,93%) e energia elétrica (10,59%).
Assim, quando computadas receitas e despesas observadas na Cesama durante o exercício financeiro de 2020 verifica-se um saldo superavitário da ordem de R$ 46,3 milhões. “É uma empresa que dá superávit e não está no negativo”, resumiu Júlio Teixeira.
Com a consolidação do saldo positivo, a Prefeitura de Juiz de Fora, que detém a ampla maioria das ações da Cesama, e o Demlurb, que detém uma pequena parte, receberam, juntos, R$ 17 milhões em dividendos, recursos incorporados ao orçamento municipal.
Investimentos estimados em cerca de R$ 50 milhões
Ao longo das discussões, o comando da Cesama admitiu que a empresa pública possui cerca de R$ 100 milhões em caixa. Contudo, o uso de tais recursos e os investimentos são vinculados a avaliação e orientação da agência reguladora, conforme as previsões legais. No caso da Cesama, desde setembro do ano passado, a regulação é feita pela Agência Reguladora Intermunicipal de Saneamento Básico de Minas Gerais (Arisb). Entre 2012 e 2020, a fiscalização era de responsabilidade da Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae).
Segundo os dados apresentados durante a audiência pública, no momento, a Cesama tem previsão de investimentos de cerca de R$ 50 milhões em 2021. Ao longo da audiência pública, foram elencadas ações em andamento ao custo de R$ 38 milhões. O maior investimento destacado pelo diretor-presidente da empresa pública diz respeito à construção da quarta adutora, cuja contrapartida ao empréstimo feito pela Caixa Econômica Federal chega a R$ 12 milhões.
Outras obras
Também foram citadas obras na rede tronco de água do Bairro Sagrado Coração, ao custo de R$ 3,1 milhões; os trabalhos de despoluição do Rio Paraibuna, R$ 6,3 milhões; a construção de um novo reservatório com a capacidade de cinco milhões de litros de água, R$ 6 milhões; e a implantação de outros dez reservatórios em bairros diversos, R$ 4,2 milhões. Ainda foram elencadas a construção de rede tronco de água no Bairro Retiro, R$ 3 milhões; do sistema de abastecimento de água em Chapéu D’uvas, R$ 1 milhão; da obra de ampliação da estação de tratamento de água do Distrito Industrial, R$ 1,8 milhão; além da implantação de ações de segurança patrimonial (R$ 500 mil) e da Lei Geral de Proteção de Dados no âmbito da empresa pública (R$ 200 mil).
Temor é com o futuro da empresa pública
Ao longo da audiência pública, vários vereadores manifestaram preocupação com a possibilidade das disposições do marco regulatório do saneamento básico resultarem na privatização dos serviços de abastecimento de água na cidade. Bejani Júnior (Podemos) lembrou de um encontro realizado entre representantes da Prefeitura e vereadores, em que o diretor-presidente da Cesama externou sua preocupação aos parlamentares sobre o assunto. De forma geral, o vereador Zé Márcio Garotinho (PV) resumiu a preocupação dos colegas e destacou que o novo marco regulatório favorece a privatização do sistema de abastecimento de água e também de coleta de resíduos sólidos.
Assim, há também a preocupação com o futuro da Cesama no longo prazo, receio que foi reforçado nas palavras de Antônio Aguiar (DEM), que considerou que, historicamente, tais políticas de vieses privatistas, quando colocadas de cima para baixo, acabam obtendo êxito de uma forma ou de outra. Tal preocupação foi compartilhada pelo diretor-presidente da Cesama. Apesar da posição firme de momento da Prefeitura, o receio é de que as novas regras imponham uma asfixia financeira à empresa, o que poderia resultar em dificuldades futuras.
Segundo Júlio Teixeira, desde dezembro do ano passado, por exemplo, um decreto federal restringiu o acesso da Cesama a recursos da União e à contratação de financiamentos junto a instituições federais, como a Caixa e o BNDES. “Uma fonte de receita se fecha”, pontuou. Outro temor é de que, por movimentação de agências reguladoras, possa ocorrer um estrangulamento tarifário de forma a inviabilizar as empresas municipais que resistirem às novas regras. “Há riscos. O nosso temor é no longo prazo”, disse.
Tendência no exterior
Entre outras ponderações feitas por parlamentares que participaram da audiência pública, alguns vereadores lembraram que cidades da Europa, após privatizarem seus sistemas de abastecimento de água, passam, agora, por um processo de reestruturação do serviço, conforme pontuaram João Wagner Antoniol (PSC) e Laiz Perrut (PT). Único deputado presente à discussão, o parlamentar estadual Roberto Cupolillo (Betão, PT), reforçou o coro. “Estamos na contramão da corrente mundial.”
Diretor-presidente defende produtividade da empresa pública
Na última sexta-feira, a Tribuna trouxe em destaque uma reportagem que detalhou que o Governo de Minas avança na construção de um projeto que prevê a criação de unidades regionais de saneamento básico no estado, formando blocos para possíveis leilões de privatizações. O esboço segue os termos do marco regulatório e, no último dia 31 de março, foi apresentado a concessionárias privadas de água e esgoto de todo o país. Segundo o diretor-presidente da Cesama, até esta terça, as prefeituras mineiras não haviam tido acesso à minuta.
A despeito disso, Júlio Teixeira comentou alguns pontos que foram observados como metas a serem possivelmente colocadas para as empresas interessadas em participar de concessões dos serviços de abastecimento de água e esgoto dentro do modelo de consórcios regionais, que vem sendo trabalhado pelo Governo mineiro. As informações foram obtidas em algumas explanações públicas feitas por representantes do Estado.
Nesse sentido, ele citou especificamente dois quesitos aos quais consideram que a Cesama já apresenta um resultado melhor, do que “aquele que se espera com os serviços privatizados”, nos moldes que podem ser apresentados no projeto de lei que vem sendo trabalhado pelo Estado. Em um dos tópicos elencados por Júlio está o índice de produtividade da empresa. Segundo ele, as informações conhecidas até aqui, dos esboços tratados pelo Governo de Minas, colocam uma meta de 352,5 hidrômetros por empregado. Atualmente, a Cesama trabalha com um índice de produtividade de 409,1 hidrômetros por empregado.
O diretor-presidente disse ainda que, nos esboços do Governo de Minas, a meta colocada para possíveis empresas que operam no setor de saneamento básico do estado é de uma inadimplência de 2,5%. Em 2020, a Cesama registrou inadimplência dos consumidores na ordem de 2,3%. “A Cesama tem um índice de produtividade maior que o proposto. E temos uma tarifa baixa”, considerou. Júlio Teixeira lembrou ainda que a proposta que o Estado vem conduzindo é de que a tarifa corresponda a um comprometimento máximo de 5% da renda familiar. Atualmente, nas balizas trabalhadas pela empresa pública juiz-forana, tal comprometimento é de, no máximo, 1,5%