Câmara Municipal de JF aprova ‘bolsões’ para motos e bicicletas

Proposição aprovada quer reservar áreas para veículos de duas rodas nas vias urbanas


Por Renato Salles

23/02/2019 às 05h45- Atualizada 23/02/2019 às 15h54

As ruas de Juiz de Fora dotadas de semáforos podem ganhar faixas de retenção e de recuo exclusivo para bicicletas e motocicletas. A previsão consta de projeto de lei de autoria do vereador André Mariano (PSC), aprovado pela Câmara Municipalnesta sexta-feira (22) em caráter definitivo. Agora, para ganhar efeitos de legislação municipal, o texto segue para a sanção do Poder Executivo, que tem a prerrogativa de vetar a proposição. Segundo a matéria, são considerados bolsões de proteção “o espaço livre, demarcado antes da faixa de retenção, exclusivo para bicicleta e motocicletas, que se posicionem à frente dos demais veículos automotores, enquanto aguardam a liberação do semáforo para transitar”.

O projeto de lei define ainda que as faixas de retenção de recuo em questão deverão ser sinalizadas conforme normas fixadas por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Atualmente, Juiz de Fora já possui tais bolsões em alguns cruzamentos. “A instituição de espaços livres para a permanência de ciclistas e motociclistas, concomitantemente, enquanto aguardam a abertura do semáforo, é mais uma maneira de proteção aos elementos mais frágeis do trânsito, melhorando a visibilidade dos veículos e pedestres”, afirmou André Mariano para justificar a proposição. Caso seja sancionada pelo Executivo, a legislação funcionará como fomento para a adoção de espaços livres, demarcados antes de faixas de pedestres. Assim, estes poderão se posicionar à frente dos demais veículos automotores, enquanto aguardam a liberação do semáforo para transitar.

Com a proposição ainda carente de sanção do Executivo, a Secretaria de Transporte e Trânsito (Settra) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) afirmou, por meio de nota, que “vai avaliar o projeto de lei para verificar a viabilidade de implantação”.

Inconstitucionalidade

Em agosto de 2017, uma proposta similar chegou a tramitar na Câmara, quando o vereador Júlio Obama Jr. (PHS) deu entrada em proposta que pretendia regulamentar espaços livres, demarcados exclusivamente para motos próximos aos semáforos e à frente dos demais veículos. À época, o projeto de lei foi considerado inconstitucional pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação do Poder Legislativo juiz-forano, que apontou vício relacionado à iniciativa da proposta. O argumento apresentado na ocasião era o de que tal proposição seria de competência privativa do Executivo. A tramitação da matéria acabou suspensa a pedido do próprio autor.

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São considerados bolsões de proteção o espaço livre, demarcado antes da faixa de retenção, exclusivo para bicicleta e motocicleta

Para ciclistas e motociclistas, proposta traz maior segurança

Diretor grupo Mobilidade JF, que reúne ciclistas da cidade, Guilherme Mendes considera que a proposta pode ser benéfica para a segurança das pessoas que transitam de bicicleta. Porém, para além de o projeto de lei fomentar a implementação dos bolsões para bikes e motos, Guilherme defende a necessidade de investimento constante em ações de conscientização. “Qualquer movimento neste sentido é válido. A ideia das bicicletas ficarem à frente quando o semáforo estiver fechado se justifica pois ela tem uma arrancada mais rápida que o carro em ponto morto. Estando em área reservada, o motorista vê o ciclista e já pode tomar cuidado na hora de partir com o veículo. Este espaço é importante, mas ele tem que ser apresentado corretamente a ciclistas, motociclistas e motorista. Temos que aproveitar esta proposta para promover ações e informar a população sobre a razão destes espaços e de seus benefícios.”

Guilherme lembra ainda que, desde a adoção de ciclorrotas em diversas áreas da cidade, em 2016, já há espaço reservados para as bicicletas antes dos sinais, as chamadas “bike boxes”. Para ele, a proposta de se adotar “bolsões” cumprirá objetivo similar. “Elas (as bike boxes) realmente trazem maior visibilidade para os ciclistas”, reforça. O ciclista não vê problemas no fato de bicicletas e motos dividirem o mesmo espaço, como sugere o projeto de lei e lembra que tal situação já acontece atualmente nos espaços destinados às bikes. “De vez em quando, há motos. Mas dá para compartilhar. Temos que ser sempre a favor do compartilhamento, desde que haja o respeito para os ciclistas”, diz, reforçando a necessidade de ações de conscientização no trânsito.

Motoentregadora e ex-integrante de uma associação de motofretistas de Juiz de Fora, Mazza Dias também avalia como positiva a possibilidade de a cidade ganhar novos bolsões reservados para motos e bicicletas. Para ela, a medida confere maior segurança, por reduzir as situações em que os motociclistas circulam no corredor entre as faixas de veículos. Isto evita o trânsito de motos entre os carros e traz maior segurança para os motociclistas.” Mazza também não vê problemas em dividir o espaço com bicicletas e cita as existências das “bike boxes”. “Todos temos o mesmo direito no trânsito, afinal, muitos usam as motos para trabalhar e todos pagam impostos como o IPVA”, considerou a motofretista.

O autor do projeto de lei também defende que a medida pode resultar em maior segurança para o trânsito em geral. “É evidente e de conhecimento geral da sociedade de Juiz de Fora, bem como nas demais cidades do país, o registro de acidentes de trânsito diário, envolvendo ciclistas e motociclistas. É preocupante a quantidade de acidentes graves e mortes. Por isso, é imprescindível, além de meios que impeçam novos acidentes, a conscientização de todos para conter essa violência no trânsito”, afirma o vereador André Mariano, também na justificativa do dispositivo validado pela Câmara.

Fluxo de motos no corredor é permitido

Especialista em engenharia de Transportes, José Luiz Brito Bastos também considera que a adoção de bolsões antes dos semáforos pode ser benéfico e trazer maior segurança ao trânsito. Em especial, para conter acidentes com motocicletas, aos quais ele classifica como “o veículo mais perigoso de todos”. “Isto já foi adotado em São Paulo e, lá, parece que está dando certo. Acho que pode ser interessante. Eles (motociclistas) vão sempre querer chegar lá na frente e isto, de uma certa forma, atende ao que eles querem. Se saírem na frente, livres, menos riscos de acidentes”, avalia o especialista.

Para Brito, o fluxo de motos no corredor entre os veículos potencializa os riscos de acidentes. “Acho errado. A motocicleta não foi criada com este propósito”, afirma, lamentando o fato de a legislação brasileira permitir que as motos transitem entre as faixas de rolamento. Mesmo considerada arriscada, a prática é, de fato, utilizada por motociclistas e não é proibida pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Durante a elaboração do CTB, um artigo vedando a utilização do corredor pelas motos chegou a integrar a norma legal, mas acabou vetado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1997, ano da publicação da legislação. “Ao proibir o condutor de motocicletas e motonetas a passagem entre veículos de filas adjacentes, o dispositivo restringe sobremaneira a utilização desse tipo de veículo que, em todo o mundo, é largamente utilizado como forma de garantir maior agilidade de deslocamento”, afirmou o texto do veto, há quase 12 anos.

35 mil motos em JF

Em maio do ano passado, a Tribuna divulgou reportagem sobre o crescimento exponencial da frota de motos em Juiz de Fora. Entre 2008 e 2018, conforme dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), o número deste tipo de veículo mais que dobrou na cidade – cresceu 117% – passando de 16.458 para 34.744 no hiato de uma década. De lá para cá, a evolução persiste e, uma vez mais, segundo o Denatran, o número de motocicletas na cidade já chegava a 35.775.

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