CPI dos Ônibus pede nova licitação e congelamento de tarifas
Comissão também fez uma série de recomendações ao Poder Executivo
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instalada na Câmara Municipal de Juiz de Fora para apurar possíveis irregularidades no cumprimento do contratos de concessão de serviço de transporte coletivo da cidade, apresentou seu relatório final na tarde desta segunda-feira (19). No texto elaborado pelo vereador e relator Carlos Alberto Mello (Casal, PTB), a comissão defendeu a realização de novo processo licitatório para a escolha das empresas responsáveis pela exploração dos ônibus que integram o sistema urbano juiz-forano. O colegiado também fez uma série de recomendações ao Poder Executivo e pede que, até que as sugestões sejam respondidas e acatadas pela Prefeitura, haja o congelamento das tarifas cobradas pelo serviço.
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Para justificar o pedido para que o Poder Executivo realize novo processo licitatório, o relatório da CPI dos Ônibus afirma que “ficou evidenciado que o serviço público está sendo prestado de forma inadequada, pela existência, desde o início do contrato, de descumprimento de diversas cláusulas do contrato de concessão, do regulamento do serviço de transporte coletivo urbano do Município de Juiz de Fora, da Lei Federal 8.666/93 e da Lei Federal 8.987/95, tudo em conformidade com o apurado pelas investigações desta CPI”.
Em contato com a Tribuna, a Prefeitura afirmou que aguardará o recebimento do relatório da CPI dos Ônibus para, então, manifestar-se sobre o assunto. O documento também deve ser encaminhado ao Ministério Público Estadual, ao Tribunal de Contas do Estado e também às empresas que operam o sistema de transporte coletivo urbano. A Tribuna também solicitou um posicionamento sobre o texto final da CPI aos consórcios Manchester de Transporte Coletivo e Via JF, que foram os vencedores de licitação para a prestação do serviço finalizada em 2016. A Astransp, que representa o Consórcio Manchester e a Viação São Francisco Ltda. (uma das integrantes do Consórcio Via JF) informou que não há tempo hábil para adequada avaliação pelas equipes técnicas e diretoria a fim de definir um posicionamento. Em nota, garantiu que “irá aguardar notificação e acesso à íntegra do relatório para se manifestar”. Até a edição deste texto, a Ansal, que detém 80% do Consórcio Via JF, ainda não havia se manifestado.
Além de nova licitação e do congelamento de tarifa, foram várias as sugestões pedidas em caráter imediato feitas ao Poder Executivo no relatório final pela CPI. Entre eles, a criação de um departamento específico para análise, processamento e julgamento dos processos administrativos relacionados ao sistema; a retirada da incumbência da fiscalização mecânica das concessionárias, passando tal responsabilidade à Settra ou à empresa terceirizada idônea; capacitação e reciclagem frequente dos agentes responsáveis pela fiscalização da prestação de serviços; contratação e formação de pessoal para fiscalização de trânsito e transporte; maior clareza na metodologia de cálculo da idade média dos veículos do transporte coletivo.
Também foram feitas recomendações às empresas concessionárias. Entre elas, que as reposições dos veículos da frota sejam feitas com veículos zero quilômetro; e a adoção de uma política de inclusão social no transporte público coletivo do Município em favor das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. O relatório pleiteia, ainda, a adequação contra intempéries dos 3.941 abrigos cadastrados na Settra; e a retomada do padrão de cores dos ônibus, com identificação por região/bairros, como era adotado antes da licitação finalizada em 2016, “a pedido da própria população”. A CPI requer ainda melhoria nos cursos de treinamento e reciclagem oferecidos pelas empresas e concessionárias aos seus funcionários; e que seja estabelecido um amplo programa de incentivo ao uso do transporte coletivo, “visando o crescimento sustentável da cidade.”
Relator reforça que papel fiscalizador do Legislativo foi cumprido
Antes da leitura do relatório no plenário da Câmara, os integrantes da CPI dos Ônibus concederam uma entrevista coletiva na sede do Poder Legislativo. Relator dos trabalhos, Carlos Alberto Mello fez questão de destacar as legislações e regras que balizam os trabalhos de uma comissão parlamentar de inquérito, reforçando que a população precisa estar ciente sobre as responsabilidades e os limites dos trabalhos do colegiado, reforçando que as conclusões devem ser encaminhadas para o Ministério Público, que é o órgão que tem a prerrogativa legal de apurar as supostas irregularidades apontadas. “Temos limitações impostas pelas legislações vigentes e pela Constituição”, afirmou o relator.
Além do relator, a CPI é integrada ainda pelos vereadores Cido Reis (PSB), José Márcio (Garotinho, PV) e Wanderson Castelar (PT), além de Adriano Miranda (PHS), que presidiu os trabalhos. “Nossa principal sugestão para o Poder Executivo é de que não haja aumento da tarifa de ônibus até que todos os pontos apontados no relatório sejam resolvidos e também que o Município repense sobre a possibilidade de realizar uma nova licitação que atenda os anseios da população”, afirmou o presidente da CPI. Neste sentido, Adriano também reforçou o discurso que que agora cabe à Prefeitura atender às recomendações e ao Ministério Público conduzir possíveis apurações sobre os problemas apontados durante a comissão parlamentar de inquérito.
Relatório foi aprovado com quatro votos favoráveis e um contrário
Os trabalhos da CPI dos ônibus foram finalizados na última sexta-feira, dia 16. A instauração do processo ocorreu em novembro de 2018. Apresentado na tarde desta segunda (19), o relatório final foi aprovado com quatro votos favoráveis dos cinco vereadores que integram a comissão, recebendo o apoio de Adriano Miranda, Carlos Alberto Mello, Cido Reis e José Márcio. A única voz discordante foi a de Wanderson Castelar.
Castelar justificou sua posição isolada no colegiado por discordar de decisão que impediu uma análise prévia do relatório antes da votação final do texto em reunião realizada na última sexta-feira. O petista afirmou que gostaria de fazer uma série de sugestões, por sua experiência na Câmara – é o único dos cinco integrantes da CPI que cumpre seu terceiro mandato -, por ter acompanhado as discussões que antecederam o processo licitatório finalizado em 2016, entre outros pontos. Neste sentido, o autor do único voto contrário ao texto final da CPI questionou até a transparência do documento apresentado. Por sua vez, Carlos Alberto Mello afirmou que a decisão de que o texto só fosse apresentado no encontro da semana passada foi tomada de forma colegiada e teve o apoio de quatro dos cinco integrantes do grupo.
Segundo material divulgado pela Câmara, durante o início dos trabalhos, após definidos os nomes que ocupariam a presidência e a relatoria do colegiado, foram recolhidas mais de 30 mil páginas de documentos fornecidos pelos consórcios Via JF, Manchester e pela Prefeitura. Também foram realizadas várias diligências nas ruas, para verificar as informações e apurar a veracidade de denúncias feitas por usuários por canal de comunicação aberto no site da Câmara especialmente para receber os questionamentos da população.
Licitação manteve mesmos grupos financeiros na prestação dos serviços
O processo licitatório que definiu as concessionárias que ficariam responsáveis pelos serviços de transporte coletivo urbano em Juiz de Fora foi finalizado em abril de 2016, quando os consórcios Manchester de Transporte Coletivo e Via JF, foram confirmados como vencedores da disputa para a exploração do sistema por um período de dez anos, com possibilidade de prorrogação por igual período. Na ocasião, a concorrência levou em conta a combinação de melhor técnica e menor preço.
As duas concessionárias, no entanto, são constituídas pelos mesmos grupos econômicos que já prestavam o serviço no município antes do processo licitatório. Antes da concorrência finalizada em 2016, operavam o sistema as empresas Auto Nossa Senhora Aparecida Ltda. (Ansal); Goretti Irmãos Ltda. (Gil); Autoviação Norte Ltda. (Norte); Viação Santa Luzia Ltda. (VSLL). Viação São Francisco Ltda. (VSFL) e Transporte Urbano São Miguel Ltda. (Tusmil).
Destas, quando do anúncio do resultado da licitação, em abril de 2016, a Ansal, a Santa Luzia (integrando o grupo de Uberlândia) e a VSFL constituíam o Consórcio Via JF; enquanto o Consórcio Manchester era formado pela Gil e também pela Tusmil. Após a definição do novo modelo, as duas concessionárias passaram a dividir três áreas operacionais, para atender aos bairros e regiões da cidade.
Entre as novidades previstas para o sistema de ônibus da cidade, nos novos contratos estavam a disponibilização de serviços de internet sem fio dentro dos veículos; a expansão do bilhete único para 100% das linhas; a renovação gradual da frota e a utilização de micro-ônibus para transporte em locais de difícil acesso; além da previsão de, dentro do prazo de até dois, aumentar o número de linhas, que deveriam passar de 271 para 305.
Histórico
As discussões sobre a licitação do serviço de transporte coletivo urbano de Juiz de Fora tiveram início em 2013, ainda no primeiro ano de mandato do ex-prefeito Bruno Siqueira (MDB), que renunciou ao mandato em abril do ano passado para tentar uma cadeira na Assembleia Legislativa (ALMG), dando, assim, lugar para o atual prefeito Antônio Almas (PSDB). À época, o emedebista chegou a classificar a realização do certame, o primeiro processo licitatório para a concessão dos serviços realizado na cidade.
Trabalhos contaram com visitas a garagens e coleta de depoimentos
O projeto para implantação da CPI dos ônibus teve sua primeira manifestação no início de novembro de 2018, quando o vereador Adriano Miranda (PHS) apresentou requerimento solicitando a instauração da comissão para apurar possíveis descumprimentos contratuais das concessionárias responsáveis pelo sistema de transporte público urbano de Juiz de Fora. A justificativa para o pedido seriam as inúmeras reclamações dos usuários em relação à qualidade do serviço prestado.
O primeiro balanço das atividades foi apresentado em 25 de fevereiro e apontou indícios de violação da idade média máxima de ônibus em circulação – estipulada em cláusulas contratuais após o processo licitatório -, bem como o descumprimento fiscal de integrantes dos consórcios diante do Município, com algumas empresas carecendo de Certidão Negativa de Débitos (CND). À época, o presidente da CPI, o vereador Adriano Miranda, afirmou que 20% da frota de ônibus da cidade completaria o tempo de vida útil em 2019 e que, de acordo com o contrato de licitação, a idade média dos veículos deve ser de cinco anos e todos devem ter menos de dez anos de fabricação.
Trabalhos de campo
A comissão iniciou os trabalhos de campo com uma visita à garagem da Gil em 3 de abril. A vistoria dos parlamentares apontou que, dos 142 ônibus da empresa, 84 não contavam com bancos acolchoados, um descumprimento de item mínimo de exigência previsto nos contratos de licitação para o transporte coletivo. No dia seguinte, as garagens das demais empresas foram alvo das apurações da CPI. Parte das irregularidades levantadas nas últimas atividades foi apresentada no dia 5 de abril.
Em continuidade ao trabalho de campo, os parlamentares visitaram, no dia 10 de abril, três pontos de ônibus finais, a fim de verificar a situação dos veículos, bem como dos locais utilizados para o embarque de passageiros. Um dos coletivos vistoriados apresentou problemas no estado de conservação, tendo sido autuado pelos fiscais da Settra que acompanharam a vistoria.
Depoimentos de empresários e representantes da PJF
Em um dos primeiros depoimentos, a CPI ouviu, em 8 de maio, o empresário Ricardo Mendanha, consultor em transportes, ex-presidente da BH Trans (Empresa de transportes e Trânsito de Belo Horizonte) e diretor da empresa RuaViva, contratada pela PJF para analisar o equilíbrio financeiro do funcionamento do transporte público local. Como informado na coluna Painel, durante seu depoimento, Mendanha afirmou que não há relação na cidade entre o valor da tarifa e a qualidade do serviço. Para ele, se a qualidade não é boa, o preço não é o responsável, mas sim a fiscalização da Settra junto às empresas.
Representantes da PJF também prestaram depoimentos, como o ex-titular da Settra, Rodrigo Tortoriello; o secretário da Fazenda, Fúlvio Albertoni; e o procurador-geral do município, Edgar Souza Ferreira. Em meio aos trabalhos da CPI, Tortoriello, inclusive, pediu exoneração do comando da Settra, função que ocupou por seis anos e quatro meses desde o primeiro mandato do ex-prefeito Bruno Siqueira (MDB), a partir de janeiro de 2013. A saída foi confirmada no dia 5 de abril.
Com todas as fases concluídas, a CPI deveria entregar o relatório final. Isto iria ocorrer em 5 de junho, entretanto, o prazo se tornou inviável devido à grande quantidade de material a ser analisado pela comissão. Assim, a Câmara prorrogou o prazo para entrega do documento.
Em contato com a reportagem, a Prefeitura afirmou que aguardará o recebimento do relatório da CPI dos Ônibus para, então, manifestar se sobre o
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