Ubá terá centro cultural para honrar e estimular suas memórias
Paço Municipal Governador Ozanam Coelho deixará de ser sede administrava para assumir sua vocação cultural em 2024
Localizado na região central de Ubá, o Paço Municipal Governador Ozanam Coelho deixará de ser sede administrativa para assumir sua vocação como centro cultural, em 2024, após processo de revitalização. O prédio histórico, tombado, construído em 1900, que já abrigou também os poderes Legislativo e Judiciário, reunirá a diversidade artística de diferentes gerações que fizeram e fazem a história da cidade, assim como servirá de estímulo aos novos talentos.
“Nossa finalidade é homenagear nossos artistas e a nossa cultura. Os estudos já estão em andamento junto à equipe de arquitetos e engenheiros. O projeto será licitado e, se tudo der certo, ano que vem, o prédio estará totalmente restaurado”, explica o prefeito de Ubá, Edson Teixeira Filho, ao destacar também que a revitalização contemplará melhorias na parte elétrica e na acessibilidade. A política de ocupação, porém, ainda não está definida.
Para o presidente do Conselho Deliberativo do Patrimônio Histórico e Cultural de Ubá, André Padilha, centros culturais têm como princípio a preservação da identidade e da memória, além de estimular nas novas gerações o gosto e o interesse pela arte. “Nós acreditamos que a iniciativa trará para a cidade todo o processo historiográfico e cronológico dos grandes acontecimentos que fizeram de Ubá o que ela é hoje. Seja por meio de personagens da história do país, seja por meio das manifestações artísticas e das manifestações culturais”, diz, entusiasmado com a novidade.
Além da restauração do Paço Municipal e sua entrega para a classe artística, duas estações ferroviárias, situadas no povoado de Ligação, já foram recuperadas como parte da estratégia de perpetuar a história de Ubá. Outras duas, sendo uma no Distrito de Diamante e outra na Praça Guido, na área central, estão em obras.
“Segundo consta na história, Dom Pedro II visitou a estação do Guido, que é a mais antiga. É uma construção muito bonita que possui um teatro, utilizado pelo pessoal da melhor idade. É nossa intenção também desenvolver outros projetos culturais e sociais nessa área”, observa o prefeito Edson Filho. Segundo ele, os espaços já recuperados têm servido de ponto de encontro para comunidades e, por isso, a Prefeitura planeja uma série de atividades para fomentar ainda mais a ocupação, como uma “Virada Cultural” e um festival gastronômico.
Um ato de fé, história e resistência que virou documentário
É impossível falar sobre cultura em Ubá sem reverenciar o congado, manifestação cultural religiosa de origem afro-brasileira que recria, através de um bailado com canto e música, a coroação de um rei do Congo. “Nós somos uma sociedade que reúne pessoas simples, operárias, trabalhadores. Não tem discriminação racial, social, cultural, religiosa de jeito nenhum. É um ato de fé, de resistência e de cultura”, define a secretária da Sociedade Ubaense dos Congados Nossa Senhora do Rosário, Marli Albino da Costa, que está na ativa há mais de 50 anos.
Patrimônio histórico imaterial de Ubá, o congado mantém vivas as tradições africanas em Minas Gerais. Segundo o historiador e professor universitário José do Carmo de Araújo, os negros no Brasil reproduziam os reinados do Congo, que são capítulos marcantes da história do continente africano. Durante as apresentações, os chamados “congadeiros” saem do anonimato do dia a dia para se tornarem reis, rainhas, príncipes e princesas na corte da Sociedade Ubaense dos Congados Nossa Senhora do Rosário.
Mesmo sendo um grupo católico, acolhe pessoas de diferentes religiões, assim como não está vinculado a partidos políticos. “Nós celebramos as honrarias Nossa Senhora, Santa Efigênia, São Benedito e Nossa Senhora do Rosário. Somos um grupo de aproximadamente 50 pessoas que vão desde crianças de colo até a mais idosa, com 96 anos. Nosso objetivo é continuar lutando pela liberdade, seja ela qual for. Todos são bem-vindos”, explica Marli.
Virou filme
A história do congado em Ubá, que começou antes mesmo da emancipação do município, é tão importante que virou tema do documentário dirigido pelo historiador José do Carmo, com produção de Luiz Gonzaga Coutinho. O filme será lançado em 20 de novembro, quando se comemora no país o Dia da Consciência Negra.
Como um dos mais antigos da Zona da Mata, levando em conta que não foi interrompido nem nos períodos de muita perseguição política, o congado de Ubá é símbolo de uma história viva e vibrante. A realização do documentário, segundo o diretor, também é uma forma de levar a cultura afro-brasileira e a educação patrimonial para os ambientes universitários do continente africano, uma vez que, no Brasil, os congados tiveram forte influência do catolicismo.
“Alguns têm a manifestação das religiões de matriz africana, bem como da religião católica. É o que chamamos de sincretismo religioso”, conta José do Carmo, na expectativa do lançamento do filme que já recebeu convites para ser exibido em universidades da África e também da França.