Herói do Flamengo: Danilo saiu de Bicas e teve formação no Tupynambás antes de entrar na história rubro-negra

Irmão relata paixão do defensor pelo Mais Querido e ex-companheiro de time destaca determinação do atleta da Seleção


Por Mariana Souza*

01/12/2025 às 19h06

CAPA danilo bicas by reproducao instagram
Camisa 13 do Flamengo é de Bicas e começou carreia no Baeta, em Juiz de Fora (Foto: Reprodução/Instagram)

Em um jogo tenso e com clima de revanche, o Flamengo confirmou, no sábado (29), o quarto título da Copa Libertadores da América de sua história. O gol que decidiu a partida saiu aos 22 minutos do segundo tempo. Após cobrança de escanteio de Arrascaeta, o mineiro Danilo, nascido em Bicas, cidade a cerca de 40 quilômetros de Juiz de Fora, tornou-se um personagem incontornável da história rubro-negra ao apareceu livre na área e cabecear para marcar o gol histórico do tetracampeonato.

Filho de Maria José e José Luiz, irmão de Dener, Denilson e Douglas, o defensor passou a ser o único jogador a conquistar duas vezes a Libertadores e a Champions League. Vestindo a camisa do time de coração da família, o defensor ainda foi decisivo ao salvar finalização de Vitor Roque que empataria a partida nos minutos finais.

Antes de decidir o título pelo Flamengo e ter carreira vitoriosa na Europa, os primeiros passos foram em Bicas e em Juiz de Fora, onde motivou o retorno do Tupynambás ao futebol profissional. Foi com o dinheiro recebido por transferências do lateral ao futebol europeu, através do mecanismo de solidariedade da Fifa, que o Baeta reativou o time principal em 2016.

Do Baeta ao topo

WhatsApp Image 2025 12 01 at 13.39.36
Michel celebra sucesso de ex-companheiro e relembra momentos juntos. (Foto: Arquivo pessoal)

Com sonhos, uma chuteira e o apoio da família, Danilo chegou ao Baeta em 2004, onde teve a primeira oportunidade em Juiz de Fora após deixar a cidade-natal. Foi nesse período que o então jovem defensor conviveu e treinou com jogadores como Hudson e Michel Benhami.

Embora estivessem em categorias diferentes, os times dividiam treinos e momentos no clube, o que permitiu a Michel acompanhar de perto o desenvolvimento do hoje campeão da América. Segundo ele, o garoto de Bicas sempre teve um perfil tranquilo e reservado, mais contido no dia a dia.

O ex-companheiro recorda que o mineiro chamava atenção pela altura e pelo físico magro – “palitão”, como define -, com pernas compridas e corpo ainda em formação. Com o passar dos anos, o zagueiro foi ganhando força e massa muscular, mas sem perder o jeito tranquilo que já demonstrava desde menino.

Para Michel, o sucesso do amigo está longe de ser obra do acaso, e o gol do último sábado é resultado direto de muito trabalho. O ex-lateral admite que o que Danilo ultrapassou até o que ele próprio entendia como sucesso no futebol. Diz que, quando ainda jogava, também sonhava em ser profissional, viver do esporte, chegar a um grande clube e, quem sabe, à Seleção, mas via tudo isso como uma possibilidade distante, algo para o qual se trabalha, mas que se deixa acontecer. Hoje, resume que o amigo “merece muito” e que “é um baita jogador”.

Quando o garoto de Bicas ganhou o mapa-múndi

O Baeta foi a casa do jogador até 2007, quando, após um amistoso, ele conquistou uma vaga no time do América-MG, onde se profissionalizou. No clube de Belo Horizonte, estreou em 2009, durante o Campeonato Mineiro. Michel conta que estava na temporada que deu início à fase profissional do hoje campeão continental, mas jogando contra, pelo Tupi.

Apesar de não lembrar se do placar daquele embate, o ex-companheiro guarda com clareza a partida e a dificuldade de marcar o conterrâneo estando do lado adversário. “Eu lembro direitinho, foi na Arena Independência. Não era nem a Arena Independência nova, era a antiga. Ele jogando de lateral-direito e eu jogava de lateral-esquerdo, então, assim, foi um embate eu e ele no jogo.”

Michel afirma que, além da qualidade técnica, já era possível enxergar no garoto de Bicas um comportamento de liderança em campo, algo que, para ele, se confirma na trajetória atual do defensor. “Perfil mesmo de capitão, perfil mesmo de um líder. Tanto é que hoje é capitão da Seleção. Enfim, jogou só em time gigantesco. Eu consigo, no Danilo de hoje, vislumbrar aquele moleque lá atrás, começando os primeiros passos para ser um jogador de futebol profissional.”

No ano daquele encontro, o América-MG conquistou a Série C do Campeonato Brasileiro, título que marcou também a trajetória afetiva da família. O irmão Dener lembra com carinho o reencontro e o orgulho de ver Danilo pela primeira vez em campo como jogador profissional, em um estádio lotado e em decisão – cenário bem diferente dos jogos que, até então, acompanhava apenas pelo rádio. Ver o camisa 13 levantar a taça, conta, foi um daqueles momentos que ficam guardados.

A partir dali, a carreira ganhou velocidade. No Santos, o então lateral fez parte do elenco que, em 2011, conquistou o Campeonato Paulista e a Copa Libertadores. Logo depois, cruzou o Atlântico para defender o Porto, onde venceu o Campeonato Português em duas temporadas seguidas, 2011/12 e 2012/13. Daí, deu o salto para o Real Madrid, empilhando conquistas: duas Champions League (2015/16 e 2016/17), a Supercopa da Uefa de 2016, o Mundial de Clubes do mesmo ano e o título de La Liga em 2016/17.

Na Inglaterra, com a camisa do Manchester City, manteve o ritmo de taças e levantou, em 2017/18 e 2018/19, a Premier League e a Copa da Liga Inglesa. Depois, já na Itália, virou peça importante da Juventus, clube que defendeu entre 2019 e 2025, período em que somou um Campeonato Italiano (2019/20), duas Copas da Itália (2020/21 e 2023/24) e uma Supercopa Italiana (2020). Foi com esse currículo que o garoto de Bicas chegou ao Flamengo para, enfim, escrever o capítulo que teria a América como palco da consagração.

Pela Seleção Brasileira, o defensor foi chamado pela primeira vez em 2011, temporada em que ajudou o país a conquistar o título do Mundial Sub-20. No ciclo seguinte, integrou o elenco que levou a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012. Já com a camisa da equipe principal, esteve nos grupos que disputaram as Copas do Mundo de 2018, na Rússia, e de 2022, no Catar. Sob o comando de Carlo Ancelotti, acumula três convocações até aqui, e tem possibilidades de disputar mais um Mundial.

Obstinação vem de família 

Danilo com familia foto arquivo pessoal
Família de Danilo comemora gol e título do Flamengo, clube do coração (Foto: Arquivo pessoal)

Irmão mais novo, Dener conta que Danilo sempre fez jus ao papel. De maneira protetora e com apoio incondicional, diz que o zagueiro está presente mesmo à distância: “Eu consigo contar com ele, apesar da distância que se criou desde o momento em que ele foi buscar o sonho dele. Ele sempre se dispõe a ajudar, da forma dele, do jeito que ele vê o mundo. Tenta ensinar, tenta suportar tudo, como um irmão mais velho.”

Com esse perfil, Dener afirma que, mesmo diante das dificuldades, o camisa 13 evita expor problemas para não preocupar a família. “Danilo protege tanto que ele nem compartilha tanto as dores, para não nos afetar. Mas teve algumas lesões, na base do América e ao chegar no Porto, que eu enxergo como pontos grandes de dificuldade, mas que também serviram para mostrar a força dele.”

O caçula costuma dizer que os quatro irmãos são “farinha do mesmo saco”. Quem convive com a família, afirma, sabe que, apesar de terem seguido caminhos profissionais distintos, eles se parecem muito na personalidade. Entre as características em comum, destaca a teimosia, ou melhor, a obstinação: ninguém “larga o osso” com facilidade.

Dener brinca que se surpreende com o irmão o tempo todo e que não houve um momento específico em que tenha percebido Danilo “indo cada vez mais longe”. Conta que a família não costuma racionalizar até onde ele pode chegar, mas vive se impressionando com os novos passos. “O que acontece é que, sempre que a gente acha que ele chegou no limite, ele prega uma peça e mostra que é possível ir além”, resume.

Coroação de uma carreira vitoriosa 

De volta ao Brasil depois de mais de dez anos na Europa, o camisa 13 tinha um ponto de partida bem definido para o capítulo seguinte da carreira. O amor e a torcida pesaram na escolha do defensor, anunciado pelo Flamengo em 28 de janeiro. Pouco mais de dez meses depois, ele fecha o ciclo que o trouxe ao clube que sempre fez parte do imaginário da família.

Em casa, ninguém esconde o lado rubro-negro. Para Dener, vestir o manto em uma decisão continental dá ao título um significado especial justamente por essa ligação afetiva. Ele acredita que a conquista tem um gosto diferente por ser no time do coração do irmão e brinca que “jogar pelo time do coração, pelo visto, ajuda muito a marcar a história”.

Vocalista do grupo de pagode Curtaê, Dener viveu a decisão em dose dupla. Além da final em Lima, o fim de semana reservava um compromisso importante em Juiz de Fora: no domingo (30), ele precisava estar de volta a solo mineiro, no começo da tarde, para subir ao palco em um show que marcava os dois anos do projeto Lazer, tocado pelo grupo.

A logística apertada preocupou os colegas de banda e o próprio cantor. Ele admite que, em alguns momentos, teve certeza de que perderia os voos, mas insiste que não cogitou desistir. Correu por aeroportos, enfrentou trânsito e se virou no “portunhol” para garantir a volta. Os parceiros do Curtaê, conta, aguardavam apreensivos para saber se ele conseguiria chegar a tempo, justamente por se tratar de uma data simbólica. Dener diz que se colocou “100% à disposição para fazer dar certo” e que, após uma mudança de rota de última hora, conseguiu pousar em Minas, respirar fundo e seguir direto para o palco.

Em Lima, acompanhou o jogo ao lado da mãe e de um dos irmãos, em um setor do estádio, no lado oposto ao escanteio que originou o gol do Flamengo. O vocalista diz que tinha ouvido muita gente comentar sobre a estrela do irmão Danilo em decisões e até sobre a possibilidade de um gol do defensor, mas que nada o preparou para o que aconteceu.

Quando viu o camisa 13 subir para cabecear, admite que foi tomado por uma sensação difícil de descrever. “Não sei explicar, não estava esperando. Muita gente falou sobre ele fazer gol e sobre o tamanho da estrela dele para finais. Mas a gente nunca está realmente preparado. Foi incrível”, resume.

Para Dener, o que aconteceu em Lima vai além de um gol decisivo ou de mais um troféu na prateleira. “É a coroação de uma carreira que merece tudo que conquistou. Ele merecia essa parte: defender o clube do coração e ser feliz.”

Tópicos: flamengo

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.