Procura-se obstetra em JF
Atualizada às 16h10
Mesmo não sendo possível concluir que trata-se de retaliação à polêmica em torno da cobrança da taxa de disponibilidade obstétrica em Juiz de Fora, fato é que muitas mulheres que pretendem engravidar estão com dificuldade de encontrar obstetras, conveniados a planos de saúde, dispostos a acompanhar novas gestantes, desde o pré-natal ao parto, mesmo se tratando de pacientes antigas. A queixa, comum nas conversas entre amigos, ainda não foi formalizada em órgãos como Procon e Conselho Regional de Medicina (CRM), nem chegou a operadoras como o Plasc e a Unimed.
Isabela Rezende, 31 anos, está nesta lista. Em maio, ela realizou consulta de rotina com a ginecologista que a acompanha há 16 anos. A intenção era engravidar, e ela foi orientada pela profissional. Três meses depois, quando o resultado deu positivo, tentou marcar nova consulta e sequer foi atendida por ela. Por meio da secretária, a obstetra avisou que não realizaria mais partos. “Primeiro, foi um susto. Fiquei muito chateada e magoada.” Depois, Isabela começou a procurar outros médicos, conhecidos de parentes e amigos. Dos cinco que ligou, quatro afirmaram não realizar partos. Outro estava com a agenda lotada. Na sexta tentativa, conseguiu uma médica que só pretende acompanhar grávidas até abril. “O meu seria um dos últimos atendimentos.” Como justificativa para as negativas, a paciente ouviu queixas relacionadas à disponibilidade do profissional para a paciente durante a gestação, que vai muito além das nove consultas previstas no pré-natal.
Embora não esteja grávida, Clara Azevedo, 30, também ouviu de sua ginecologista reclamações sobre a falta de remuneração adequada para a chamada “disponibilidade obstétrica”, motivo pelo qual a profissional já avisou que não pretende realizar nem o pré-natal, nem o parto, quando Clara decidir ter um filho. A conversa aconteceu em uma consulta rotineira em abril, época em que ganhou corpo, em Juiz de Fora, a discussão a respeito da disponibilidade obstétrica. A taxa consiste na cobrança de valor adicional (além do já pago aos planos de saúde) para, durante o trabalho de parto, a paciente ter o acompanhamento presencial do mesmo profissional que fez o pré-natal. O custo mínimo que chegou a ser anunciado na cidade era de R$ 2 mil. A taxa foi considerada ilegal pelo Ministério Público Estadual (MPE) e abusiva pelos órgãos de defesa do consumidor. Para Clara, a situação é absurda, já que ela paga por plano de saúde com previsão de parto. Tanto a ginecologista dela, assim como todos os outros médicos procurados por Isabela, são classificados como obstetras pelas operadoras a que estão vinculados.
O superintendente do Procon, Nilson Ferreira Netto, comenta que ainda não recebeu reclamações neste sentido. Ele afirmou que, apesar da recomendação pela não cobrança da taxa, chegou a receber denúncia da manutenção da prática na cidade. A denunciante teria, no entanto, desistido da queixa por constrangimento, avalia ele. Nilson comenta que, há um tempo, percebe-se a preferência dos profissionais pela ginecologia ante a obstetrícia, principalmente pelos mais experientes e com maior clientela, em função dos imprevistos característicos do trabalho.
CRM defende direito de escolha e informação clara ao cliente
Na avaliação do delegado regional do Conselho Regional de Medicina (CRM), José Nalon de Queiroz, o médico não é obrigado a atuar na obstetrícia, mas é importante que deixe clara a escolha ao cliente, evitando constrangimentos caso a paciente tenha a pretensão de engravidar. Segundo Nalon, o órgão não recebeu denúncias que possam configurar recusa, no sentido de favorecer uma cobrança futura ou retaliação pelo não pagamento da taxa. Para o delegado regional, mediante a negativa por este atendimento a beneficiários de planos de saúde, a decisão deveria ser seguida também na esfera particular. Para ele, também seria importante suspender o credenciamento como obstetra junto às operadoras.
O presidente do Sindicato dos Médicos, Gilson Salomão, disse que não há fato configurado entre a recusa e a suspeita de retaliação e acrescentou que desconhece essa situação.
No entendimento da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais, o médico tem autonomia para decidir o tipo de atendimento que realizará, desde que não esteja em atendimento de urgência. O órgão defende, ainda, que o credenciamento em convênios ocorre na especialidade Ginecologia e Obstetrícia, “mas o profissional pode sim determinar o tipo de atendimento que irá prestar”.
Em busca de diálogo
Segundo o Plasc, a operadora segue os regulamentos da Agência Nacional de Saúde (ANS), que não permite a cobrança de procedimento com cobertura obrigatória, dentro do rol de procedimentos. “Portanto, não endossa o que esteja em desacordo a isso.” A assessoria informa, ainda, que o plano mantém constante diálogo com os prestadores de serviço, visando a melhoria da qualidade do atendimento ao beneficiário. O Plasc afirma que não tem conhecimento de ocorrências deste tipo. A Unimed, por meio de sua assessoria, garante que não tem queixa formalizada sobre o assunto e destaca que “sempre cumprirá as determinações da ANS, assegurando aos clientes assistência médica garantida, conforme previsto em contrato e nos padrões de qualidade defendidos pela operadora”.