‘Detalhes do cotidiano fazem a grandeza da vida’
A mineira Nara Vidal escreveu a série bilíngue “O curioso mundo de Amelie (Editora Faces)” inspirada na filha de 4 anos. O primeiro título foi concebido em 2012, o segundo veio pouco tempo depois, assim como o terceiro. Quando ela pegou gosto pelo mercado editorial, não parou mais. Conversou com o público adolescente em “Arco-Íris em preto e branco” e entregou às crianças aventuras, como “Pindorama de Sucupira”. No momento, ela se dedica às suas lembranças eternizadas na obra “Lugar comum” (Pasavento, 210 páginas). A publicação, que foi lançada na última edição da Feira do Livro de Poços de Caldas (Flipoços), é voltada para adultos. “Para mim, não houve essa transição do infantil para o adulto. Tudo é escrita. Dependendo da hora do meu dia, vou escrever textos que vão acabar saindo mais para um público ou para o outro.”
O livro reúne contos e crônicas que fazem referência às origens da própria autora, nossa vizinha Guarani, mas que pode ser o lugar comum de qualquer pessoa. “Muitos contos e crônicas surgiram de imagens. Se vejo algo que me emociona ou me toca por qualquer motivo que seja, escrevo. Quando refiro-me à imagem, não é necessariamente aquela congelada, estática”, comenta a autora, por telefone, de sua casa na Inglaterra.
Tribuna – “Lugar comum” é um retorno às suas próprias histórias?
Nara Vidal – Esse livro todo nasceu por conta de uma imagem, de uma fotografia de um conterrâneo meu que eu vi na internet. Ele acabou, por coincidência, sendo o fotógrafo da foto da capa do livro. Foi coincidência mesmo, porque eu nem imaginava que a minha cidade, Guarani, fosse ficar tão envolvida com o livro. Essa imagem é de uma estrada de barro indo para uma fazenda. Aquilo me deu uma saudade enorme porque, morando fora, qualquer coisa me remete a um passado, a uma lembrança. A partir daquela foto, fiz um conto e publiquei no Facebook. Quando vi, tinha muita gente curtindo, comentando e compartilhando, o que, de uma certa maneira, me motivou a escrever mais contos e crônicas. Aquele lugar comum, para mim, é muito especial, mas é comum para qualquer pessoa. Muita gente diz: “Parece que você está escrevendo sobre minha cidade.” Comento, no livro, sobre histórias de pessoas que têm vidas aparentemente banais e que, por conta disso, são muito especiais. São os detalhes do cotidiano que fazem a grandeza da vida. São textos que lidam com saudades e lembranças, mas que também remetem a um agora, ao que eu vivo na Inglaterra. Falo de viagens, do meu olhar em relação à outra cultura e meu estranhamento, algo que acontece muito ainda, mesmo depois de tanto tempo. É um lugar comum que se torna especial de acordo com o olhar da pessoa.
– Esses personagens e essa Guarani das suas lembranças ainda existem?
– Escrevi sobre um lugar que não existe mais. É um lugar que existe na minha lembrança. Não sei nem se ele existiu, porque são coisas muito embaralhadas. Quando eu comecei a falar que lançaria um livro que tinha contos e crônicas sobre minha cidade, muita gente pensou que eu fosse escrever um livro sobre Guarani. Na verdade, não é nada disso. É um livro que poderia ser lido e identificado por qualquer pessoa. O que escrevo ali são essas referências. Claro que, como escritor, você embaralha as coisas na ficção, você escreve mentira. Então, quero mais é provocar sensações nos leitores quando eles olham aqueles lugares que existem nas memórias embaralhadas. Eu também não sou mais aquela, meu olhar agora é completamente diferente. Sinto muita saudade de muita coisa, e tudo que ficou está guardado.
– Depois da série “O curioso mundo de Amelie”, você assinou um livro atrás do outro. Como isso foi acontecendo?
– Foi engraçado porque, depois da “Amelie”, uma série que não tem muito a ver com o que estou fazendo agora por ser mais paradidática, comecei a escrever mesmo livros de literatura. Teve um momento em que eu estava produzindo muito livro de literatura infantil, escrevendo muito, e vários desses projetos apresentei para as editoras. Eu bati na porta mesmo, da forma normal como todo mundo faz. Você manda e-mail, manda original, faz aquele trajeto todo quando não conhece ninguém. Tive a sorte de alguns apreciarem meu trabalho e tive propostas de publicação. Aí foi acontecendo.
– O que vem por aí?
– Tenho agora mais alguns livros para sair. Daqui a pouquinho, sai mais um infantil, que é um dos que mais gostei de escrever, e tem mais dois. Agora, o mercado brasileiro de livros está muito difícil. Vende pouco, tem sempre a competição com o estrangeiro, e temos os problemas das verbas governamentais que estão muito escassas. Isso atinge diretamente as editoras. Aos trancos e barrancos, a gente vai produzindo.