‘A gente faz com menos, mas não há ganhos’

Toninho Dutra suspende Bienal da Dança, que aconteceria esse ano, e espera melhoras só para 2017
Juiz de Fora tem alcançado um dia a dia cultural menos assustador do que eram as expectativas. Não houve colapso. Contudo, não há grandes festas, não há banquete. Na mesma medida da iniciativa privada, que encolheu sua atuação na cultura, o fazer público também está mais tímido. Com o computador ligado a sua frente e o livro “O direito de ler e escrever”, de Silvia Castrillón, ao lado de uma calculadora, o superintendente da Funalfa Toninho Dutra recebe a Tribuna em seu gabinete menos angustiado que em abril. Ainda que o “dia a dia” seja lema, certezas como a Lei Murilo Mendes (“Um desejo da comunidade atendido”, ele diz) – com um corte de 23%, bem menor do que os esperados 50% -, criam um clima mais otimista.
Culturalmente menos expressivo, sem a forte presença da UFJF, ainda em greve, o ano também, chegado o segundo semestre, começa a apontar para as expectativas de 2016. “Fazer com menos a gente faz, mas não há ganhos. Não se pode aspirar novas ações, pensar em uma divulgação mais robusta, levar uma segunda ou terceira apresentação do Festival Nacional de Teatro para os bairros, inovar. A cultura tem que possibilitar a transgressão, ir além, provocar discussões. Tem um papel a ser feito que vai além do simples realizar”, comenta Toninho.
Tribuna – Nos últimos meses, a grande discussão tem sido sobre o carnaval de 2016. Qual a posição da Funalfa hoje?
Toninho Dutra – O grande problema do carnaval hoje é que, independentemente do valor, a Liga (Liga Independente das Escolas de Samba de Juiz de Fora – Liesjuf) não tem condição de receber recursos da Prefeitura, porque ainda não prestou contas para a Funalfa. Eles tinham até 15 de maio, mas até hoje não fizeram isso. São três meses de atraso na prestação de contas. Já pedimos e, até, fizemos comunicação extra-judicial. Em relação à proposta que fizemos, a resposta que tenho da Liga, oficialmente, é: “Ou é a mesma verba recebida em 2015 ou não temos condição de desfilar”. Esse não é um corte para sempre. Porém, nesse cenário diferenciado, pensamos que precisamos ter, em 2016, um carnaval diferenciado. Fomos muito prudentes ao apresentar, em junho, uma proposta dessa natureza. Indicamos que eles não fizessem carta de crédito, o que é uma posição muito responsável. A Prefeitura não está blefando quando fala em fazer um carnaval com R$ 500 mil. Queremos manter esse carnaval vivo, principalmente no ano em que sabemos simbólico, por comemorar 50 anos dos desfiles oficiais das escolas de samba. Ninguém queria enfrentar essa crise, mas temos que enfrentar. Não adianta sinalizar diferente e, na última hora, dizer que está cancelado. Nessa sexta-feira, 14, expira o prazo para que as agremiações se manifestem dizendo quais vão desfilar. A partir daí, não teremos condição de fazer licitações para um novo modelo de avenida. A estrutura de montagem da Passarela que custa R$ 500 mil, precisa custar R$ 240 mil. Não é uma dificuldade só para as escolas, mas para todos.
– Essa vivência com orçamento apertado indica corte para 2016?
– Não houve conversa oficial nesse sentido. O cenário econômico indica dois anos difíceis, com um crescimento só para 2017.
– Ainda assim, você vê com otimismo 2015?
– Apesar das dificuldades, temos um ano positivo para a cultura da cidade. Ganhamos o CEU da Zona Norte, e reiniciamos as obras do Teatro Paschoal Carlos Magno. A empresa já assumiu, e a obra está a todo vapor. São duas conquistas emblemáticas. Nesse cenário de crise, é quase um milagre fazer isso hoje no país.
– A agenda de eventos sofrerá algum impacto?
– Esse ano conseguimos manter a Lei Murilo Mendes, com um orçamento de R$ 850 mil, e já realizamos o Arraiá da Cidade, o Corredor Cultural e estamos na produção do Festival Nacional de Teatro. Quanto à Bienal da Dança, optamos, junto à comissão, por adiar esse sonho. Iremos fazer, na primeira semana de outubro, um movimento da dança, que será uma preparação para a bienal. O Foto 15 só acontece porque conseguimos realizar com o dinheiro que viabilizamos e porque estabelecemos uma grande parceria com a classe artística.
– O Festival Nacional de Teatro também viverá esse contingenciamento?
– Não teremos espetáculos convidados, apenas os inscritos na mostra, mas não haverá queda no número de peças. Tivemos um recorde de inscrições e teremos cerca de 26 apresentações, de 19 espetáculos. Teremos, também, espetáculos que estão em circulação no país (por estarem contemplados em alguma lei de incentivo). Fizemos um acordo com a UFJF de levar alguns espetáculos para o Pró-Música. Se não fosse assim, teríamos um público muito acanhado, usando só o Diversão & Arte, que temos convênio, e o CCBM, que tem lotação de 160 pessoas. Ainda, durante o festival colocaremos em funcionamento o teatro do CEU da Zona Norte, que, sem dúvida, é o melhor pequeno teatro de Juiz de Fora, com 40 refletores, som de qualidade, ar-condicionado e cadeiras estofadas. A biblioteca também passará a funcionar na primeira semana de setembro.
– E qual é seu balanço do CEU da Zona Norte, inaugurado em março?
– Altamente favorável. O CEU é muito bem avaliado pelo Governo federal e pela população. Temos cinco meses de funcionamento e não há um rabisco na parede, nenhuma pichação ou depredação. Na terça, 11, fizemos a eleição do conselho gestor, o que é uma orientação do Ministério da Cultura, e levamos 110 pessoas. A Imbel doou, na semana passada, uma mesa de pingue-pongue, que é uma das coisas que mais funciona lá, com cerca de 120 participantes diários, com fila. O vereador Cido doou uma academia de ginástica ligada às atividades da terceira idade. A escola do lado será reformada, e a diretora ofereceu o parque para ser reparado e colocado no CEU. A praça virou um símbolo de pertencimento no sentido exato da vivência. Ter um local com aquela qualidade, tanto na vertente da expressão quanto da fruição, é caro, mas é um modelo interessante.
– Em 2013 foi anunciada a revitalização e pintura da fachada do prédio da Funalfa, que apontaria para um plano de exemplo de preservação por parte da Prefeitura. Assim como com esse prédio, a fachada do Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM) também se encontra bastante deteriorada. Existe algum planejamento para essas preservações?
– Em relação ao prédio da Funalfa, houve um processo licitatório frustrado. No último dia 13 de julho, encaminhamos um novo processo, com novos orçamentos, e esperamos, ainda nesse ano, fazer a pintura. Já o prédio do CCBM depende de captação de recursos. Fizemos um projeto agora, para o Fundo Difuso, e aguardamos êxito. O prédio exige uma recuperação mais complexa, porque é maior o número de fachadas, e precisam de uma tinta diferenciada. Internamente, o CCBM está muito bem cuidado.