‘Freshwater’, única peça teatral de Virginia Woolf, ganha edição brasileira

Com tradução de Nara Vidal, obra apresenta evolução do texto e escrita debochada da escritora inglesa


Por Elisabetta Mazocoli

13/07/2025 às 07h00

A escritora Virginia Woolf é uma das mais importantes da literatura inglesa, e a influência de obras como “Mrs. Dalloway “, “Orlando” e “Um teto todo seu” ultrapassa, em muito, as fronteiras usuais da língua e até a histórica falta de protagonismo de mulheres escritoras. É por sua genialidade e pioneirismo que a autora costuma a ser lembrada, mas não só: Woolf, frequentemente, é associada também à depressão, que faria com que cometesse suicídio, e a uma escrita que tem o drama como cerne.

Considerando esse contexto, é notável que a autora que aparece em “Freshwater” constitui uma versão muito diferente dessa mesma escritora – trata-se, ainda, da única peça teatral escrita por ela, e foi lançada no Brasil pela Degustadora Editora através do selo Inglesa. Para quem é fascinado pela escrita de Woolf e quer conhecer mais sobre seu processo criativo, é uma leitura imperdível.

Isso porque, na edição da Inglesa, é possível ver as alterações feitas na peça ao longo do tempo até chegar à versão final. Ver o que se manteve e as escolhas cheias de nuance em cada frase permitem um vislumbre muito interessante sobre essa obra, em especial da autora, que tem versões datadas de 1923 e 1935. Além disso, a peça conta com um ar especialmente leve e debochado vindo de Woolf e, justamente por mostrar essa outra faceta, foi escolhida para publicação pela mineira, escritora e curadora da editora, Nara Vidal, que ainda é a responsável pela tradução da obra.

A narrativa se volta para os intelectuais boêmios do período modernista que interagem em Freshwater, uma vila na Ilha de Wight. A autora usa personagens reais para criar, a partir da perspectiva da fotógrafa (e sua tia-avó) Julia Margaret Cameron, a atriz Ellen Terry, o poeta Alfred Tennyson e o pintor George Watts. Temas como amor, paixão pela criação e diferenças geracionais passam a ser tensionados a partir do diálogo entre eles e da postura que tomam um em relação ao outro. A ironia construída pela autora se volta principalmente para a rigidez moral e os costumes da época vitoriana.

Os debates em relação às questões de gênero e ao casamento, que aparecem tantas vezes na obra de Woolf, surgem aqui mais como desentendimento e causam riso. Isso mostra a destreza da autora em trabalhar, em diferentes formatos e perspectivas, com os temas que lhe interessam. E também há, nesse sentido, um olhar bastante original: é uma mulher, em seu próprio tempo, que percebe que há ali algo de muito antiquado e conservador — e que seguiria fazendo sentido e sendo uma crítica pertinente ao longo dos próximos anos ou décadas.

 

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