Cerâmica Guairá faz peças inspiradas em arte rupestre e gera renda para famílias

Projeto coordenado pela juiz-forana Raquel de Oliveira e parte da Fundação Guairá conecta passado e futuro da região


Por Elisabetta Mazocoli

05/11/2025 às 06h00

Cerâmica Guairá
Cerâmica Guairá reúne alunos para aprender técnica e vender peças (Foto: Bruno Figueiredo)

O projeto Cerâmica Guairá surgiu com um objetivo: desenvolver uma arte que tinha raízes antigas na região de Andrelândia, mas que estavam há muito esquecidas a nível local. Por mais que a cidade na Serra da Mantiqueira tenha uma tradição de arte rupestre, inclusive com pinturas nas paredes do Parque Arqueológico Serra de Santo Antônio e peças utilitárias pré-descobrimento encontradas perdidas em diversas fazendas da região, essa foi uma técnica que, com o tempo, deixou de fazer parte da vida familiar da região. Até que, há três anos, foi retomada de maneira intencional, com objetivo de também gerar renda para a comunidade andrelandense. Além das tradicionais canecas e pratos, o projeto, que conta com cerca de 20 alunos, investe em peças de arte que reproduzem essa estética, e servem como uma lembrança de viagem que conecta o passado e o futuro da região.

Cerâmica Guairá
Juiz-forana Raquel de Oliveira coordena projeto há 3 anos (Foto: Bruno Figueiredo)

Com coordenação da juiz-forana Raquel de Oliveira, e servindo como parte dos projetos Fundação Guairá, a iniciativa teve começo quando ela resolveu se inspirar no projeto a Serra da Capivara, no Piauí, que também tem um histórico de aliar essa produção rupestre com um projeto artesanal novo. Mas em Andrelândia o projeto precisou pegar o próprio ritmo: “Encontrei aqui uma realidade totalmente diferente, porque a população tinha uma relação mais distante, não via esse pertencimento da serra. Então primeiro fiz uma exposição com ceramistas da região, e teve uma aceitação muito boa das pessoas, e achei que valia tentar”, conta ela, que hoje já está há 3 anos à frente da iniciativa, que recebe alunos de 8 a 80 anos.

O curso de cerâmica funciona com alunas pagantes e bolsistas, que aprendem a técnica e ajudam a ensiná-la. As peças vendidas, por sua vez, têm parte do valor convertido para a renda das participantes. Para Raquel, foi interessante ver a facilidade com a qual a população pegou o gosto pelas peças, porque era uma tradição que estava “pausada” desde os antigos, sem outro ateliê que mantivesse produtividade ou aulas nesse ritmo na cidade. “Fazemos cerâmica para todo gosto. Os utilitários, por exemplo, tem uma saída boa. Mas tem gente que gosta de fazer peças mais artísticas, como esculturas, por exemplo”, explica Raquel. 

Logo que o projeto começou, no casarão que fica no centro da cidade e data de 1835, as primeiras bolsistas ficaram dois anos aprendendo cerâmica, até dominarem a técnica. Mas agora, elas mesmas já são professoras, e recebem convidados de outras cidades para oficinas específicas. Em uma dessas palestras recentes, a também juiz-forana Adriana Lopes esteve por lá. Atualmente, essas peças produzidas pelo projeto ficam expostas no Arte Café, que serve quitutes de Minas Gerais, e contam com exposições especiais durante a Semana Santa, além de serem vendidas nas redes sociais.

 

 ‘Descobri um outro universo’

Cerâmica Guairá
Dayana Moura é uma das alunas bolsistas do projeto (Foto: Bruno Figueiredo)

 

Para a população local, o começo do projeto também foi um renascimento, com efeitos que ainda reverberam. É o caso de Dayana Moura, de 28 anos, que chegou no curso por acaso, há cerca de dois meses. Ela já tinha tido experiência com biscuit, em casa, só vendo vídeos pela internet, e procurou a fundação por ter se interessado por um curso de bordado — que, no entanto, já tinha encerrado as inscrições. Chegando lá, contaram sobre a possibilidade de aprender cerâmica como bolsista, e ela logo se interessou. “Estava muito ansiosa. Tenho problema de pressão alta e pré-diabetes, e precisava encontrar uma coisa pra minha vida, que não fosse só ser dona de casa e cuidar do meu filho”, conta. A mudança, para ela, desde que começou a participar, foi no ganho de autonomia e bem-estar, coisas que a cerâmica ajudou muitas mulheres a ter. 

Também esse é o caso de Ana Paula Pereira, que começou no projeto em 2022 e, hoje, é uma das professoras do Cerâmica Guairá. “Vi na cerâmica a possibilidade de abranger meu conhecimento e aprender uma nova arte. Comecei e me encantei”, explica ela. Depois de dois anos se aprofundando nas técnicas, hoje essa é sua principal ocupação e de onde vem a sua renda. Além disso, virou uma paixão, que não imagina mais deixar de lado: “Descobri um outro universo. A parte terapêutica faz muito bem para todos nós que estamos envolvidos. Cria um ambiente familiar em que todos interagem”.

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