Percepções de um universo em expansão

Paula Duarte mostra no CCBM série iniciada em 2012
De todas as fases pelas quais passamos na vida, a infância é marcante por ser o momento em que começamos a ter consciência das coisas que nos rodeiam e, ao mesmo tempo, dividimos o nosso tempo com o lúdico, a brincadeira, a fantasia, passamos a entender o conceito de comunidade e respeito ao outro, o companheirismo, a amizade, e ainda aprendemos a ver a alegria nas pequenas coisas – coisa, aliás, que muitas vezes perdemos na adolescência e, principalmente, na fase adulta. Muitos desses momentos podem ser vistos na individual “A primeira vez que entendi do mundo”, da fotógrafa juiz-forana Paula Duarte, que faz parte do JF Foto 15, que segue no CCBM até a próxima segunda-feira.
Para quem for conferir a exposição, o trabalho de Paula se concentra essencialmente em dois aspectos: captar o gesto e o céu, o que pode ser percebido pela profusão de azul nas fotografias. Assim, é possível admirar uma pipa solitária no espaço, crianças brincando num pátio, bolas de gude espalhadas pelo chão, o bailar de uma dama de honra e a alegria incontida de uma criança durante um banho de mangueira. Todas as fotos, sempre, sem mostrar os rostos dos pequenos, justamente para priorizar a ação de cada instante. “Esse trabalho, em parte, é diferente do que costumo fazer profissionalmente ou na minha produção autoral, mas vi que dialoga muito com o público. Coloquei muito afeto nele”, diz Paula, admiradora do movimento contemporâneo de fotografia e que participou este ano como convidada do JF Foto 15 e, em 2014, foi uma das selecionadas pelo III Prêmio Funalfa de Fotografia.
De acordo com Paula Duarte, a série já existia antes mesmo do convite da Funalfa e surgiu intuitivamente em 2012, ao fotografar crianças correndo em uma oficina de teatro em São João da Ponte, no Norte de Minas. Com a ideia do projeto na cabeça, seguiram-se outras fotos captadas nos últimos anos em lugares diversos, como em Dores do Paraibuna (distrito de Santos Dumont), num casamento em Juiz de Fora, pássaros voando sobre o Museu Mariano Procópio, bolas de gude da sobrinha espalhadas pelo quintal da sua casa, bandeirinhas ao vento na cidade de Cairu (BA), pipas no céu, pipas que foram distribuídas em uma festa de aniversário em Barão do Monte Alto (MG). “Gosto muito de pipas, mesmo não sabendo soltar, e achei muito simbólico em relação ao projeto, que tem o vento refletindo a leveza das fotos”, explica.
Participação do público
Paula, que recebeu a Tribuna na última terça-feira no local da exposição, teve que interromper a entrevista para conversar com os alunos da Escola Estadual Almirante sobre o trabalho e a concepção das fotos – a exposição, inclusive, tem como outro atrativo a interatividade: a parede em que as fotografias estão expostas foi liberada para que o público deixasse sua marca, fosse com frases, desenhos, assinaturas… e até mesmo números do aplicativo WhatsApp. Houve até quem interagisse diretamente com as fotos, acrescentando detalhes em suas bordas. Entre as frases, é possível encontrar de tudo um pouco: “animais são vida, não são comida”; ouçam Lana Del Rey”; “consideramos justa toda forma de amor”; “o Max é gato”; “tenho duas mãos e a vontade do mundo”; “Laura e Vitor – amor eterno”.
“A interatividade não é obrigatória, mas é bom ver o público participando”, comemora Paula. Um dos momentos mais tocantes para a artista foi acompanhar a visita de uma deficiente visual – para quem foram descritas as fotos -, que deixou registrada na parede sua assinatura. “Mesmo que nunca tenha enxergado, ela lembrou de quando soltava pipa, pegava cigarras, foi o vento despertando suas memórias.” O mural de assinaturas, desenhos e recados, porém, será pintado ao final da exposição. “O que ficará são as fotos, para lembrar que a arte também é efêmera”, filosofa.
Ainda sem data certa, as fotos de “A primeira vez que entendi do mundo” serão expostas no Centro Educativo Santa Lúcia, destinado a menores infratores, dentro da contrapartida social existente no edital do JF Foto 15. A arte, além de emocionar, pode ser mais um passo para a cidadania.
“A PRIMEIRA VEZ QUE ENTENDI DO MUNDO”
Hoje e amanhã, das 10h às 18h
Centro Cultural Bernardo Mascarenhas
(Av. Getúlio Vargas 200 – Centro)