Batucada de bamba
Se o miraiense Ataulfo Alves versa, em "Na cadência de samba", sobre seu desejo de morrer em uma "batucada de bamba", seria pouco provável que, caso fosse vivo, seu coração de músico resistisse aos festejos de homenagem ao Dia Nacional do Samba em Juiz de Fora. A data é celebrada amanhã, mas as comemorações terão início hoje, reunindo grandes expoentes locais da velha guarda e da atualidade. No Quintal Bar, Salim e o grupo Tudo em Casa animarão a tarde com o convidado Roger Resende, que, por sua vez, trará outros nomes para a roda, parte do projeto "Quintal do samba". "A ideia é agregar, juntar as pessoas, algo que está na essência do próprio samba. Teremos uma banda de base e queremos que os músicos presentes venham tocar com a gente se quiserem", adianta Salim. Na abertura, nos fechamentos e intervalos, o DJ Bruno Tuler fará discotecagem em vinil, tocando exclusivamente o ritmo homenageado.
Amanhã, a festa continua no Cultural, que vai promover um encontro inédito de várias gerações de sambistas da cidade, trazendo Mamão, Roger Resende, Carlos Fernando Cunha, Sandra Portella, Mamão, Nascimento, Coração, Flavinho da Juventude e Zezé do Pandeiro. A reunião é uma parceria da Funalfa com a casa de shows e faz parte do projeto "Ponto do samba", que está em sua terceira edição. "Desde o início, queríamos fechar o ano com grandes nomes do samba no cenário local, e a data é muito oportuna para que a comemoração passe a integrar o calendário da cidade", diz Roger Resende, um dos idealizadores da iniciativa. "É a primeira vez que se faz uma comemoração desse porte, e já era hora de Juiz de Fora festejar esse dia, porque a cidade tem uma relação muito forte com o samba", acrescenta Sandra Portella.
Para Roger, reunir os músicos das antigas com os da atualidade é essencial para que o gênero se mantenha vivo. "Para sabermos para onde vamos, é preciso saber de onde viemos. Então, no samba, é preciso compreender o que já foi e está sendo feito para que se possa continuar produzindo com qualidade." Representando a ala com mais anos de batuque, Zezé do Pandeiro também comemorou o encontro de gerações. "Sempre aprendo muito com o pessoal novo, e acho que eles também têm muito a aprender com a gente. É uma pena só que a cidade não tenha uma tradição de honrar a velha guarda, como a gente vê nas grandes escolas do Rio."
No repertório dos dois eventos, a prioridade será enaltecer os compositores da cidade, ainda que célebres bambas do cenário nacional sejam lembrados. "Como eu, os músicos vão apresentar canções próprias, e reverenciar grandes nomes locais como Ministrinho, Geraldo Santana, o próprio Mamão que vai estar conosco, entre tantos outros", anuncia Carlos Fernando Cunha. Segundo a secretária da Lei Murilo Mendes, Fernanda Amaral, o objetivo da Funalfa ao apoiar o evento é justamente valorizar a produção local. "Temos feito um esforço grande para abraçar os trabalhos autorais e já fizemos eventos em homenagem a Sueli Costa e Arnaldo Baptista, por exemplo. Muitos artistas que vão participar destes tributos ao samba também gravaram seus álbuns com apoio da Lei Murilo Mendes."
No Cultural, a festividade vai além da cadência dos instrumentos e tem caráter beneficente. Parte da renda arrecadada na bilheteria será destinada à realização de uma ceia de Natal para a população de rua. Além disso, a ONG Reconstruir, que constrói e reforma casas de famílias carentes, assumirá a cozinha do evento, e o dinheiro da venda dos pratos será aplicado em projetos da instituição. "Vamos fazer comidas típicas de boteco, porque tem tudo a ver com o espírito do samba", adianta um dos diretores da organização, Fernando Seixas.
Para Mamão, que pode ter sua canção "Tristeza, pé no chão" imortalizada por um projeto de lei que visa a transformá-la em patrimônio imaterial de Juiz de Fora, o samba precisa estar na boca do povo para estar vivo. "Fico muito feliz com a homenagem, porque fortalece a memória cultural da cidade. Mas fico mais honrado ainda ao ver as pessoas cantando minha música por tantas gerações." Muitos sambistas se queixam da falta de oportunidades para "viver o samba" a que Mamão se refere. "As escolas tinham que abrir mais as portas fora do carnaval, fazer eventos para integrar a comunidade, para as quadras voltarem a pulsar", opina Coração. "Fala-se muito em verba, em investimento, mas é preciso levar as pessoas para as quadras durante o ano, investir nas escolas mirins, incentivar o amor pela escola nas comunidades. É isso que faz o carnaval, é isso que faz o povo sambar", arremata Zezé do Pandeiro.
Pelo menos na noite de hoje, e marcando também as festas em homenagem ao ritmo tipicamente brasileiro, essa realidade será diferente. A partir das 22h, os tambores e tamborins vão rufar na quadra da Real Grandeza, com o lançamento do CD de sambas-enredo do carnaval 2013. O batuque fica por conta da bateria das agremiações Real Grandeza, Rivais da Primavera, Unidos do Ladeira e Turunas do Riachuelo, além da banda Samba Soul. As candidatas a rainha do carnaval também serão apresentadas. "Quisemos fazer com antecedência para as pessoas já irem conhecendo os enredos, integrando-se com as escolas. A liga tem batalhado para que a programação das escolas não gire apenas em torno dos desfiles, mas que faça parte do cotidiano das comunidades", Fernando Luiz Baldioti, o Baleia, diretor de comunicação da Liga das Escolas de Samba de Juiz de Fora.
QUINTAL DO SAMBA
Hoje, às 13h
Quintal Bar
Rua Dr. João Pinheiro 525
LANÇAMENTO DO CD DE SAMBAS-ENREDO
Hoje, às 22h
Quadra da Real Grandeza
Avenida Brasil 1.220