Metade das pessoas que aderem a tratamento oferecido pelo Município para de fumar em JF
No Dia do Combate ao Fumo, Tribuna conta histórias de juiz-foranos que venceram o vício e fala sobre o trabalho desenvolvido pelo serviço municipal de controle do tabagismo e pelo HU
“Pare enquanto é tempo, porque o cigarro é só malefício para saúde. Cigarro não faz nada de bem. Cigarro mata”, alerta Marisa Aparecida de Oliveira, 61 anos, participante dos encontros do Serviço de Controle, Prevenção e Tratamento do Tabagismo (Secoptt), da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF). Ela é uma das pessoas que aderiram a serviços gratuitos para realizar o tratamento do tabagismo na cidade. Nesta quarta-feira, 31 de maio, é celebrado o Dia do Combate ao Fumo, que visa promover medidas de prevenção ao tabagismo e conscientização sobre os riscos associados ao consumo do tabaco. Quem quer se livrar do vício pode se direcionar à Unidade Básica de Saúde (UBSs) do próprio bairro ou ir diretamente à sede do serviço municipal de controle do tabagismo, no PAM Marechal, 1º andar, sala 103, das 7h às 11h e do meio-dia às 16h.
Os motivos para uma pessoa decidir parar de fumar podem ser diversos, incluindo questões familiares e monetárias, mas geralmente é a saúde que determina o pedido de ajuda. Marisa Oliveira conta que, inicialmente, queria parar de fumar por conta de seu filho e decidiu realizar o tratamento. Porém, seu motivo mudou com o tempo. Ela desenvolveu doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). “Sempre que eu tentei parar por causa do meu filho, eu nunca consegui. A partir do momento que eu admiti que eu tenho que parar de fumar, por causa da minha saúde, percebi que eu necessito de ajuda, porque sozinha eu não posso”, relata Marisa, evidenciando ainda que, mesmo com poucos dias sem fumar, já não está sentindo tanta falta do cigarro. “Um dia de cada vez, eu estou parando agora por mim, por mais ninguém”, finaliza.
O tratamento no Secoptt é realizado em grupo e, se necessário, é feito o apoio medicamentoso. “São seis meses de tratamento”, detalha a assistente social da PJF Alessandra Reis. Ela informa, ainda, que no primeiro mês os participantes são preparados, por quatro sessões, para marcar uma data e parar de fumar, passando informações como o motivo de fumarem, efeitos da abstinência, estratégias, alimentação e benefícios. Na quinta sessão do tratamento o foco é na prevenção de recaídas.
Pandemia não diminuiu efetividade do tratamento
De acordo com Alessandra Reis, durante a pandemia a porcentagem das pessoas que procuraram o tratamento e conseguiram parar de fumar se manteve estável em 50% em Juiz de Fora. O dado surpreendeu positivamente os servidores, pois tiveram o receio de que, com a pandemia, as pessoas poderiam abandonar o tratamento por vários motivos. Para a assistente social, o fato de as pessoas estarem em casa e longe de gatilhos, como bares e encontros de amigos, pode ter sido um ponto que ajudou muitas pessoas no processo de parar de fumar.
Além disso, ela observa que há uma maior procura de pessoas mais jovens pelo tratamento para o tabagismo. Conforme Alessandra, de 2021 para 2023 houve um aumento na procura do serviço por parte de pessoas com idade entre 30 e 40 anos, quando antigamente era mais comum o interesse de pessoas com mais de 50 anos. Contudo, ela não atribui à pandemia tal caso em específico, especulando que a situação pode se dever ao aumento da conscientização geral e à busca pela melhora da saúde.
Outra participante do tratamento em grupo da Secoptt, que preferiu não se identificar, conta que, após ter ficado cinco anos sem fumar, voltou ao vício, por conta de um diagnóstico de esclerose múltipla, em 2020. “Estava tudo uma loucura, eu não dei conta de lidar com isso sozinha”, revela. Em fevereiro deste ano, a paciente decidiu parar de fumar por conta de sua saúde. “Eu percebi que eu não quero nada na minha vida que me machuque, até mesmo se for eu”, conta a paciente, que diz ter banido o cigarro como parte de uma mudança mais ampla em seu modo de vida, em busca de uma saúde melhor. “Eu já estou há 16 dias e 17 horas sem fumar e já economizei em torno de 160 cigarros. E R$ 142 em dinheiro!”, comemora.
Doenças atreladas ao tabagismo
Para além da dificuldade respiratória, o tabagismo está comprovadamente atrelado a mais de 50 doenças, sobretudo as cardiovasculares, o câncer, a DPOC, a doença cerebrovascular e a doença arterial periférica, como explica a médica pneumologista Marina Guedes. “Na mulher, o hábito de fumar pode causar infertilidade, complicações gestacionais e interferir na saúde do bebê e da criança que foi exposta, seja durante a gravidez, na amamentação ou após o nascimento”, elenca a médica.
Vale ressaltar que não somente quem fuma é afetado pelo cigarro, mas a sua família também. “Quem fica exposto à fumaça, considerado tabagista passivo, também tem risco de desenvolver doenças relacionadas ao tabaco”, conta a pneumologista. Parar de fumar proporciona diversos benefícios, nos âmbitos social, financeiro e da saúde, entre outros, mas pode ser preciso que a decisão seja orientada por um profissional da saúde, por conta dos efeitos da abstinência, que, segundo Marina, podem incluir os sintomas de irritabilidade, agitação, insônia, tremores, estresse, dentre outros. “Quem deseja parar de fumar deve procurar um profissional de saúde para que seja orientado em relação ao tratamento mais adequado para a sua condição”, sinaliza a médica.
O Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU-UFJF) também atende pacientes direcionados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que buscam o tratamento contra o cigarro, além de realizar o acompanhamento de todo paciente fumante hospitalizado, para promover a cessação do tabagismo. Segundo a médica pneumologista e professora da Faculdade de Medicina da Lígia Amaral, no local também são desenvolvidos projetos de extensão voltados tanto para a prevenção, quanto para o tratamento de pacientes tabagistas.
Caminhando contra o vício
“A nicotina causa dependência química. Fumar é considerado uma doença e está classificada no grupo de doenças relacionadas a transtornos mentais e de comportamento”, esclarece a médica pneumologista Marina Guedes. Ela aponta que alguns dos motivos que levam o indivíduo a começar a fumar podem abordar a necessidade de aceitação em determinado grupo social, alívio de estresse, recreação e fácil acesso ao cigarro.
A questão social foi preponderante no caso do jornalista Fabiano Moreira, 48 anos. “Eu tive contato com o cigarro precocemente, comecei a fumar com meus 16, 17 anos, na escola, por conta de meninas que já fumavam”, revela. Já adulto e após uma mudança de vida, Fabiano decidiu parar de fumar por uma questão monetária, já que comprava em grandes quantidades e o dinheiro começou a fazer falta. “Eu estava comprando de quatro em quatro pacotes de cigarro, cada um com dez maços, e quando eu abria o último eu me desesperava, porque precisava comprar mais”, conta.
O seu processo inicial para parar de fumar foi a redução gradual. Falava que iria fumar outro cigarro só duas horas depois, mas após cinco minutos de ter fumado o último, já estava com uma grande vontade novamente. “Foi nesse processo que eu vi o quanto eu era escravo do cigarro, que não estava no comando, que ele dizia quando eu comprava e fumava”, diz o jornalista.
Ajuda externa
Aquele foi o momento em que Fabiano percebeu que o processo que visava diminuir o consumo de cigarro estava tendo o resultado contrário, o que o motivou a procurar o tratamento oferecido pela Prefeitura. O jornalista relata que a experiência foi ótima e que o tratamento em grupo, por ver que existiam pessoas com problemas piores para além de parar de fumar, de certa forma o motivou a persistir. Fabiano fez o acompanhamento medicamentoso e também a caminhada como exercício, uma das recomendações médicas para melhorar a respiração do paciente.
Em suas caminhadas, ele começou a fotografar e postar nas redes sociais, começando a realizar conjuntos de imagens por temas e bairros, andando por mais de uma hora e meia, diariamente. Tendo já caminhado por boa parte de Juiz de Fora, Fabiano decidiu então produzir o livro “Vai, caminhante”, com algumas das mais de sete mil fotos de seu acervo. “Quando você para de fumar, você experimenta a verdadeira liberdade”, finaliza o jornalista.