Quebrando paradigmas


Por Renan Ribeiro 

30/03/2017 às 08h27- Atualizada 30/03/2017 às 09h23

Tatiana
A professora de Boxe Tatiana Gama Leão combate o machismo com o bom humor (Foto: Fernando Priamo)

Na academia de boxe, um grupo se reúne em torno do saco de pancadas para o desafio de fazer um abdominal no qual o peso do corpo é sustentado apenas pelas pernas. Vários alunos tentam, uns caem, outros conseguem realizá-lo até duas vezes, desistindo em seguida. Do grupo, faz parte a professora de boxe Tatiana Gama. Antes que ela inicie os exercícios, há olhares de desconfiança, mas ela não só completa a sequência, como faz o exercício parecer fácil.

Mostrar que as mulheres, como Tatiana, são capazes em condições de igualdade com os homens. Essa é a ideia do projeto Mulher é Poder do Programa Bem Comum da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) que, ao longo do mês, contou histórias de mulheres que se destacam nos segmentos que ocupam. “Não existe um posto de trabalho que seja feito apenas para a mulher e outro que seja apenas para o homem, especificamente. Existem pessoas, e o que vale é a capacidade e a competência delas no desempenho de cada atividade”, pontua a chefe do Departamento de Marketing da Prefeitura, Sabrina Santos. Ela acrescenta que, embora estejamos em 2017, o sentimento de imposição de alguns papéis persiste. “Esse sentimento não deveria mais ser real, mas ainda representa um desafio muito grande. Por isso mulher é poder. Se ela tem um sonho, vai em direção a ele e muda não só a realidade dela, mas também de quem está por perto.” A campanha apresenta a rotina das trabalhadoras em vídeos divulgados na página da iniciativa no Facebook: Bem Comum JF.

Com os exemplos de mulheres que desafiam o senso comum, assumindo papéis que antes não eram acessíveis, Sabrina Santos explica que o preconceito é combatido. “O paradigma existe para ser quebrado, de um jeito que nós mulheres fazemos muito bem: com dedicação, esforço e capacidade, mas também com gentileza, delicadeza.” Quando exposta a alguma situação de machismo, a professora Tatiana Gama usa o humor. Durante um treino de ‘sparring’, ou contato direto, por exemplo, quando é demandado que ela faça o exercício com um homem, ela não se intimida com a pergunta: ‘mas vou fazer com uma mulher?’ “Eu acho graça, porque demonstra uma falta de conhecimento muito grande. Muita gente ainda pensa que mulher só faz luta pela perda calórica, não entende que possamos querer aprender as técnicas ou lutar. Só fico com raiva quando o machismo ultrapassa esse ponto. Se o rapaz se negar a fazer o exercício comigo,por eu ser mulher, por exemplo.” Além de Tatiana e Rosália, outras mulheres também tiveram sua rotinas de trabalho acompanhadas pela iniciativa.

‘Ainda somos minoria’

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Há cerca de um ano, Rosália Aparecida se tornou motorista de ônibus e almeja chegar a dirigir carretas (Foto: Gil Veloso)

Motorista da linha 107 do Bairro Vila Montanhesa, Zona Nordeste, há aproximadamente um ano, Rosália Aparecida, outra personagem do projeto, comenta que as pessoas ainda se surpreendem ao vê-la conduzir. “Elas não estão acostumadas. Ainda somos minoria nessa profissão. Que eu saiba, só temos quatro mulheres dirigindo coletivos urbanos. Mas eu gosto da surpresa das pessoas. Quando é um olhar de admiração, eu não ligo. Só não aceito que batam de frente comigo com machismo.” Ela conta com o reforço da cobradora Adriana, que sempre age imediatamente diante de situações de desrespeito ou questionamento da capacidade da motorista. “Estamos preparadas para desarmar esse machismo!”, enfatiza.

Rosália Aparecida conta que as meninas e os idosos se identificam e demonstram se sentir mais seguros quando a encontram pelo caminho. Os mais velhos, segundo ela, costumam demandar uma atenção e cuidado maior, que muitos motoristas, pressionados pelo tempo, deixam para trás. “O tempo é corrido e custa muito, pelo horário que temos a cumprir. Os motoristas são muito cobrados, mas quando conseguimos atender os passageiros com a atenção que eles precisam, eles se sentem seguros e nos dão muito carinho”, detalha.

“Mas isso é perigoso!”

Diante de uma notícia que afirmava: ‘Conduzir ônibus é uma das piores profissões’, a filha de Rosália questionou: “Você ficou louca de escolher um trabalho como esse?”. A mãe respondeu com a justificativa pelo amor à profissão: “É o que eu gosto de fazer, eu escolhi ser motorista, e sou fera no volante!”, garante, com um sorriso e sem modéstia. Ela é categórica ao afirmar que a mulher não só é poder, como também é querer. “Temos mulheres em todos os lugares, exercendo todas as atividades com muita qualidade. Não podemos nos desmerecer, nem nos desqualificar. Temos as mesmas capacidades que os homens e ainda a vantagem de conseguir fazer mais coisas ao mesmo tempo.” A motorista não fica parada muito tempo no mesmo ponto. Agora almeja outros destinos: “Pretendo chegar à carreta e conhecer boa parte do meu Brasil na boleia!”

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