TJMG nega habeas corpus a policiais paulistas no caso do tiroteio
Com a decisão em caráter liminar, dois delegados e dois investigadores continuam presos em Contagem
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou em caráter liminar o habeas corpus dos quatro policiais civis paulistas presos por lavagem de dinheiro após o tiroteio envolvendo policiais civis de Juiz de Fora, no último dia 19, no estacionamento terceirizado do Centro Médico Monte Sinai, na Avenida Itamar Franco. A decisão do desembargador Júlio Cezar Guttierrez foi publicada no início da noite de quinta-feira (25). Ele determinou a requisição de informações judiciais e vista à Procuradoria Geral de Justiça para emissão do parecer final.
Os delegados paulistas Bruno Martins Magalhães Alves, 30, e Rodrigo Castro Salgado da Costa, 31, assim como os investigadores de Caio Augusto Freitas Ferreira de Lira, 36, e Jorge Alexandre Barbosa de Miranda, 50, foram presos em flagrante no dia do confronto e tiveram suas prisões convertidas em preventivas pelo juiz Paulo Tristão, durante audiência de custódia no dia 21. A Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) confirmou que eles continuam presos no Complexo Penitenciário Nelson Hungria, em Contagem, na região Metropolitana de Belo Horizonte.
Na quinta, o advogado de defesa dos quatro investigados, Ricardo Dutra de Moraes, confirmou ter entrado com pedido de habeas corpus para seus clientes junto ao TJMG, mas se reservou o sigilo profissional e preferiu não dar detalhes das alegações utilizadas para justificar a soltura. As condutas dos policiais paulistas também estão sendo apuradas pela Corregedoria de São Paulo, incluindo os outros cinco servidores identificados no esquema, mas que não chegaram a ser presos, porque não estariam realizando a escolta no momento da negociação. O carcereiro Leandro Korey Kaetsu, 38, os agentes Cristhian Fernandes Ferreira, 44, e Cezar Raileanu, 47, os investigadores Marcelo Palotti de Almeida, 41, e Eduardo Alberto Modolo Filho, 31, foram autuados por prevaricação.
Já em Minas, a Corregedoria da Polícia Civil assumiu toda a investigação do caso, que resultou nas mortes do policial juiz-forano Rodrigo Francisco, 39, assassinado com cerca de 20 tiros, e do empresário Jerônimo da Silva Leal Júnior, 42, baleado várias vezes no abdômen. Este último era proprietário da empresa de segurança contratada para a escolta do executivo do ramo da engenharia e construção
paulista Flávio de Souza Guimarães, que está proibido de deixar o país por ordem judicial. Jerônimo ficou internado em estado grave na UTI do Monte Sinai, mas não resistiu e foi a óbito na quinta-feira. Ele chegou a ser autuado por homicídio porque teria disparado contra Rodrigo. A assessoria da Polícia Civil de Minas informou que o corpo do empresário foi liberado do IML por volta das 17h30 de quinta. O local do sepultamento não foi informado.
A sexta pessoa presa foi Antônio Vilela, 66, suposto dono das malas com R$ 14 milhões – a maioria em notas falsas – apreendidas no porta-malas de um carro no estacionamento onde ocorreu o tiroteio. O suspeito de estelionato está no Ceresp.
Os três policiais civis de Juiz de Fora que estavam com Rodrigo e escaparam ilesos, o escrivão Rafael Ramos dos Santos, 30, e os investigadores Leonardo Soares Siqueira, 43, e Marcelo Matolla de Resende, 45, são investigados, inicialmente, por prevaricação. Eles não chegaram a ser detidos, mas foram afastados dos serviços de rua e estão exercendo funções administrativas até que o inquérito seja encerrado, conforme informou nesta sexta-feira (26) a assessoria da Polícia Civil. Desde o dia do tiroteio também foi instaurado um procedimento administrativo para apurar as condutas deles.
“Os fatos estão sendo investigados com o uso de todas as técnicas investigativas e de inteligência para a devida apuração dos crimes”, afirmou a assessoria, em nota. “A PCMG informa, ainda, que conforme previsto em sua Lei Orgânica, inquéritos complexos que envolvam servidores da instituição podem ser presididos pela Corregedoria-Geral da PCMG, que assumiu as investigações juntamente com os promotores de Justiça da comarca de Juiz de Fora/MG e do Gaeco da capital (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do MPMG). Assim que os trabalhos avançarem, as informações serão repassadas.”
Na audiência de custódia foi levantada a suspeita de que os policiais mineiros estariam fazendo a escolta do possível estelionatário. Eles alegaram terem ido até o local para atender a uma denúncia de pessoas armadas.
Tiros foram disparados após descoberta de ‘golpe’
Durante os depoimentos prestados no último domingo (21) na audiência de custódia (veja aqui os vídeos), realizada no Fórum Benjamin Colucci, o delegado paulista Rodrigo Castro Salgado da Costa revelou que a troca de tiros aconteceu depois da descoberta de “golpe”: “Na hora que eles entraram novamente no elevador (após saírem da cafeteria), desceram para o subsolo. Eu continuei acompanhando, e foram para os fundos do estacionamento. Até achei alguma coisa estranha, mas me posicionei taticamente, porque minha função era manter a segurança dele (do empresário paulista Flávio de Souza Guimarães). Não sei se o Antônio (Vilela) ou o gordo (não identificado), abriu o porta-malas do Etios. O vip (Flávio) estava do lado. Eles abriram uma mala cheia de dinheiro, nunca tinha visto uma coisa dessas, só na casa do Gedel (Vieira Lima, ex-ministro). Abriu, rasgou e começou a mostrar para o vip as notas e disse: pode ver, a nota é real e tal. Depois fechou. O vip falou: Então vamos fechar o contrato, esperem um pouco aí. Na hora que o vip saiu, o Antônio disse que todo esse dinheiro veio via Brinks do banco. O Jerônimo achou estranho e falou que era golpe. Meio que pegou no braço do velho e falou: ‘Já vou ligar pra eles’. Ele começou a se distanciar, para a área que pega celular e falou: ‘Rodrigo é golpe, fica com ele aí’. Nisso eu já virei para o gordo e perguntei: Vocês estão aplicando golpe?”
Questionado pelo juiz Paulo Tristão se haviam pensado se tratar de golpe por terem percebido que as notas eram falsas, o delegado disse que não, que a desconfiança teria surgido pelo fato de afirmarem que o dinheiro havia vindo de um banco. Ele acrescentou ter conhecido Jerônimo há quatro anos. “Ele me avisou que faria uma escolta de alguns vips e precisaria fazer com oito policiais, mas não disse o motivo de tantos. Seria na cidade de Juiz de Fora para uma reunião de negócios.”
Já o delegado Bruno Martins Magalhães Alves, ao ser perguntado sobre o número de policiais mobilizados no serviço, respondeu: “Acredito que ele (o empresário Flávio) seja uma pessoa importante e fique com medo de sequestro, algo do tipo. Acho que ele preza bem pela segurança dele.” Cada um receberia R$ 1.500 pelo “bico”.
Em depoimento à Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo, na segunda-feira (22), Flávio afirmou ter viajado para “negociar empréstimos para sua empresa”. O investigado afirmou desconhecer que era escoltado por policiais, alegando ter contratado os serviços da empresa de segurança de Jerônimo. O executivo Roberto Uyvare Júnior, que seria “dono de empresas situadas em França, Espanha e Brasil”, e o advogado Mário Garcia Júnior teriam viajado no mesmo avião.
Afastamento
A assessoria da Polícia Civil de São Paulo informou ter determinado, na quinta-feira (25), o afastamento do serviço operacional e o recolhimento dos distintivos e armas dos cinco policiais civis envolvidos no caso que não chegaram a ser presos. “A Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo continua em contato constante com a Polícia Judiciária de Minas Gerais para auxiliar nos trabalhos realizados em Juiz de Fora. Todas as circunstâncias estão sendo apuradas em procedimento administrativo instaurado pela instituição e, se comprovados desvios de conduta, os policiais envolvidos responderão administrativa e criminalmente, de acordo com os atos praticados por cada um.”
Tópicos: polícia / tiroteio entre polícias