Agressões nas escolas se tornam mais graves


Por MICHELE MEIRELES

25/11/2014 às 07h00- Atualizada 25/11/2014 às 10h20

Após ser esfaqueada na escola, sendo atingida na região do abdômen e no braço, jovem de 15 anos ficou internada e só voltou à aula dez dias depois

Após ser esfaqueada na escola, sendo atingida na região do abdômen e no braço, jovem de 15 anos ficou internada e só voltou à aula dez dias depois

O ano escolar está chegando ao fim com uma preocupação que vai além das questões pedagógicas: a violência dentro e fora dos muros das instituições de ensino. Nos últimos meses, agressões com uso de facas e barras de ferro, além de espancamentos, deixaram em alerta pais, educadores e alunos. O que mais chama atenção é que os embates estão cada vez graves, e um deles terminou com a expulsão de uma estudante do colégio. Para autoridades e especialistas da área, a situação escolar é um reflexo da violência urbana.

Segundo dados da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), entre janeiro e setembro deste ano, foram registradas 565 ocorrências policiais nas escolas de Juiz de Fora, uma média de dois casos por dia. Destas, foram 159 furtos, 110 agressões, lesões corporais e vias de fato e 87 registros de ameaça.

No dia 30 do mês passado, uma adolescente de 15 anos foi esfaqueada na Escola Municipal Olinda de Paula Magalhães, no Jardim Esperança, região Sudeste, por outra aluna, 14. O caso aconteceu no refeitório da unidade, durante o intervalo, e levou medo a outros estudantes que assistiram a cena. A vítima foi atingida com golpes de faca, com 30cm de lâmina, no abdômen e no braço. Ela ficou internada dois dias e só retornou à escola dez dias depois, quando a suspeita do ato violento já havia sido expulsa. “Se ela continuasse lá, minha filha não poderia voltar. Foi uma agressão grave, uma coisa que nunca poderia acontecer numa escola e que nos assustou muito”, disse o pai da vítima Valmir Gregório.

A Tribuna esteve no colégio, e outros pais se mostraram preocupados com a situação. Segundo eles, as brigas dentro e fora da escola e as ameaças entre alunos e até contra os professores são comuns. “Meu filho, de 12 anos, estuda aqui e viu tudo. Ele ficou apavorado. Minha vontade era tirá-lo da escola, mas, como é final de ano, poderia prejudicá-lo”, disse uma dona de casa que pediu para não ter o nome divulgado. No dia seguinte ao episódio, um adolescente, 11, teria sido flagrado na escola com uma faca na cintura.

No início deste mês, uma adolescente, 13, estudante da Escola Estadual Sebastião Patrus de Souza, em Santa Terezinha, precisou levar pontos na cabeça após ser agredida por um grupo de meninas na saída da aula. Teria ocorrido um desentendimento entre as adolescentes, a vítima foi abordada e atingida com socos e chutes. “Casos como este me preocupam muito, já que não há uma motivação grave. Então, qualquer um pode ser o próximo agredido. Meu filho, de 16 anos, estuda lá e percebo nitidamente como estes casos afetam sua rotina escolar. É lamentável”, disse uma enfermeira que pediu para não ser identificada.

Estudante golpeado

No dia 30 de setembro, um adolescente, 17, foi agredido com uma barra de ferro por outros cinco na porta da Escola Estadual Henrique Burnier, no Poço Rico. Uma professora dos jovens, 37 anos, contou que as provocações começaram ainda dentro do colégio. Temendo a violência, ela afirmou que acompanhou o adolescente ao fim das aulas. “As ameaças continuaram do lado de fora, na Rua Osório de Almeida. Mesmo eu estando com ele, o grupo, formado também por alunos da escola, partiu pra cima. Fiquei muito assustada.” O estudante foi golpeado diversas vezes com uma barra de ferro, que havia sido retirada de uma das carteiras. “Como meu nome é diferente, eles começaram a encher o saco no recreio. Eu pedi para parar, e nada. Deixei pra lá, e, na saída, ainda fizeram isso”, relatou a vítima. O grupo, que tem idade entre 12 e 18 anos, foi detido e levado para a delegacia, sendo ouvido e liberado.

Dias depois, mais uma agressão foi registrada na mesma escola. Segundo o registro policial, quatro alunas, entre 15 e 18 anos, se envolveram em uma confusão. A estudante de 18 anos relatou que, após o intervalo, a colega de turma, 17, queria impedi-la de entrar na sala e desferiu-lhe um soco no rosto. Neste momento, a irmã da vítima, 15, interveio e foi atingida por um chute na barriga dado por outra adolescente, 15. A diretora da escola chamou a PM, e todas foram levadas para a delegacia, onde foram ouvidas e liberadas.

Quem também sofre com ameaças constantes são os estudantes e educadores da Escola Municipal Antonino Lessa, no Santa Efigênia, Zona Sul. “Antes nos preocupavam mais as brigas de gangue. Hoje a violência é gratuita, sem sentido. E esta violência vem de fora dos nossos muros, e é difícil ser evitada”, lamenta uma professora que não quer ter seu nome revelado.

Conflitos são marcados nas redes sociais

Nos últimos dois meses, apenas na Zona Norte, a Polícia Civil apurou sete casos de agressão em escolas públicas. Em um deles, no final de setembro, uma aluna, 12 anos, foi agredida por outra, 16, na sala de aula da Escola Municipal Álvaro Lins, no Bairro São Judas Tadeu. A agressora teria batido com a cabeça da vítima diversas vezes contra a parede. A menina ficou ferida e passou por problemas psicológicos. “A mãe relatou que ela ficou muito abalada, só chorava e não queria retornar à escola”, disse o titular da 3ª Delegacia de Polícia Civil, Rodolfo Rolli. O vice-diretor da escola, Alex Fabiany, garantiu que não ocorreram outros casos e que a agressora passou a estudar no turno da noite.

Segundo levantamentos da delegacia, muitos atritos vêm sendo marcados através do Facebook e do WhatsApp e têm envolvido meninas, que filmam os ataques e espalham as imagens nas mesmas redes sociais. “É uma situação preocupante. Isto afeta de forma sistemática a rotina escolar. A entrada e saída de muitas escolas hoje em dia é tensa”, disse Rolli.

Autor da Lei 12.469/2012, que institui a ‘Área de Proteção e Segurança Escolar’, o vereador Wanderson Castelar (PT) também vê com preocupação o avanço dos casos. Segundo ele, será proposta uma audiência pública com o secretário de Educação para discutir o tema e pedir números relativos ao problema. “Percebo nitidamente que há uma evolução na gravidade dos casos. O fato é que boa parte de violência que chega nas escolas vem das ruas. As escolas vêm se tornando arenas, e este é um círculo vicioso que precisa ser rompido, e o ambiente escolar é o melhor lugar para se fazer esta quebra”, disse. Para ele, é necessário que existam ações mais efetivas do Poder Público. “Até hoje não vimos a lei ser colocada em prática. Muitas ações não demandam recurso financeiro, como por exemplo, cadastrar os casos para fazer uma análise e levar o tema para discussão em sala de aula”, disse. Segundo ele, o objetivo agora é reiniciar a divulgação da lei e incrementar debates sobre o tema. Além disso, a ideia é que, em março de 2015, seja feita uma semana da segurança escolar.

‘Casos atrapalham a vida escolar’

A diretora do Sindicato dos Professores (Sinpro), Aparecida de Oliveira Pinto, afirmou que, neste ano, apenas duas notificações de violência contra professores foi registrada pela entidade, porém, “os casos envolvendo alunos, com certeza, atrapalham a vida escolar. Quando acontece no colégio, um dos envolvidos geralmente é expulso, o que traz prejuízo para seu aprendizado. Na outra ponta, afeta os amigos que fazem parte do mesmo grupo”.

A psicóloga e pesquisadora da UFJF Luciana Senra estuda os fenômenos da violência nas escolas. Segundo ela, levantamentos feitos em instituições públicas e particulares da cidade e da região revelaram que os conflitos neste espaço são reflexos de violência no ambiente familiar e do aumento da violência urbana. “Verificamos que estes são fatores que contribuem diretamente para o aumento dos casos. Outra coisa que acirra estes embates são os relacionamentos nas redes sociais. O que acontece virtualmente vai para o ambiente escolar. O que chama a atenção é que agora não há mais diferença entre sexos: as meninas estão tão agressoras quanto os meninos”, ponderou.

Valorização de projetos pela paz

De acordo com a assessoria de comunicação da Secretaria de Educação, desde 2013, tem sido fortalecido o Departamento de Inclusão e Atenção ao Educando (Diae), que cuida, entre outras ações, da mediação e da conciliação no ambiente escolar, auxiliando os profissionais da educação e as famílias diretamente envolvidas em situações de conflito. “A Supervisão de Mediação e Conciliação é responsável por apurar os acontecimentos, ouvir as partes e promover a paz no ambiente escolar. Quando necessário, alunos e profissionais são encaminhados para atendimentos específicos”, informou a pasta por meio de nota.

A Secretaria de Educação também afirmou que vem implementando programas voltados para a valorização da paz e incentivo ao desenvolvimento de projetos extracurriculares. Com relação às notificações sobre casos de violência, a Secretaria de Educação informou “que não há um registro oficial em função de a maioria das situações ser solucionada na própria escola, sem necessidade de envolvimento da pasta, por não serem relevantes.”

Com relação à rede estadual, a superintendente regional de Ensino, Belkis Cavalheiro Furtado, afirmou que não há como precisar se a violência dentro e no entorno das escolas tem aumentado, porque este levantamento não é feito. Mesmo assim, ela confirmou que os casos existem e, por isso mesmo, várias abordagens são feitas ao longo do ano com intuito de promover a cultura da paz. Ainda segundo a superintendente, no próximo ano, o objetivo é implantar a justiça restaurativa nas escolas. Isso será feito após a capacitação de dois servidores da superintendência por especialistas da UFMG, em Belo Horizonte. A previsão é que eles, ao retornarem à cidade, sejam multiplicadores, mostrando aos educadores como iniciar um diálogo, resolver conflitos e incentivar o trabalho em equipe. Além destes programas, segundo Belkis, a superintendência dispõe de uma equipe de resolução de conflitos, responsável por orientar os profissionais das instituições.

Já a PM informou que possui o programa Patrulha Escolar, no qual policiais militares têm contato direto com diretores e estudantes. Além disso, quando há alguma ocorrência mais grave, o serviço é acionado.

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