Recuperação do asfalto em JF pode custar até R$ 1 bi
De acordo com a Empav, recomposição do pavimento deve vir associada a outros trabalhos, como o de reconstrução das redes de drenagem; Prefeitura afirma não possuir capacidade financeira para resolver o problema
Os buracos que surgem nas ruas de Juiz de Fora após períodos chuvosos não são mais novidade. No meio dos transtornos causados pela fragilidade da cobertura asfáltica, a população cobra soluções para a pavimentação do município. Para minimizar os problemas, recentemente, a Prefeitura iniciou obras de recomposição feitas a partir de recursos do programa de Financiamento para Infraestrutura e Saneamento (Finisa), firmado com a Caixa Econômica Federal. O investimento total previsto é R$ 50 milhões em pavimentação de vias públicas, além de mais R$ 10 milhões para ações de saneamento urbano e R$ 30 milhões para a recuperação financeira da Empav. Entretanto, os valores para recuperação do pavimento representam somente cerca de 5% do que realmente seria necessário para restauração de todo o pavimento na cidade, estimado em R$ 1 bilhão. O montante é superior ao anunciado anteriormente pela Prefeitura, que estimava custo em R$ 600 milhões. “Quando se fala em R$ 600 milhões, estamos calculando apenas a pavimentação, mas tem muito mais para ser feito. Mas isso pode chegar a quase R$ 1 bilhão, com a necessidade de fazer, em alguns pontos, obras complementares de recuperação de drenagem e base”, diz o diretor-presidente da Empresa Municipal de Pavimentação e Urbanização (Empav), Fúlvio Albertoni.
Diante da inviabilidade financeira de recuperar toda a malha viária da cidade, a Prefeitura tem adotado critérios para selecionar as vias que passam por recomposição do pavimento. Conforme Fúlvio, a prioridade está em corredores de tráfego essenciais para o transporte público. Além disso, são feitas obras complementares em vias do entorno, com recomposição do asfalto e operações específicas para minimizar os transtornos, intensificados no período chuvoso.
Dos recursos do Finisa, foram liberados, até então, R$ 7,5 milhões. A partir de março, a Caixa Econômica Federal deve liberar cerca de R$ 2,5 milhões por mês. Com o montante, a Empav já recuperou o asfalto de vias dos bairros Democrata, Mariano Procópio, Fábrica e Progresso. Atualmente, as obras estão sendo realizadas em Benfica, na Zona Norte. Dentro do projeto, já estão previstas intervenções nos bairros Borboleta, Vale do Ipê, São Pedro, Santos Dumont, Santo Antônio, Eldorado, Santa Terezinha, Bandeirantes, Ipiranga e Dom Bosco (ver arte).
Reclamações
Frequentemente, a Tribuna recebe reclamações de leitores sobre a situação do asfalto em Juiz de Fora. De Norte à Sul, os problemas são evidenciados. Como exemplos, a reportagem flagrou danos em vias como na Alameda Ilva Melo Reis, que liga os bairros Santo Antônio e Jardim Esperança, na Zona Sudeste, na Rua Florianópolis, em Nova Califórnia, na Avenida Paulo Botti, no Aeroporto, e na Rua Octávio Malvaccini, no Spinaville, na Cidade Alta.
Esta última via foi, inclusive, alvo de manifestação de moradores da região no último dia 17. Eles queixam de danos causados em veículos por conta da deterioração na rua, bem como a dificuldade de locomoção em razão dos diversos buracos no trecho. “É uma via de passagem de caminhões, e a situação está precária”, diz o líder da Associação de Moradores da Cidade Alta, Celso Chapinotte, que aponta a questão em Juiz de Fora como um todo e, em especial, a região que representa. “A Cidade Alta está com volume de obras muito grande. Tem a da BR-440, tem a do (programa habitacional) Minha Casa Minha Vida. Isso aumenta o tráfego e, aquilo que já está destruído, os caminhões e a carga pesada ajudam a deteriorar mais ainda.”
No Recanto dos Lagos, Zona Nordeste, a Rua Maurício Fagundes de Resende também tem sido alvo de reclamações. De acordo com o fisioterapeuta e morador na via, Wélisson Martins, a Empav já esteve no local para fechar alguns buracos, entretanto, nem todos os problemas foram solucionados. “Ali tem tráfego de ônibus, passam alguns caminhões, e está ficando difícil. Tem buraco que já está ocupando meia pista.”
‘A situação está muito complicada’, diz Empav
De acordo com o mestre em engenharia Luiz Cezar Duarte Pacheco, a questão envolvendo o asfalto em Juiz de Fora não está relacionada a qualidade do material, mas sim sua aplicação. Isto porque a massa é fabricada a partir do Cimento Asfáltico de Petróleo (CAP), fornecido pela Petrobrás – o mesmo para todo país. O especialista também avalia a brita e a própria usina da Empav como de boa qualidade. “Concluo que a massa asfáltica que está sendo colocada em Juiz de Fora tem uma vida útil abaixo do esperado porque é mal aplicada”, aponta, explicando que, para recuperação asfáltica, são necessários serviços em suas bases. “Se existe buraco, a água penetrou, percolou nos vazios e aquele ponto da base está frágil. Você vai colocar uma massa que pode estar até com boa qualidade em cima de uma região que não tem suporte. Isso vai não ter sucesso. Você tem que cortar o asfalto em aresta viva, substituir a parte que está degradada da base que suporta a camada asfáltica e compactá-la. Não pode deixar ‘oco'”, explica.
Segundo o diretor-presidente da Empav, Fúlvio Albertoni, diferente das operações de tapa-buraco, as intervenções de recuperação asfáltica englobam vias em sua integralidade ou grandes trechos, devendo atender requisitos técnicos e contratuais do Finisa. Desta forma, para realização do serviço, foram avaliadas condições como drenagem pluvial e a própria pavimentação. Além disso, fatores como trânsito de ônibus urbanos, índice de trafegabilidade e reclamações registradas nos canais oficiais da Prefeitura (como o aplicativo Colab e o Espaço Cidadão) também foram considerados. As recuperações asfálticas que serão financiadas pela Caixa também estão restringidas à área urbana.
“Isso gera um pouco de dúvida. Tem ruas piores que não estão sendo asfaltadas e outras que não estão tão ruins assim visualmente, mas que poderão ficar”, exemplifica Fúlvio. “Às vezes, uma rua que é um bairro mais afastado e tem um movimento pequeno, eu não posso pegar o Finisa e usar lá, vou ter que buscar recursos da Prefeitura para fazer isso. E, hoje, os recursos próprios da Prefeitura estão destinados para tapa-buraco. A situação está muito complicada. Enfrentamos um período de chuvas muito longo e ainda ficou uma demanda represada do período passado por causa da questão financeira”, disse, acrescentando como agravante o aumento do preço do dólar, uma vez que a produção da massa asfáltica é baseada em derivados do petróleo, que sofrem oscilações no custo pelo mercado internacional. “Hoje, mais ou menos, quase 80% do custo da pavimentação é massa e 20% é a aplicação.”
Emendas parlamentares
A Empav também trabalha na pavimentação das ruas de Juiz de Fora por meio de aportes de emendas parlamentares. Entretanto, os recursos provenientes dessas emendas são destinados a locais específicos, o que não permite à empresa utilizá-lo em outros pontos, segundo o diretor-presidente da Empav. “Um vereador indicou (a emenda) para aquela rua e eu não posso mudar. Às vezes, aquela rua está melhor do que outras, mas eu não posso pegar e transferir isso”, exemplifica.
Dívida da Empav é estimada em R$ 30 milhões
Parte dos recursos financiados pela Caixa Econômica Federal, através do Finasa – R$ 30 milhões – será destinado para cobrir déficit financeiro da Empav. De acordo com o diretor-presidente, Fúlvio Albertoni, o valor se aproxima ao passivo a descoberto da empresa, que, atualmente, gira em torno deste montante, sendo grande parte relacionado a fatores tributários. Segundo Fúlvio, há uma expectativa quanto a um novo programa de refinanciamento e renegociação de dívidas por parte do Governo Federal, o chamado Refis. “(com ele), podemos ter a redução desse passivo e, com o recurso do Finisa sobrando, podemos investir na Empav e até usar para outras empresas.”
Comissionados
Em agosto de 2019, a Prefeitura de Juiz de Fora anunciou o intuito de reestruturar a Empav. O tema chegou a ser debatido em setembro, em audiência pública na Câmara Municipal sobre a situação financeira da empresa. Dentro do plano, havia a possibilidade de uma reorganização administrativa, que poderia resultar no corte de cargos comissionados de livre nomeação. Segundo o diretor-presidente da Empav, a redução do quadro de comissionados partiu de uma orientação do Ministério Público, por conta das características dos cargos. “Para ser comissionado, tem que exercer cargo de assessoramento ou chefia e, muitas vezes, foram contratadas pessoas para exercer cargos operacionais. Então o Ministério Público apurou isso e orientou que fizéssemos o desligamento”, explica. O novo quadro de comissionados da Empav passou de 74 para 30. De acordo com Fúlvio, os cortes geraram economia de cerca de R$ 200 mil mensais, o que representa redução de quase R$ 2,5 milhões por ano.
Obras na UFJF
No último dia 17, a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) deu início a obras de recapeamento da pavimentação asfáltica do anel viário do campus, intervenção que está sendo realizada pela Empav ao custo de aproximadamente R$ 2,6 milhões. De acordo com Fúlvio, o trabalho foi possível por conta do atributo da empresa em prestar serviços para instituições públicas e é importante no processo de capitalizalação e busca por autonomia financeira. Também em audiência pública na Câmara Municipal em setembro do ano passado, o diretor-presidente citou a possibilidade de a empresa voltar a prestar serviços para a iniciativa privada. Não houve avanços neste cenário, mas a alternativa não foi descartada e depende do processo de reestruturação da empresa.