Mais de 76% das notificações de violência no sistema de saúde de JF são contra mulheres
Levantamento feito por Observatório de Violência e Criminalidade da PJF será apresentado em Fórum sobre violência contra a mulher nesta quarta-feira
Os casos de violência contra a mulher são os mais notificados no sistema de saúde de Juiz de Fora, de acordo com o 1º Boletim de Vigilância das Violências, produzido pelas secretarias de Segurança Urbana e Cidadania (Sesuc) e de Saúde (SS) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), por meio do Observatório de Violência e Criminalidade. De acordo com o documento, das notificações de violência provocada por terceiros entre 2017 e 2021, 76,8% tiveram como pessoa atendida ou como vítima uma mulher. O resultado completo do levantamento será apresentado nesta quarta-feira (22) durante o “Fórum violência contra a mulher: múltiplos olhares, desafios de perspectivas”. O evento acontece a partir das 8h30 no Teatro Paschoal Carlos Magno.
O levantamento feito pela equipe da PJF teve como base os registros do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) a partir da “Ficha de Notificação Individual de Violência Interpessoal/Autoprovocada”, preenchida por trabalhadores e profissionais de saúde. Entre 2017 e 2021, foram 2.299 notificações envolvendo moradores de Juiz de Fora. Essa ficha inclui casos “suspeitos e confirmados de violência doméstica/intrafamiliar, sexual, autoprovocada, tráfico de pessoas, trabalho escravo, trabalho infantil, tortura, intervenção legal e violências homofóbicas contra mulheres e homens em todas as idades”.
Para o levantamento sobre a violência contra a mulher no município, foram retirados 789 casos de violência autoprovocada, restando 1.510 notificações de violência provocada por terceiros. Desse número, 76,8% tiveram como pessoa atendida ou como vítima uma mulher. Esses casos somam 1.159 notificações.
Os números, entretanto, são apenas um recorte da violência contra as mulheres em Juiz de Fora, mas podem somar-se a outros indicativos para contribuir para políticas públicas, de acordo com a socióloga e coordenadora do Observatório de Violência e Criminalidade, Janaina Sara Lawall. “De posse desse material e conhecendo mais a fundo esse fenômeno, o setor público consegue propor políticas mais efetivas que são tanto para enfrentar o problema, quanto para prevenir e atender essas vítimas de forma mais qualificada e mais humanizada”, explica.
A notificação dos casos de violência sexual, por exemplo, é obrigatória nos estabelecimentos de saúde públicos e privados. Porém, o trabalho da equipe da PJF reforça a necessidade de um processo de sensibilização do conjunto de profissionais, como de assistência social e educação, que podem também realizar as notificações de casos de violência de uma forma geral. Além disso, o estudo pode conscientizar também os profissionais de saúde para o atendimento dessas situações.
“Nós estamos preparando a rede de profissionais de saúde para acolher essa pessoa e notificar o serviço de saúde. Pretendemos mostrar a importância desse dado a posteriori para planejamento de uma política adequada e perene para que se evite esse tipo de coisa na cidade”, diz o subsecretário de Vigilância em Saúde, Jonathan Ferreira Tomaz.
Violências físicas e sexuais são as mais frequentes
As violências físicas e sexuais foram as que mais afetaram as mulheres de Juiz de Fora. Mais da metade das notificações do Sinan trata-se de violência física, registrada em 685 casos (59,1%). Já a violência sexual alcançou 580 notificações (50%). Em seguida, ficou a violência psicológica/moral, citada em 149 das 1.159 notificações em estudo (12,9%).
Tanto a violência sexual quanto a física abrangem vítimas de diferentes faixas etárias. O levantamento identificou que, de 2017 a 2021, a violência sexual vitimou meninas com menos de um 1 de idade até idosas de 76 anos, enquanto a física fez vítimas de 0 e 101 anos. Apesar dessa variação, o boletim demonstra uma fragilidade das crianças e adolescentes. Cerca de 19,8% das vítimas de violência física e 66,4% das vítimas de violência sexual têm menos de 18 anos.
“Nós verificamos que, dentro de uma sociedade como a nossa, em que o machismo é estrutural e que temos a violência como uma forma de dominação, ela não escolhe idade”, explica a secretária de Segurança Urbana e Cidadania, Letícia Paiva Delgado. “A violência contra a mulher é mais pulverizada, o que demanda uma articulação cada vez maior para lidar com esse fenômeno. Quando a vítima tem 29 anos e vem sendo violentada pelo marido é um recorte diferente de quando falamos de uma criança que está sendo violentada pelo pai”, exemplifica.
Por conta dessa complexidade envolvendo os casos de violência contra a mulher, a titular da Sesuc reforça a necessidade de tratar o tema de forma multidisciplinar. “Quando trabalhamos a questão da violência contra a mulher, temos muito em mente os dados que são produzidos pelas instituições policiais e pela própria organização do sistema de justiça criminal. É preciso entender que os dados epidemiológicos da saúde também podem nos ajudar a compreender o fenômeno.”
Perfil dos autores
O Boletim de Vigilância das Violências buscou analisar também o perfil dos prováveis autores da violência: cerca de 81% das notificações indicam pessoa do sexo masculino (934 casos). O boletim ainda evidencia que, na maioria dos casos, os autores são pessoas do círculo de convivência da vítima. Em 22,6% das 1.159 notificações avaliadas, o provável autor era pessoa com relação íntima de afeto com a vítima/pessoa atendida, ou seja, cônjuge ou namorado. Em outros 6%, o provável autor já ocupou esse espaço em algum momento, sendo ex-cônjuge ou ex-namorado.
O vínculo que também chamou a atenção dos pesquisadores foi de “Pai” e “Padrasto”, indicados como prováveis autores em 78 e 47 notificações, respectivamente, ou seja, 6,7% e 4,1% dos casos. Ainda conforme o boletim, “Amigo/ Conhecido” se faz presente como provável autor da violência em 26,4% das notificações (306 casos), e “outro familiar” em 16,6% (192 casos).
Autores desconhecidos foram apontados apenas em 16,7% das notificações, o que representa 193 ocorrências. Em outras 35 notificações (3%), o vínculo com o provável autor foi registrado como “Ignorado”.
Fórum debate violência contra a mulher
O resultado do 1º Boletim de Vigilância das Violências será apresentado nesta quarta durante o “Fórum violência contra a mulher: múltiplos olhares, desafios de perspectivas”. O evento acontece a partir das 8h30 no Teatro Paschoal Carlos Magno, localizado na rua Gilberto Alencar 1, Centro. O documento completo também pode ser acessado por meio deste link.